Jornalistas da EBC denunciam desmonte da comunicação pública

Os membros do extinto Conselho Curador da Empresa Brasil de Comunicação (EBC) lançaram uma nota denunciando os impactos da Medida Provisória (MP) 744, que alterou a estrutura da empresa. Publicada pelo governo golpista de Michel Temer (PMDB) no ano passado, a MP completa um ano hoje e ainda é motivo de polêmica entre governistas, funcionários da EBC, comunicadores e outros especialistas.

Sede da EBC - EBC

A última presidenta do conselho, Rita Freire, diz que a empresa abandonou o modelo de comunicação pública, que se pauta no interesse social e coletivo. “O que está acontecendo com a EBC hoje, além do desmonte de vários setores, é servir ao governo federal como uma linha da transmissão dos seus interesses”, disse Freire, em entrevista ao Brasil de Fato.

Segundo ela, a extinção do Conselho significou o fim da livre participação da sociedade na empresa porque os membros do colegiado eram representantes de vários segmentos populares. Eles exerciam o controle social sobre a programação e o conteúdo produzido pelos veículos da EBC.

Na nota divulgada nesta sexta-feira (1º), os conselheiros denunciam, entre outras coisas, a situação em que se encontra a Rádio Nacional da Amazônia. O veículo é apontado como sendo fundamental para comunidades da região Norte e está sem sinal desde março deste ano. “Essa rádio é importante até para uma comunidade informar outra sobre algum evento, algum acontecimento grave que ela esteja enfrentando, informações do cotidiano. Ela não tem outro meio de fazer essa comunicação. O Conselho Curador jamais permitiria isso”, afirma a presidenta cassada.

Além da extinção do colegiado, a nota divulgada pelos conselheiros critica as outras mudanças trazidas pela MP. Uma delas foi a transferência da EBC para as responsabilidades da Casa Civil, que trata das articulações políticas do governo. Outra crítica recai sobre o fim do mandato do diretor-presidente da empresa Ricardo Melo. Nomeado por Dilma Rousseff, ele foi exonerado por Michel Temer em 2016. Em seu lugar, o governo nomeou definitivamente o jornalista Laerte Rimoli.

Antes, o mandato só poderia ser interrompido pelo Conselho Curador ou pela própria renúncia do diretor-presidente. Atualmente, com a MP, o ocupante do cargo pode ser trocado a qualquer momento, de acordo com os interesses do Palácio do Planalto. Para Ricardo Melo, que chegou a vencer uma batalha judicial no ano passado, antes de ser definitivamente deposto, a mudança atingiu diretamente o caráter público da EBC:

“A independência da EBC, o que é absolutamente indispensável e fundamental quando se fala de uma comunicação realmente plural, autônoma, apartidária e que não fique ligada aos desígnios governamentais – como ocorre, por exemplo, com a Voz do Brasil, que é simplesmente uma reprodutora dos atos oficias –, foi ferida de morte”, analisa o ex-diretor.

A nota dos conselheiros faz referência ainda a um “excesso de governismo” na cobertura jornalística da empresa. A crítica também é feita pela Comissão de Empregados da EBC.

“Não se discute mais pauta, quais matérias são relevantes, quais os assuntos importantes, como detalhar os assuntos, como profundar certas coberturas. O que se tem feito, via de regra, é o jornalismo oficialesco, que simplesmente dá o que o governo fala – no caso, a Presidência e os ministérios – e a base aliada no Congresso. Tudo que foge disso tem tido muita dificuldade para ser trabalhado e para ser publicado”, aponta o funcionário Ivan Richard, membro da Comissão.

O problema tem sido exposto também pela Ouvidoria da EBC. O órgão tem criticado com frequência a falta de contraponto em reportagens e programas que abordam as propostas do atual governo.

Outro lado

O Brasil de Fato procurou a assessoria de imprensa da EBC para tratar as críticas apontadas pelas fontes ouvidas nesta reportagem, mas não obteve retorno até o fechamento da matéria. O espaço continua aberto, caso a empresa queira se manifestar.