Deputados se mobilizam contra privatização da Eletrobras

No dia 21 de agosto, o governo Temer anunciou a privatização da Eletrobras, estatal brasileira responsável por 31% da geração e 47% da transmissão de energia no Brasil. A justificativa para a venda ao setor privado é de que a empresa acumula dívidas e ineficiência nos últimos anos.

Por Christiane Peres

energia - Portal Brasil

A proposta que partiu do Ministério de Minas e Energia e recebeu o aval no Programa de Parceria e Investimentos, chefiado pelo ministro da Secretaria-Geral da Presidência, Moreira Franco, foi duramente criticada na Câmara dos Deputados essa semana e deve enfrentar resistência de parlamentares que prometem mobilização nacional contra a venda da estatal.

A deputada Érika Kokay (PT-DF), coordenadora da Frente Parlamentar em Defesa do Setor Elétrico, critica a necessidade e a pressa com que a privatização está sendo tratada no país. Segundo ela, o governo Temer abriu mão de outras formas de arrecadação, aceitando, por exemplo, o abatimento de dívidas de empresas no novo Refis, recursos que ultrapassam o que vai obter com a desestatização da Eletrobras.

“O governo aceitou abrir mão de R$ 220 bilhões e agora quer vender a Eletrobras apenas para beneficiar o mercado financeiro e pagar títulos da dívida.”

Logo após divulgação da ideia de privatização, as ações da empresa tiveram forte alta na bolsa de valores, sinalização da expectativa dos investidores em obter maiores lucros com uma gestão privada.

Para a líder da Bancada do PCdoB, deputada Alice Portugal (BA), o Planalto mantém o plano de “desmonte” do Estado, iniciado na década de 1990, na gestão do tucano Fernando Henrique Cardoso. “O que FHC não conseguiu vender, eles estão vendendo agora. Vamos contestar a constitucionalidade desta privatização”, diz.

Conta mais cara

Caso a desestatização seja concretizada, a conta de luz deve ficar mais cara. A razão principal é a mudança prevista para o regime de comercialização da energia produzida pelas usinas da Eletrobras, a chamada "descotização".

Desde 2012, quando foi instituída a Medida Provisória 579, as usinas vendem às distribuidoras energia abaixo do preço de mercado, por meio de cotas. Atualmente, 14 hidrelétricas da Eletrobras estariam aptas à mudança, que elevaria os preços dos contratos às médias praticadas no mercado.

A "descotização", discutida ainda antes da desestatização, por meio de uma consulta que o Ministério de Minas e Energia lançou em julho para debater mudanças no marco regulatório do setor, prevê o pagamento de um bônus à União – os R$ 20 bilhões que o governo espera arrecadar com a privatização e que seriam pagos com a emissão de ações da companhia.

Sindicalistas e deputados da Oposição fizeram duras críticas ao governo e afirmaram que, além de o país perder o controle sobre um setor estratégico, a arrecadação será menor do que 10% do valor dos ativos da companhia.

Gustavo Teixeira, do Departamento Intersindical de Estatísticas e Estudos Socioeconômicos (Dieese) – entidade que assessora os sindicatos na área de economia –, deu como exemplo o que aconteceu com as Centrais Elétricas do Pará (Celpa). Estudo do Dieese mostrou que entre 1998, quando a Celpa foi privatizada, e 2013, a conta de luz cobrada pela companhia aumentou 285%, quase o dobro da inflação do período. Segundo Teixeira, além de aumento de tarifas, a privatização aumentou o número de acidentes.

"A Celpa, hoje, é a concessionária que tem a maior tarifa do país e um dos maiores índices de acidentes na rede, seja com trabalhadores do quadro próprio, seja com terceirizados", disse.

Para Ronaldo Custódio, professor da Pontifícia Universidade Católica (PUC) do Rio Grande do Sul e funcionário da Eletrosul – uma das empresas do sistema Eletrobras –, a perda do controle estatal da companhia pode fazer com que se repita o que aconteceu em outros países, como a Colômbia, onde o preço da energia também aumentou mais que a inflação depois da privatização do setor.

Subavaliação de ativos

Segundo Custódio, promover esse tipo de operação em época de crise econômica e recessão é desvantajoso porque os ativos serão subavaliados. “Sem contar que a baixa atividade econômica e a baixa demanda atuais fazem com que esteja sobrando energia, e quando a economia reaquecer, haverá um déficit”, explica.

Custódio lembra que países, como os Estados Unidos, o Canadá e a China, consideram os recursos hídricos e as hidrelétricas setores estratégicos, e optaram por manter o setor sob controle de companhias estatais. “Nos Estados Unidos, um país liberal, 73% das hidrelétricas são do Estado. As demais são pequenas e médias.”

A ideia é reforçada pelo deputado Assis Melo (PCdoB-RS), que defende a importância do setor para o país. “Precisamos de um setor energético forte para sustentar a nossa indústria e a população. Isso é mais um crime que este governo comete e não podemos permitir”, afirma o parlamentar.