Penélope Toledo: O invencível

Quando a gente é criança, acredita em heróis invencíveis. Destemidos, implacáveis e arrasadores, eles superam qualquer inimigo. Quando crescemos, aprendemos que na vida se ganha e se perde. Mas no fundo, bem lá no fundinho do coração, a gente nunca abandona a ilusão de ser imbatível.

Corinthians - Foto: Agência Corinthians

O Corinthians terminou o primeiro turno do Brasileirão, invicto. Nenhum time, nas 19 rodadas, foi capaz de fazer-lhe sentir o gosto amargo da derrota. São nada menos do que 34 partidas sem perder e apenas quatro jogos para bater o seu recorde de invencibilidade, que foi em 1957.

É a primeira vez que um time, na era dos pontos corridos, fecha o primeiro turno sem perder para ninguém. O rival Palmeiras, no ano passado, terminou a primeira fase na frente (e a segunda também), mas sofreu cinco revezes.

Obviamente, ainda é cedo até mesmo para se soltar o grito de campeão. É futebol, não matemática e a história nos evidencia que o esporte bretão está longe, muito longe de ser uma ciência exata. E falta metade do campeonato.

Também seria ingênuo acreditar num título invicto, embora sonhos pueris também se realizem. E o próprio Corinthians já materializou esta utopia na Libertadores de 2012, assim como o Internacional no Brasileiro de 1979. Tá bom, outro campeonato e outros tempos.

A dor e a delícia de se transformar no “time a ser batido”

Diante do que se acredita muito forte, a fantasia humana parece ter dois sentidos antagônicos: o medo de ser mais um a perder e a vontade dobrada de ser o único a vencer. Se por um lado a invencibilidade assusta, por outro, acaba transformando o invicto no “time a ser batido”.

Seus jogos são gravados, suas jogadas, minuciosamente estudadas, seus jogadores, fortemente marcados, sua camisa desperta o máximo da valentia de quem está do outro lado do campo. Mais do que a necessidade de frear um oponente na disputa pelo título, o que se busca é vaidade de estufar o peito e dizer: “de mim você não passa”.

Para o próprio clube invicto, a situação também é paradoxal. Vencer muito motiva, inspira, encoraja, fortifica. Entretanto, lá vem o fado da invencibilidade, aquela obrigação de ter que continuar sendo o que esperam que você seja, a responsabilidade sobrenatural de não poder errar nunca.

Por isto, é imprescindível ter a cabeça no lugar. Não se deslumbrar com marcas ilusórias e nem achar que existe jogo ganho. Fugir energicamente da derrota, mas compreender que ela faz parte da gente e não nos torna pior. Acima de tudo, não se deixar abalar se ela, porventura, fizer uma visita. Ela vem e vai embora, o campeonato segue, a vida segue.

A gente nunca deixa de alimentar o sonho de ser invencível. De ultrapassar todas barreiras, bater todos os inimigos, superar todos os obstáculos. E de certa forma, a gente é mesmo. Ainda que perca um jogo ali, outro acolá.