Assim como a base aliada, Temer não cita denúncia em pronunciamento

Poucos minutos após o resultado da votação da Câmara dos Deputados que confirmou que a denúncia por corrupção passiva não teria prosseguimento, Michel Temer fez um pronunciamento em que disse que a decisão é uma manifestação “clara e incontestável”.

Por Dayane Santos

Michel Temer - Valter Campanato/Agência Brasil

Lendo o teleprompter, Temer fez um discurso ensaboado dizendo que o resultado demonstrava a força das instituições, apesar da tentativa de alguns setores, segundo ele, de “dividir os brasileiros”, e pediu a pacificação do país.

Estrategicamente, assim como a fala dos aliados durante a votação, Temer não disse que a “verdade prevaleceu” ou coisas do tipo, o que seria esperado já que a acusação tratava de uma conduta pessoal.

Como disse o seu ministro Moreira Franco (PMDB-RJ), Temer tenta virar a página e apagar o fato de que foi denunciado pela Procuradoria-Geral da República pelo crime de corrupção passiva, com base nas delações de executivos da JBS.

“Quero fazer um breve pronunciamento no dia em que a Câmara dos Deputados, que representa o povo brasileiro, manifestou-se de forma clara e incontestável. A decisão soberana do parlamento não é uma vitória pessoal de quem quer que seja, mas é uma conquista do estado democrático, da força das instituições e da própria Constituição”, afirmou.

“As coisas morais nunca foram o forte do senhor Temer”, já dizia o senador Antônio Carlos Magalhães, o ACM, falecido em 2007.

Acusação

Joesley gravou uma conversa com Temer, no Palácio do Jaburu, em que fala da compra do silêncio de Eduardo Cunha e de um juiz e um procurador, entre outros crimes. Na conversa, Temer endossa a conduta do empresário com frases do tipo: “Tem que manter isso aí”. Além disso, a denúncia apresentada pela PGR afirma que ele se aproveitou da condição de chefe do Poder Executivo para ter vantagens indevidas, por intermédio de um ex-assessor, Rodrigo Rocha Loures, que foi flagrado com uma mala contendo R$ 500 mil.

Temer chamou a votação de “eloquente decisão” e disse que o seu governo seguirá em frente “com as ações necessárias”, referindo-se à agenda de reformas.

Eloquência foi o que menos se viu na votação desta quarta (2). Se nem o próprio Temer comemorou a vitória reforçando sua suposta “inocência”, os deputados nem citavam o nome dele, muito menos as denúncias. A maioria preferiu dizer que Temer não deixaria de ser investigado, sendo apenas uma postergação.

O argumento mais usado para justificar o voto foi a “estabilidade política e econômica do país”. “Voto pela mudança que está acontecendo neste país”, declarou Osmar Terra (PMDB-RS), que se licenciou do cargo de ministro do Desenvolvimento Social para salvar a pele de Temer.

O deputado Paulo Maluf (PP-SP) disse: “Pelo progresso e pelas reformas, eu voto sim [a favor do parecer da CCJ]”.

Ao declarar seu voto, o deputado Victório Galli Filho (PSC-MT) disse que votava a favor da “liberdade religiosa” e pela não implantação da “ideologia de gênero” nas escolas brasileiras.

Efeito

E apesar de impedir o andamento das investigações contra Temer, o resultado está longe de representar uma vitória. Nas projeções do governo seriam 300 votos, mas o número ficou abaixo da expectativa. Votaram a favor do relatório 263 deputados, enquanto que os votos contrários somaram 227, duas abstenções e 19 ausências.

O deputado Darcísio Perondi (PMDB-RS), um dos articuladores do governo, disse que o placar revelou que “as circunstâncias são complicadas” e que “os 264 votos são uma demonstração de força boazinha”.

Mas o fato é que a votação confirmou o enfraquecimento da base aliada do governo. O PSDB votou dividido: 21 votos contra o arquivamento e 22 a favor, sendo que o líder da bancada, o deputado Ricardo Tripoli (SP), recomendou o voto contra o relatório e pelo prosseguimento da denúncia.

Houve dissidentes também no PSD, PP, PR e até no PMDB, seu partido. O PPS, que ainda conta com Raul Jungmann no Ministério da Defesa, votou contra o governo: 9 pelo prosseguimento da denúncia e apenas um pelo não.

O DEM, partido do presidente da Câmara, Rodrigo Maia (RJ), orientou a bancada a votar pelo arquivamento, mas teve cinco de seus 29 deputados que divergiram.

Nova denúncia

A PGR já informou que vai apresentar outras denúncias contra Temer. Esta segunda seria por obstrução à Justiça. O governo gastou muito para garantir o resultado desta votação. E a probabilidade de garantir os votos para barrar uma segunda denúncia é ainda menor, já que o desgaste para o Congresso foi grande, e com a proximidade das eleições, poucos vão arriscar seus mandatos em nome de um governo que tem recorde de impopularidade.