Mudanças desestimulam participação no Fies e abrem espaço para bancos

Em meio aos retrocessos de Michel Temer, a educação também foi nocauteada. No dia 6 de julho, Temer e o ministro da Educação, Mendonça Filho, anunciaram alterações no Fundo de Financiamento Estudantil (Fies) que podem mudar o viés do programa voltado para pessoas de baixa renda e que tem mais de 2,5 milhões de contratos ativos, segundo o Ministério da Educação.

Por Verônica Lugarini, estagiária no Portal Vermelho

Fies

As mudanças feitas por Temer ocorreram há duas semanas, a partir da edição da Medida Provisória 785, e deve entrar em vigor a partir de 2018. Um dos principais pontos do Novo Fies é a quitação do empréstimo. Agora, o pagamento será descontado em folha assim que o estudante conseguir emprego formal, com parcelas de até 10% da renda mensal.

Essa alteração não leva em consideração que grande parte dos jovens tem dificuldade de encontrar o primeiro emprego, não tem estabilidade no primeiro emprego ou recebem salários baixos, segundo entrevista do Gilberto Alvarez, especialista em educação em entrevista à Rede TVT.

Para a União Nacional dos Estudantes (UNE), essa medida pode desestimular a participação no programa. “O desconto em folha obrigatório é muito ruim, pois é nesta fase que o estudante recém-formado está se estabelecendo no mercado de trabalho e enfrentando uma série de dificuldades sobretudo financeiras”, avaliou Marianna Dias, presidenta da UNE.

Novas regras

As novas regras do Fies também preveem três tipos de contrato:

A modalidade do Fies 1 irá ofertar 100 mil vagas, voltadas para estudantes com renda per capita familiar de até três salários mínimos, sem cobrança de juro, e o risco de inadimplência deverá ser compartilhado com as universidades. Com essa alteração, o governo corta 2/3 das vagas destinadas aos estudantes mais pobres, de acordo com informações da revista Época.

Já o Fies 2 deverá oferecer 150 mil vagas nas regiões Norte, Nordeste e Centro-Oeste para estudantes com renda familiar per capita de até cinco salários mínimos, com juros de até 3% ao ano, mais correção da inflação.

Tanto o Fies 2 quanto o Fies 3 terão o risco de crédito compartilhado com instituições financeiras. Dessa forma, os bancos serão responsáveis pela aprovação do financiamento. Apesar dessa divisão do risco de inadimplência ser vista como positiva pelo governo, ela pode trazer riscos ao programa.

Na prática, milhares de estudantes podem ficar sem acesso ao programa por não preencherem os requisitos dos bancos. Com isso, as instituições financeiras devem selecionar alunos com notas mais altas e com melhor perfil socioeconômico, seguindo novamente a lógica do sistema financeiro que deteriora a possibilidade de tomada de crédito pelos mais pobres.

Essas alterações abrem espaço para uma decadência do sistema de ensino brasileiro que havia avançado durante os governos do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva (2003-2011) e de Dilma Rousseff (2012-2016) e a própria fala do diretor de gestão de fundos e benefícios do Fundo Nacional de Desenvolvimento da Educação (FNDE) do Ministério da Educação, Pedro Pedrosa, demonstrando a derrubada das políticas públicas voltadas para a educação.

“Sabemos que alguns alunos mais pobres ficarão de fora, mas tínhamos de garantir a sustentabilidade do programa”, concluiu Pedrosa.

A justificativa do governo para tais mudanças é de que o programa está com um rombo de R$ 3,1 bilhões e taxa de mais de 40% de inadimplência.

Alterações na MP

O deputado Orlando Silva (PCdoB-SP), apresentou nesta semana diversas emendas à medida provisória anunciada para alterar as normas do Fies. Entre as mudanças solicitadas pelo parlamentar está a carência de um ano para o início do pagamento do empréstimo.

Atualmente, os estudantes começam a pagar as parcelas do financiamento somente após um ano e meio da conclusão do curso. A nova regra, no entanto, determina o início de pagamento imediato após a conclusão.

Orlando solicitou um prazo de carência de 12 meses contados a partir do mês imediatamente subsequente ao da conclusão do curso para o início do pagamento do financiamento.

“Neste intervalo de um ano, as pessoas podem se planejar melhor para fazer o pagamento do Fies sem comprometer a sua renda e adquirir novas dívidas”, disse.

Em relação à nova regra que autoriza o desconto automático na folha de pagamento, após o estudante terminar o curso e conseguir emprego formal, o deputado também pede mudanças. A proposta prevê somente para a modalidade Fies 1 – Fundo Garantidor o limite de desconto de 10% da renda, a ser definido em regulamento. A solicitação é de que o limite de 10% também seja válido para as demais modalidades, Fies 2 e Fies 3. O objetivo, segundo o deputado, é garantir que haja um limite para o endividamento do estudante trabalhador, sem comprometer sua vida financeira logo após a formação.