A saída dos EUA do Afeganistão é a única forma de acabar a guerra

“Nenhum de nós diria que estamos no caminho para o sucesso aqui no Afeganistão”, disse o senador republicano John McCain, falando pela delegação bipartidária de cinco membros do senado dos Estados Unidos para a imprensa de Kabul, na terça-feira (4). 

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Os Estados Unidos continuam sua mais longa guerra – agora em seu 16º ano – sem saber como ganhar ou como sair do conflito. O presidente Trump não mostra sinal de mudança ideológica: no fim desse mês ele autorizou mais umas mil tropas ao Afeganistão.

“Nenhum de nós diria que estamos no caminho para o sucesso aqui no Afeganistão”, disse o senador republicano John McCain, falando pela delegação bipartidária de cinco membros do senado dos Estados Unidos para a imprensa de Kabul, na terça-feira (4). Os senadores não precisariam ter deixado de participar das celebrações do “4 de Julho” para constatarem isso.

Os Estados Unidos continuam sua mais longa guerra – agora em seu 16º ano – sem saber como ganhar ou como sair do conflito. O presidente Trump não mostra sinal de mudança ideológica: no fim desse mês ele autorizou mais umas mil tropas ao Afeganistão. 
 
Desde a invasão em 2001, os EUA colocaram mais de 117 bilhões de dólares na guerra do Afeganistão, um dos países mais pobres do mundo.
 
Os Estados Unidos também perderam 2400 soldados e há 20000 feridos. Gastaram 11 bilhões de dólares equipando o Exército Nacional do Afeganistão, que ainda é incapaz de se defender sozinho. Os EUA tinham 63500 soldados no Afeganistão, apenas 8800 continuam hoje. As mortes de civis afegãos são estimadas em mais de 225 mil enquanto há 2.6 milhões de refugiados afegãos fora de seu país de origem e outros 1 milhão espalhados internamente.
A guerra teve o apoio dos dois principais partidos norte-americanos desde o começo. George W. Bush iniciou a guerra. Obama começou sua administração aprovando a ida de mais 30.000 soldados para o que ele chamou de “guerra do bem”. Suas expectativas eram de que ao reforçar o governo, treinar a competência militar e sair fora tudo seria resolvido. Agora, com o Talibã de volta ao controle de um terço do país, Trump está prestes a enviar de 3000 a 5000 soldados para evitar perder a guerra.
 
Os Estados Unidos foram para o Afeganistão depois dos ataques de 11 de setembro para capturar Bin Laden, deter a Al Qaeda e punir o Talibã por abriga-los. Bin Laden está morto; a Al Qaeda se espalhou pela região; o Talibã foi caçado por 16 anos. Nenhuma administração democrata ou republicana tem a audácia de fazer os soldados americanos voltarem da guerra ou aumentar a violência e os exércitos de uma tal maneira que seja possível acabar com a resistência armada.  Não é à toa que o Afeganistão é chamado de “cemitério dos impérios”.
Sem um plano de saída, não se tem mais estratégia. A delegação de McCain criticou Trump por não preencher postos diplomáticos no Afeganistão, como se outro embaixador permanente ou um representante especial pudesse fazer a diferença. Perguntado o que seria ganhar a guerra, McCain disse ser possível “ganhar uma vantagem no campo de batalha”. Ele afirmou que “ganhar é conseguir uma maior área do país sob controle e trabalhar com uma espécie de cessar-fogo com o Talibã”. Mas as tropas norte-americanas tiveram maiores áreas de controle antes e o Talibã continua a resistir, enquanto a corrupção e divisão continuam crescendo no governo Afegão.
 
Até a senadora Elizabeth Warren que é sensível a causas humanitárias concorda com McCain e critica Trump por não articular uma estratégia clara, ela disse “essa viagem só reafirma minha crença de que a gente precisa de uma estratégia governamental compreensiva. Ninguém nos EUA acredita que há uma solução apenas militar”.
 
O governo deve isso para o povo norte-americano e para seus homens e mulheres cujas vidas foram colocadas em risco. Para prover uma visão mais clara de onde chegamos. Mas é bem claro “onde chegamos”- a mais anos de uma guerra sem fim ou vitória, desperdiçando vidas e recursos.
 
Barabara Lee, senadora da California oferece uma visão mais clara. No fim de junho, Lee ganhou o apoio bipartidário e uma autorização para revogar a Autorização de Uso de Força Militar (AUMF) de 2001, que depois dos ataques do 11 de setembro foi aprovada por 420 votos a 1 na câmara dos deputados e 98 a favor e nenhum contra no senado (Lee foi o único voto contrário). O AUMF deu poderes ao presidente para colocar como alvo qualquer um que estivesse ligado aos ataques, estados ou não-estados. 
 
Lee alertou “um cheque em branco para começar a guerra em qualquer lugar, por qualquer duração, por qualquer presidente”. Em 2016 de acordo com uma com uma pesquisa no congresso a AUMF de 2001 possibilitou ao menos 37 ações militares em 14 países pelo mundo, incluindo as Filipinas, Geórgia, Líbia, Somália e no chamado Chifre da África. Mais recentemente, Obama e Trump aumentaram sua área de influência para continuar a intervenção na Síria.
 
No senado, o democrata Tim Kaine e o republicano Jeff Flake introduziram a nova autorização para a força militar que iria revogar a AUMF de 2001 enquanto provem uma nova autoridade para a “guerra ao terror”. No entanto repelir a autorização não traria a guerra para um fim inesperado, mas forçaria um debate limpo sobre os limites da autoridade presidencial. Um debate sobre o que os EUA estão fazendo no Afeganistão pode aparecer. 
 
Depois do debate iraquiano, tecnologias militares e táticas- de drones a operações especiais forçam a cobrir invasões secretas necessárias para sustentar essa guerra sem fim. Mas os estadunidenses não gostam de guerras sem vitória. Nas duas últimas eleições presidenciais, a população votou nos candidatos que expressaram o maior ceticismo sobre as guerras e a mudança de regime, como Obama e Trump fizeram. Um estudo acadêmico recente sugere que os custos não revelados das eleições podem ter tido um papel decisivo na vitória do Trump. Os autores Douglas Krines, um cientista político da Universidade de Boston, e Francis Shen, um professor de direito na Universidade de Minnesota, descobriram depois de controlar uma série de variáveis “Trump superou significativamente Mitt Romney em municípios que eram contra a guerra"- e as mortes militares- no Iran e no Afeganistão. Votos anti-guerra encobertos podem estar crescendo em comunidades que fornecem os soldados da nação.
 
Apesar de ter proferido “América Primeiro”, A postura de Trump é contraditória a suas palavras. Em meio aos testes de mísseis norte-coreanos e a especulação de que a Rússia teria ajudado Trump a vencer as eleições, a crescente escalada no Afeganistão não chamou muita atenção. Mas o empurrão do Pentágono para que Trump envie mais tropas assegurará que ele esteja preso em uma guerra sem saída.
 
Os EUA não precisam desperdiçar mais vidas e recursos no Afeganistão. Não precisam de uma estratégia abrangente para mais guerras no Afeganistão. Precisam de uma simples decisão de sair.