Guadalupe Carniel: A (não) morte da Portuguesa

O desafio das nossas vidas é sempre conseguir subir. Aprendemos desde cedo que devemos tentar uma ascensão social; seja nos estudos, financeiramente, enfim. Buscamos sempre uma estabilidade que é idealizada; tentamos escalar um cume para isso (mesmo que o desafio de escalar seja só para tirar uma foto bonita e depois retornar). Mas, e descer? Cair mesmo ao ponto de chegar ao fundo do poço?

Portuguesa futebol

Muitos clubes se descabelam quando caem para a segunda divisão, como se fosse o fim do mundo. Times que nunca experimentaram uma Série B, que se orgulham disso e que sobrevivem mais como mortos do que vivos na “Primeira Divisão do Campeonato Mais Importante do País do Futebol (não é mesmo São Paulo?).

Ontem a Portuguesa saiu da Série D. E com isso surgiram milhares de fãs da Lusa (não me refiro aos torcedores de verdade) que lamentavam a queda do time, que estavam devastados como um clube tão importante caiu, como isso pode acontecer, que todos deveriam lutar porque isso era injusto com um time tão tradicional “desaparecer” do cenário do futebol, outros falavam que a Portuguesa morreu (os únicos que vi escrever com propriedade sobre isso foi a torcida Leões da Fabulosa).

E os que escreveram isso não estão errados. Não nos argumentos. Mas são hipócritas. Sim, eles falam tanto do quanto o futebol morreu, do que aconteceu com a Portuguesa e que sentem falta dela na primeira divisão. Mas o que fazem pelo clube? Ignoram o ano todo, ficam comemorando suas rendas de arenas e nem se lembram que além da Portuguesa existem outros clubes nessa situação ou até piores. Mas, para alguns, é legal ir uma vez por ano nos estádios desses times, ver um jogo, “desfrutar de um dia de futebol de verdade” e depois virar as costas, como se tivesse contribuído muito. A queda da Portuguesa não é culpa somente dela. É culpa de um futebol cada vez mais excludente, com regulamentos e calendários que só beneficiam clubes tidos como grandes e que a cada dia matam mais e mais clubes. Veja nos sites das Federações a quantidade de times que deixaram de existir e pesquise o porquê.

E não, pode não parecer, mas isso não é o fim do mundo. Ao contrário. Se usar de inteligência (coisa em falta pelos dirigentes e parte técnica dos clubes não só no Brasil, mas no resto do mundo) pode se reerguer, como esses torcedores tanto bradam querer. E eu queria muito mesmo ver isso acontecer, se os grandes perdessem dos chamados “pequenos” se manteriam esse discurso de bom moço. Aliás, para quem não sabe, o calendário da Portuguesa não acabou, ainda tem Copa Paulista que ainda conta com o Juventus da Mooca, que pelo visto vocês nem lembraram que também não tem divisão assim como o Nacional e nem por isso os torcedores desses times estão desmotivados, ao contrário. Só para constar: futebol é como a vida, feita de mais do que Séries A à D. Tem Copas Paulistas, tem várzea. Tem muito perrengue entre idas e vindas, turnos e returnos. E claro, eu poderia falar que é muito mais legal e romantizar esses torneios. Mas não é legal. Tudo é muito bonito quando o sofrimento não é nosso. Aí até é “divertido” acompanhar. Agora imagine disputar torneios com times pífios com a sua diretoria pouco se importando? É o que acontece com o Juventus, é o que aconteceu com a Portuguesa.

Quanto a vocês com seus discursos, tenha dó. Aliás, retiro o que disse. Não tenha dó. Nós que torcemos pra equipes que tem tanta história e que hoje são considerados pequenos não precisamos de dó. E sim de respeito. E o respeito tem que vir de todos: federações, a mídia que a cada dia diminui mais o espaço para campeonatos mais modestos e principalmente os tais fãs de futebol. Se você passa o ano preocupado apenas com seu time grande, aí escreve um textão bonito nas redes sociais, nos poupe: você não tem propriedade para falar do que acontece com os clubes do seu bairro ou região. Portanto, saiba respeitar quem defende essas camisas e sua muito durante o ano. Porque eles não são torcedores de ocasião. São para a vida toda. E esses times podem não estar nas Séries que vocês acompanham, mas seguem vivos enquanto ainda tiverem torcedores.