Deixa as meninas comemorar em paz

Desde que o mundo é mundo, existem pessoas que têm sérios problemas com a liberdade ou a felicidade alheia. Desde a cartinha chorosa ~digna de quinta série~ do vice talarico* até nosso reconhecimento mundial como melhores criadores de memes em razão dos áudios com Joesley Batista, tivemos aumentada nossa capacidade de sobreviver às intempéries.

Por Lu Castro*

Futebol feminino Wolfsburg - Foto: M Volkmann/Getty Image

O momento exige atenção e busca por ações equilibradas e bem fundamentadas. Já não cabem atitudes que segreguem, que discriminem. Ainda assim, há os que se apegam às práticas típicas do século XIX e acabam por expor o que realmente pensam.

Gastos dois necessários parágrafos na abertura do texto, vamos ao fato.

Se você pensa que os absurdos cometidos com o futebol feminino rolam apenas em terras brasileiras, está enganado. O fato mais recente e tosco aconteceu na Alemanha.

Óbvio que o futebol alemão se reconstruiu na última década e que suas conquistas são fruto desta reconstrução. Mesmo com o futebol feminino, a mudança estrutural trouxe títulos significativos.

Não que ao longo da história futebolística a Alemanha tenha deixado de ser representativa. Nas 20 edições da Copa do Mundo, os alemães não estiveram presentes em apenas dois anos: 1930 e 1950. Esteve em terceiro e em segundo lugar em quatro edições, caiu na primeira fase em duas edições, caiu nas quartas-de-final em mais duas edições, ficou na semifinal em um e foi campeã em quatro. Impossível dizer que em algum momento da história, a Alemanha tenha sido insignificante, num contexto geral.

Mas é claro que sempre rolam uns golpes por aí. O mais recente, contra as mulheres do futebol, foi do Wolfsburg. A equipe feminina do clube que completará 72 anos em setembro, ganhou quatro títulos nacionais nos últimos seis anos. Na última semana, conquistou a Copa da Alemanha pelo terceiro ano consecutivo, quer dizer, uma campanha de sucesso.

O que deveria ser motivo de orgulho para o clube, se transformou em cerceamento. As meninas foram proibidas de comemorar o título nacional porque a equipe masculina estava lutando contra o descenso e a comemoração das campeãs só poderá acontecer em setembro.

Mais detalhes podem ser lidos na publicação do DW, aqui.

Os argumentos furados e condicionantes, sempre foram utilizados como forma velada ou não de embarreirar as conquistas das mulheres do futebol, quer seja dentro ou fora de campo. O fato se dá no planeta e não é “privilégio” brasileiro a construção da misoginia nos pequenos detalhes.

Entendo a disciplina que envolve esportes coletivos, o tal “não perder a mão do grupo” e toda essa terminologia que por vezes cansa a paciência desta escriba, mas como movimento coletivo popular – ainda que com toda essa tentativa de ‘reelitização’ do jogo e suas arenas, ingressos caros e outros que tais – acredito que é preciso focar na cultura da massa, suas representações e ações às quais o futebol se liga.

Título é para se comemorar na hora. Ideia errada se combate no téte-a-téte e golpe contra toda e qualquer minoria, se combate exigindo que o justo se faça presente todo o tempo.

Impedir que as meninas comemorem o título, portanto, o fruto do trabalho, nada mais é que a reprodução – ainda que em ‘menor’ grau – de um sistema que tenta se impor aos cidadãos em sociedades pretensamente progressistas: o arrocho do trabalhador ou, pra ficar mais familiar: não pense em crise, trabalhe.