PGR e PF copiaram Moro ao divulgar grampo de Reinaldo Azevedo

A divulgação de conversa do jornalista Reinaldo Azevedo, ex-Veja e colunista da Folha de S. Paulo, com a irmã do senador afastado Aécio Neves (PSDB-MG) trouxe de volta o debate sobre a violação à lei e ao direito de sigilo da fonte assegurado ao jornalista.

Por Dayane Santos

Moro no Senado - Agência Senado

Boa parte dos profissionais e veículos de comunicação apontam que a decisão da PGR (Procuradoria Geral da República) e do ministro Edson Fachin, do Supremo Tribunal Federal, que levantou o sigilo das interceptações configurou uma violação à liberdade de imprensa e ao direito de sigilo da fonte.

No entanto, ainda que Reinaldo Azevedo não fosse jornalista, a divulgação de tais conversas configuraria uma violação constitucional. Isso porque a lei que regulamenta as interceptações telefônicas proíbe a utilização, e portanto a sua divulgação, de gravações que não estejam relacionadas com objeto da investigação.

A lei regulamenta o artigo 5º da Constituição, em seu inciso XII, que garante a inviolabilidade do sigilo "da correspondência e das comunicações telegráficas, de dados e das comunicações telefônicas", sendo a única exceção no caso de ordem judicial.

A Lei 9.296/1996, por sua vez, determina em seu artigo 9º: "A gravação que não interessar à prova será inutilizada por decisão judicial, durante inquérito, a instrução processual ou após esta, em virtude de requerimento do Ministério Público ou da parte interessada".

Significa dizer que as conversas transcritas nos autos não poderiam sequer fazer parte do processo nem divulgada pela autoridade judiciária, pois nada de relevante foi dito para se considerar como indício de crime.

"A lei que regulamenta as interceptações telefônicas (lei 9296/96) é clara ao vedar o uso de gravação que não esteja relacionada com o objeto da investigação. É uma irresponsabilidade não se cumprir a legislação em vigor. O episódio envolvendo o jornalista Reinaldo Azevedo enche-nos de vergonha, é um ataque à liberdade de imprensa e ao direito constitucional de sigilo da fonte. Está se desenhando no Brasil um estado policial, o que sempre foi combatido pelo Supremo Tribunal Federal", disse o ministro Gilmar Mendes.

Diante do escândalo, a PGR divulgou nota para dizer que não anexou as conversas entre o jornalista e a irmã de Aécio ao processo. Em nota, a procuradoria diz não ter recebido o processo e qualquer documento que tenha sido incluído nos autos afirmando que é de responsabilidade da Polícia Federal.

Já a PF informou que o áudio do telefonema não consta de autos circunstanciados da investigação. "O diálogo não foi lançado em qualquer dos autos circunstanciados produzidos no âmbito da ação cautelar, uma vez que conversas não diziam respeito ao objeto da investigação", informou.

Diante disso, a grita da grande mídia ao defender corporativamente o direito ao sigilo da fonte é justa, mas tem um propósito seletivo para blindar as arbitrariedade do juiz Sérgio Moro, responsável pelos processos da Lava Jato em primeira instância.

Para aqueles que tem memória curta, pouco antes da votação do impeachment na Câmara dos Deputado, entre 19 de fevereiro e 7 de março de 2016, Moro autorizou grampos telefônicos contra 39 números de telefone, de 13 pessoas e entidades ligadas ao ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva. Entre os números, estavam o do filho de Lula, Fábio Luis Lula da Silva, Clara Ant e Paulo Okamoto, respectivamente diretora e presidente do Instituto Lula, e de Roberto Teixeira, advogado do ex-presidente.

Moro também autorizou, em 7 de março, que fosse grampeado o número da ex-primeira dama, Marisa Letícia, e outro número de Ant, que supostamente seria usado por Lula. Até o caseiro do sítio em Atibaia, Elcio Pereira Vieira, também foi grampeado, com o objetivo de tentar esclarecer quem é o real proprietário do imóvel, que até agora não conseguiram provar.

O juiz disse que os grampos eram necessários pois, "apesar de o MPF [Ministério Público Federal] ter reunido um acervo considerável de provas, especialmente em relação ao apartamento e o sítio, a complexidade dos fatos, encobertos por aparentes falsidades e pela utilização de pessoas interpostas, autoriza a utilização da interceptação telefônica para a completa apuração dos fatos".

Ainda segundo Moro, os grampos poderiam "melhor esclarecer a relação do ex-presidente com as empreiteiras e os motivos da aparente ocultação de patrimônio e dos benefícios custeados pelas empreiteiras em relação aos dois imóveis".

Pois bem, os grampos geraram inúmeras horas e todo o conteúdo das conversas, inclusive a feita entre Lula e a presidenta Dilma Rousseff – violando a competência do STF – foram divulgados pelo magistrado de Curitiba, contrariando o que estabelece a lei, que determina o que não for de interesse da investigação precisa ser destruído no curso do processo para preservar o conteúdo privado.

Portanto, a divulgação das conversas de Reinaldo Azevedo é fruto da conduta de Moro que abriu um precedente com efeito avassalador para o Estado Democrático de Direito.