Relação entre BNDES e JBS seguiu critérios técnicos, reafirma Coutinho

O ex-presidente do Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES), Luciano Coutinho, divulgou uma nota, nesta quarta (17), em resposta à reportagem publicada no site da revista Piauí, que trata das relações do banco com a JBS durante a sua gestão. “O relacionamento do BNDES com a empresa obedeceu aos mesmos critérios técnicos e impessoais aplicados a todos os clientes da instituição”, assegura Coutinho.

Luciano Coutinho

A reportagem da Piauí questiona os empréstimos do BNDES à empresa, que é a maior do planeta no setor de carnes. Na resposta, Coutinho rebate as acusações de favorecimento à JBS. “As condições oferecidas à JBS na concessão de crédito e nos investimentos feitos pela BNDESPAR na empresa obedeceram a todas as normas do Banco, sem nenhuma excepcionalidade”.

Confira abaixo a íntegra:

Resposta do ex-presidente do BNDES Luciano Coutinho à reportagem

"Fiquei surpreso com o tom adotado na reportagem publicada pelo site de Piauí ao tratar do relacionamento da JBS com o BNDES durante minha gestão. A começar pelo título (“É tudo deles”), o texto faz eco às acusações de favorecimento à empresa e não dá espaço ao contraponto. Acredito, então, ser necessário fornecer elementos que foram ignorados na análise e que são essenciais para uma visão justa da questão.

A verdade é que as condições oferecidas à JBS na concessão de crédito e nos investimentos feitos pela BNDESPAR na empresa obedeceram a todas as normas do Banco, sem nenhuma excepcionalidade. Posso dizer mais: ao ter tido a honra de conduzir por tantos anos o BNDES, o que pratiquei e testemunhei nesse período foi a oferta de condições iguais e justas a todos que procuraram o apoio da instituição. O Banco não atuou em nome do interesse de poucos, mas do conjunto da sociedade brasileira.

O texto chama de “suspeito” o banco ter “colocado dinheiro para cobrir dívidas da Swift”. O fato objetivo é que é usual que operações de apoio a aquisições realizadas em qualquer parte do mundo destinem recursos para o reforço da estrutura de capital de uma companhia, como ocorreu neste caso.

Outro ponto “suspeito”, o prazo de análise da operação de aquisição da Swift, está em linha com o de outras operações de renda variável realizadas pelo BNDES. Isso foi feito sem nenhum tipo de comprometimento ao rigor do processo e, diferentemente do que aponta a reportagem, está absolutamente dentro da regra. Finalmente, não houve prejuízo ao erário. Pelo contrário: os investimentos feitos pela BNDESPAR na empresa têm apresentado retorno positivo. Apenas com a venda de ações e recebimento de dividendos e prêmios, foram obtidos R$ 5 bilhões, e o BNDES ainda possui 20% do capital da empresa.

Não custa repetir: o relacionamento do BNDES com a empresa obedeceu aos mesmos critérios técnicos e impessoais aplicados a todos os clientes da instituição. As decisões relacionadas à JBS foram tomadas de forma colegiada, com a participação de dezenas de funcionários de carreira do BNDES, de maneira análoga ao que ocorre com todas as companhias que o procuram.

A percepção de que o setor de proteína animal representava uma oportunidade de expansão internacional para as empresas brasileiras foi explicitada publicamente na Política de Desenvolvimento Produtivo (PDP), discutida com o setor empresarial e lançada pelo governo federal. O apoio do BNDES à esta cadeia produtiva seguiu essa orientação e estava disponível ao conjunto das empresas, independentemente de porte. O tratamento dado a todas foi isonômico. Eu recebi, repetidas vezes, representantes de associações de pequenos e médios produtores, e seus pleitos foram atendidos de acordo com a adequação às políticas do BNDES.

Também não há dúvida de que, como consequência do crescimento e da internacionalização das empresas brasileiras de proteína animal, houve benefícios econômicos e socioambientais relevantes. O abate informal, que ao final da década de 90 atingia 40%, hoje é pouco superior a 8%. A arrecadação de tributos cresceu significativamente. Os métodos de gestão e controle do rebanho por parte dos principais frigoríficos, que eram muito criticados, são hoje reconhecidos por entidades internacionais, especialmente no controle do rebanho na região da Amazônia.

Outro problema da reportagem é que ela afirma, sem base em evidências, que a ação do BNDES gerou uma concentração “enorme e danosa” para o mercado de carne. A conclusão baseia-se em “fontes do mercado” nem sequer identificadas. A concentração no mercado brasileiro é enorme sob que ponto de vista? O fato é que essa suposta concentração foi analisada pelo Cade. Em julgamento ocorrido em 17 de abril de 2013, o órgão analisou 13 atos de concentração envolvendo a JBS e concluiu pela não existência de danos à concorrência que pudessem prejudicar o consumidor final.

A reportagem também chega a expressar dúvida em relação à veracidade de minha “alegação” de que estava fora do país, e por isso não pude prestar depoimento. Estou em viagem ao exterior, em compromisso profissional previamente agendado, e voltarei ao Brasil ainda nesta semana. Estou, como sempre estive, totalmente à disposição das autoridades para dar quaisquer esclarecimentos que sejam pedidos. Da mesma forma, os mais de 30 empregados do Banco que foram retirados de suas casas pela polícia na última sexta para depor também nunca haviam se negado a colaborar com qualquer investigação. Desconfio que excessos desta natureza são alimentados quando questões como esta são apresentadas de modo parcial. Mas tenho, ao mesmo tempo, confiança de que, com a exposição detalhada e justa de todos os elementos envolvidos, sua análise poderá ser feita de uma maneira isenta, criteriosa e equilibrada, e a verdade vai prevalecer.

Por fim, expresso minha solidariedade aos colegas com quem por mais de nove anos trabalhei no BNDES, em particular os que foram vítimas da violência da última sexta. Sou testemunha de sua retidão, bem como dos valores que fundam a atuação do BNDES: ética, espírito público, excelência e compromisso com o desenvolvimento."