Lava Jato e mídia transformam agenda oficial em "encontro com réus"

Sem provas, o Ministério Público Federal, em consórcio com a mídia, mantém a estratégia de criar factoides para tentar justificar, por meio das manchetes, a possível condenação do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva. Matéria publicada pela Folha de S. Paulo, diz que procuradores da Lava Jato protocolaram documentos "que contradizem declaração dada pelo ex-presidente" em seu depoimento ao juiz Sergio Moro, na última quarta (10).

Folha MPF Lula - Reprodução

Com 256 dias úteis no ano de 2008 e, com uma agenda que tem em média 3 encontros por dia, Lula realizou somente naquele ano mais de 700 encontros em sua agenda oficial. Mas o MP aponta como uma contradição o ex-presidente da República não citar a mera participação em eventos que contaram com a presença de ex-diretores da Petrobras, hoje investigados. Vale destacar que tais ex-diretores faziam parte da Administração Pública, pois a Petrobras ainda é uma empresa estatal.

Dizem que o apontamento foi feito pelos advogados da Petrobras, que está sob a gestão de Pedro Parente, indicado ao cargo pelo PSDB, atua como assistente de acusação no processo contra Lula. A mesma rapidez não foi verificada quando a defesa de Lula solicitou, há mais de seis meses, documentação referente a contratos que foram entregues dias antes do depoimento com mais de 100 páginas para análise.

A defesa de Lula destaca que os papéis apresentados pelos procuradores "somente servem para provar que seus membros têm acesso irrestrito a documentos da Petrobras, ao contrário da defesa". "Não há paridade de armas na ação', frisou o advogado Cristiano Zanin Martins.

No interrogatório, Lula disse que desconhecia ilegalidades na estatal e afirmou que um presidente da República "não tem reunião específica com diretor" da Petrobras, mencionando duas exceções durante seu governo.

O Ministério Público Federal anexou ao processo, após o depoimento de Lula, agendas que mostram ao menos 23 reuniões e viagens de Lula com diretores da estatal em seus dois mandatos, incluindo Paulo Roberto Costa, Renato Duque e Jorge Zelada.

"Nos oito anos que eu fiquei na Presidência da República, a gente não tem reunião com a diretoria da Petrobras. Eu em oito anos tive dois momentos: quando nós descobrimos o pré-sal para discutir o plano estratégico e para decidir, sabe, que a gente não ia fazer leilão do pré-sal. Era até em uma viagem que eu ia para a Argentina", disse Lula a Moro, ao ser questionado se tinha alguma relação com Duque, que ocupou a diretoria de Serviços da estatal.

Vale também destacar que a acusação decidiu apresentar como "contradição" fato que possivelmente já tinha ciência, já que as perguntas direcionavam neste sentido. Então, por que os procuradores e os advogados não apresentaram tal contradição durante o depoimento?

Os procuradores querem tratar como crime ou indicio de suposto crime a agenda de um presidente para discutir temas relacionados à sua gestão no governo. Nas agendas, Lula se reuniu para discutir temas como "propeno na Revap" (Refinaria Henrique Lage), em São Paulo, em 2008.

A Folha chega ao absurdo de dizer que "além dos réus da Lava Jato", que na época não era réus, Lula teve encontro "com outros ex-diretores da estatal, como Graça Foster e Guilherme Estrella", referindo-se a um encontro de 2005.

Entre os encontros de Paulo Roberto Costa com Lula, por exemplo, há um "jantar em Beijing [Pequim]", em 2009.

Segundo a Folha, a tentativa da Procuradoria é ligar Lula ao cotidiano da Petrobras, com base na tese da imputação objetiva, ou seja, atribui-se a culpa do réu não levando em consideração o dolo, a intensão. É a cantilena dita na denuncia: temos convicção, mas não temos prova.

Zanin, advogado de Lula, ressaltou que 73 testemunhas ouvidas na ação com a obrigação de dizer a verdade inocentaram o ex-presidente e negaram ligação dele com desvios na estatal ou com a posse do apartamento tríplex.