Ex-presidente denuncia ingerência política e "ditadura" na Funai

Depois de saber pelo Diário Oficial de sua demissão, Antônio Fernandes Toninho Costa, agora ex-presidente da Fundação Nacional do Índio (Funai), concedeu entrevista na qual afirmou que perdeu o cargo por barrar indicações políticas. Ele denunciou a interferência da bancada ruralista no órgão e teceu duras críticas ao governo e, em especial, ao ministro da Justiça, Osmar Serraglio. 

ex-presidente da funai, antonio costa

A demissão de Antônio Costa, assinada pelo chefe da Casa Civil, Eliseu Padilha, foi publicada na edição desta sexta-feira do Diário Oficial. O governo ainda não anunciou quem irá substituí-lo no comado da Funai, órgão responsável pela coordenação da política indigenista federal.

“Eu não permiti e jamais poderia permitir [indicações políticas] porque a Funai é composta de cargos técnicos e de servidores concursados. E jamais eu poderia deixar entrar na instituição pessoas que não têm nenhum compromisso com as causas indígenas”, declarou .

"Saio porque sou honesto e não me curvei a malfeitos. (…) O povo brasileiro precisa acordar. O povo brasileiro está anestesiado.  Estamos próximos de viver uma ditadura que a Funai já está vivendo, uma ditadura que não permite ao presidente da Funai executar as políticas constitucionais”, completou o ex-presidente da Funai.

Segundo ele, a Funai “corre risco” de ser extinta, “se continuarem os ataques de parlamentares” e cortes de orçamentos. “Mais do que acabar com a Funai, querem acabar com as políticas públicas de demarcação de terras. O governo não tem neste momento um sentimento para compreender o que é a Funai”, afirmou Toninho Costa.

Ele confirmou ainda as pressões que sofreu para nomear aliados políticos para cargos estratégicos. “A minha exoneração é atribuída a fatores políticos. [Foram] ingerências políticas dentro da instituição que eu não permiti. Jamais eu poderia deixar entrar na instituição gente que não tem nenhum compromisso com as causas indígenas. Essa ingerência partiu inicialmente do líder do governo, que eu não atendi”, disse, referindo-se ao líder do governo no Congresso, deputado André Moura (PSC).

Toninho Costa também teceu críticas diretas a Serraglio. “O ministro Serraglio é um excelente deputado, mas não está sendo ministro da Justiça. Ele está sendo ministro de uma causa que ele defende no Parlamento”, criticou. “Isso é muito ruim para as políticas brasileiras e para as minorias. Os povos brasileiros precisam de um ministro que faça justiça e não um ministro que venha pender para um lado, o lado que ele defende. Isso não é papel de ministro”, disparou.

O ex-presdidente da Funai havia assumido o cargo em janeiro, indicado pelo próprio PSC, por ser um técnico com 25 anos de experiência em saúde indígena. Ele disse que nunca foi filiado ao partido, que apenas assessorava tecnicamente e não acreditava que sofreria interferências no cargo.

Na entrevista, ele denunciou a influência da bancada ruralista. “A bancada [ruralista] não só assumiu o controle das questões indígenas, mas de todo o Congresso Nacional”, opinou. Ele afirmou que foi acusado de ineficiência, mas acusou a gestão de incompetência. "Incompetência é a desse governo, que quebrou o país, que faz corte de 44% no orçamento porque não teve competência de arrecadar recursos", declarou. 

Para ele, o governo nega os problemas que enfrenta. “O governo nega tudo, nega até que está passando por crise. O governo está na ilha da fantasia e não reconhece o sentimento do povo”, disse.

Costa se disse preocupado ainda com a situação dramática em que se encontram os povos indígenas que vivem em áreas isoladas da Amazônia e que podem ser afetados pelo corte de recursos. “Isso me preocupa. São 12 frentes de proteção de índios isolados. Estão lá e, sem essa proteção, isso poderá causar uma grande catástrofe internacional se esses índios ficarem desprotegidos. Me preocupa faltar recurso para dar proteções a eles.”

O ex-presidente da Funai deixa o comando da fundação em meio a um momento conturbado. No último final de semana, um conflito agrário no interior do Maranhão deixou pelo menos dez pessoas feridas, entre as quais índios da etnia Gamela. Em nota à imprensa, o ministro da Justiça, Osmar Serraglio, justificou a demissão dizendo que o “órgão necessita de uma atuação mais ágil e eficiente, o que não vinha acontecendo”.