Apoio as reformas de Temer esvazia atos do MBL e Vem Pra Rua

Insuflados e financiados pela mídia e pela direita conservadora os movimentos MBL e Vem pra Rua ganharam notoriedade levando milhares às ruas em todo o país com um discurso de combate à corrupção e da antipolítica. Depois do golpe contra o mandato da presidenta Dilma Rousseff, o discurso desses grupos não mudou – continuam a demonizar a esquerda e se dizem contra a corrupção -, mas não conseguem atrair o mesmo número de pessoas nas ruas como aconteceu neste domingo (26).

Por Dayane Santos

Protesto convocado pelo MBL e o Vem pra Rua na avenida Paulista - MIGUEL SCHINCARIOL/AFP

Foram convocados atos em pelo menos em 19 estados em que manifestantes foram às ruas em apoio à Operação Lava Jato e contra a corrupção. Em muitas capitais, os manifestantes também protestaram contra a lista fechada, modelo de sistema eleitoral que está em discussão no Congresso Nacional. Todas as manifestações foram marcadas pela baixa adesão, quando comparada com atos anteriores.

A Avenida Paulista, em São Paulo, ficou às moscas. O jornal O Globo preferiu não dar números dizendo apenas que "centenas de manifestantes" ocuparam o Vão Livre do Masp.

Espumando, o colunista Reinaldo Azevedo, criticou o fracasso das manifestações deste domingo. "Não gostava do que antevia quando se anunciou o protesto e gosto menos ainda do resultado. Por que me opus à manifestação? A pauta era ampla e confusa; tanto o sucesso como o insucesso interessariam às esquerdas; mais uma vez, assistiríamos a uma depredação da racionalidade e da lógica. Uma pena e uma lástima!", disse Reinaldo.

"Enfrento o diabo nas redes sociais, que não são a tradução da vida real, desde que afirmei que a demonização da política, conduzida pelo MPF e pelo candidato Rodrigo Janot, acabaria por retirar do PT o papel de protagonista do petrolão. E cravei: a direita xucra ressuscitará as esquerdas. Acertei. E os xucros escoicearam", completou.

Kim Kataguiri, um dos líderes do MBL, tentou explicar o esvaziamento das manifestações em entrevista ao El País. "Foi mais ou menos do mesmo tamanho que o último protesto pós impeachment. Evidentemente não vamos reunir milhões de pessoas como na época do impeachment porque era uma bandeira histórica, muito mais engajante do que essa. Mas também nenhuma democracia saudável mobiliza dois milhões de pessoas com frequência", disse.

Assim como nas manifestações pelo impeachment no ano passado, os atos atraíram uma massa que estava insatisfeita com a situação do país e exigia melhores serviços públicas e mais investimentos em políticas sociais. O que mudou? Nada, a não ser o fato de que a imprensa e direita conservadora puxaram o freio de mão desses movimentos.

Esse grupos prometeram um mundo colorido após o impeachment de Dilma, o que definitivamente não aconteceu. Pelo contrário, o governo de Michel Temer (PMDB) acumula um alto índice de rejeição popular agravada pelas reformas que tenta impor ao país. Aliás, as reformas e medidas econômicas ficaram de fora da pauta do MBL e Vem Pra Rua, pois eles não têm contradição com a agenda governista, pelo contrário, já manifestaram apoio.

Tendo entre as bandeiras, a defesa da Lava Jato e do juiz Sérgio Moro, esses grupos acreditavam que a massa que participou dos atos anteriores vestiria a camisa verde-amarela para sair as ruas num domingo ensolarado na maior parte do país. Também não surtiu efeito.

A mídia, que no ano passado fazia a convocação das manifestações, não fez o mesmo agora, o que também explica o esvaziamento. A rede Globo, por exemplo, que durante o impeachment transmitia a cada intervalo um flash ao vivo desde as primeiras horas da manhã, se limitou a algumas chamadas durante toda a sua transmissão.

Um dos motivos que explica essa mudança de comportamento da grande mídia é justamente a rejeição ao governo de Michel Temer. Durante o governo Dilma, esses setores se aproveitaram da insatisfação popular para insuflar os atos desses grupos. Fazer isso agora seria um tiro no pé, já que essa mesma massa não está satisfeita com as reformas as bandeiras de "combate à corrupção" de "apoio a Moro" seriam sucumbidas por um retumbante "Fora, Temer!". Ou seja, as manifestações deste domingo não seriam diferentes das que levaram mais de um milhão de pessoas as ruas no último dia 15 de março, em atos convocados pela Frente Brasil Popular e Frente Povo Sem Medo.

Além disso, o discurso de demonização do PT e da esquerda, como supostos protagonistas dos esquemas de corrupção da Lava Jato, não se sustenta com as delações que colocam a cúpula do PMDB, liderada por Temer, e outros apoiadores do golpe como o PSDB, que também compõem a base do governo, que se veem no centro dos fatos.

Em resumo: esse grupos nunca foram para as ruas defender as bandeiras ou os anseios do povo, mas os seus próprios interesses. O discurso de "antipartidário" foi desmascarado. Foram as rumas defendendo as bandeiras polío-partidarias.

Enquanto diz ser contra a corrupção, Kataguiri defende o financiamento privado de campanha eleitorais. propondo uma emenda constitucional para derrubar a decisão do Supremo Tribunal Federal, que considerou o financiamento inconstitucional. Questionado se tal medida não voltaria ao que era antes, com o risco de caixa 2 com as doações privadas, ele disse: "Mas é uma questão que não resolve. O caixa 2 continua existindo no financiamento público".

Sobre a reforma da Previdência, ele defende um misto com um modelo de repartição com capitalização, ou seja, dando a a Previdência de bandeja para o sistema financeiro. "O problema do Chile é que o trabalhador mais pobre, o rural, ele não consegue contribuir formalmente. Ele não tem um piso para trabalhar o suficiente para conseguir a capitalização. Por isso a gente defende a renda mínima, mais a capitalização", justifica ele, citando o sistema de Previdência privada do Chile que fracassou. 

Diferentemente dos atos convocados pelos movimentos sociais que eles acusam ser "braço político-partidário". Os atos do dia 15 foram contra o governo golpista de Temer, mas principalmente por suas medidas econômicas que ameaçam os direitos trabalhistas, a Previdência e os programas sociais.

Por meio das redes sociais, o governador do Maranhão, Flávio Dino (PCdoB), numa clara referência ao processo da Lava Jato, disse que "não se faz justiça com "cruzadas" e sim com processos regulados por normas e conduzidos por instituições sóbrias e independentes".

Ele também falou sobre o esvaziamento das manifestações. "Apenas excepcionalmente o povo atende a "apelos diretos às massas" como estratégia de governança. A democracia é mais complexa que isso. Poder bom é poder limitado por regras jurídicas que consagram freios e contrapesos. Nenhum poder absolutista é realmente eficiente. Fracasso das manifestações de direita hoje sublinha uma clara mudança de rumos na conjuntura. País cansou e quer soluções reais e justas", enfatizou.