Wagner Moura resiste à perseguição e retruca Temer em artigo

Um dos artistas mais completos do Brasil, Wagner Moura, premiado pelos filmes Tropa de Elite (2007), Carandiru (2004), Vips (2011) e reconhecido internacionalmente pelo papel de Pablo Escobar na série Narcos (2016), desqualifica, com maestria, o ataque sofrido por ele, em propaganda originada pelo governo Temer. A opinião foi publicada na Folha de S.Paulo nesta terça-feira (21).

Wagner Moura

No artigo intitulado Quem tem medo de artista?, o ator responde às ofensivas do presidente ilegítimo Michel Temer que tenta desqualificar a opinião do ator, por não concordar com ela.

Para Wagner Moura esta é uma reação, utilizada constantemente por pessoas incapazes de respeitar uma opinião alheia. “É a clássica falácia sofista: eu não consigo destruir o que você pensa, portanto, tento destruir você pessoalmente. Um estratagema ignóbil, mas muito eficaz, de fácil impacto retórico”, analisou o artista em sua coluna.

“Invariavelmente essas pessoas utilizam o chamado argumento 'ad hominem' para desqualificar os que discordam de suas opiniões”, reafirma. Diferentemente do que tentam afirmar alguns, diz, Wagner, “artistas são seres políticos. Pergunte aos gregos, a Shakespeare, a Brecht, a Ibsen, a Shaw e companhia -todos lhe dirão para não estranhar a participação de artistas na política”, retruca.

Wagner adverte que essa tentativa de desqualificar o artista trouxe muitos prejuízos para a classe. “Esse medo manifestado pelo status quo já fez com que, ao longo da história, artistas fossem censurados, torturados e assassinados”, recorda. “A galera incomoda”, afirma.

"No Brasil de Temer artistas são considerados vagabundos"

No artigo, Wagner Moura desconstrói o pensamento de que artista não deve dar opinião sobre política ou que “todo artista é burro”, para ele, “a natureza da arte é política pura”. “Numa democracia saudável, artistas são parte fundamental de qualquer debate”. Mas ao contrário disso, diz o ator, no “Brasil de Michel Temer, os artistas “são considerados vagabundos, vendidos, hipócritas, desprezíveis ladrões da Lei Rouanet”.

O ator se pergunta: “por que esses caras têm tanto medo de artistas, a ponto de ainda precisarem desqualificá-los dessa maneira?”

Wagner Moura chama a atenção para o desmonte da Cultura no país a partir do golpe institucional que colocou Michel Temer na Presidência do Brasil. Na coluna diz com tristeza sobre a “criminalização da cultura e de seus mecanismos de fomento, cruciais para o desenvolvimento do país”.

Relembra os grandes nomes da história do país que estudaram, debateram e fizeram a defesa da Cultura nacional, como Darcy Ribeiro, Caio Prado Jr., Sérgio Buarque de Holanda e Gilberto Freyre”. “Todos os projetos sérios de Brasil partiram de uma perspectiva histórico-cultural”, afirma o ator.

“Há algo mesmo de podre no castelo do conde Drácula”

“Ver o ministro da Cultura dando um ataque diante do discurso de Raduan Nassar só faz pensar que há algo mesmo de podre no castelo do conde Drácula”.

Wagner Moura disse que mesmo acostumado com “esse tipo de hostilidade, ficou espantado quando descobriu que o ataque a ele na semana passada, partiu de uma peça publicitária oficial da República Federativa do Brasil”, ou seja, de recurso público.

“Inédito na história", nem na ditadura militar

Um governo atacar com mentiras um artista, em propaganda oficial, é, até onde sei, inédito na história, considerando inclusive o período da ditadura militar.

“O governo ficou incomodado e lançou outro vídeo, feito com dinheiro público, no qual me chama de mentiroso e diz que eu fui "contratado" -ou seja, que recebi dinheiro dos sem-teto brasileiros para dar minha opinião”.

O ator afirma que sempre teve simpatia com o movimento que luta por moradia e gravou o vídeo para tentar “explicitar o absurdo dessa proposta de reforma da Previdência” apresentada pelo governo Temer, diante da enorme propaganda publicitária que o governo federal faz defesa dessa reforma prejudicial ao povo trabalhador.

Assista abaixo o vídeo publicado pelo ator:

O artista conta no artigo que o “vídeo é tão sem noção que acabou suspenso, assim como toda a campanha publicitária do governo em defesa da reforma da Previdência, pela Justiça do Rio Grande do Sul”.

No dia 15 de março, a juíza Marciane Bonzanini, da 1ª Vara Federal de Porto Alegre, concedeu liminar em ação civil pública impetrada no Rio Grande do Sul. Ela determinou que a campanha publicitária patrocinada pelo governo de Michel Temer em defesa da Reforma da Previdência fosse cancelada. A ação diz que a campanha “busca tão somente angariar apoio popular a um projeto do Governo Federal – cujo teor não é divulgado nas peças – e o faz por meio da ampla e contundente divulgação de mensagens que não trazem informação alguma, senão disseminam insegurança e medo na população, ao enfatizarem que os benefícios e as aposentadorias podem deixar de ser pagos, caso a reforma proposta pelo Governo Federal não se concretize”

No artigo, Wagner Moura comemora: "o melhor é o seguinte: o vídeo do presidente não conseguiu desmontar nenhum dos pontos levantados pelo MTST”.

O ator relembra ainda que o ex-senador José Aníbal (PSDB) escreveu artigo em que o "chama de fanfarrão e diz que a reforma só quer 'combater privilégios', e o ator brinca, “devo entender, então, que o senhor e demais políticos serão também atingidos pela reforma e abrirão mão de seus muitos privilégios em prol desse combate? E o fanfarrão ainda sou eu?”, retruca o ator em resposta ao senador tucano.

“Governo quer votar logo antes que o povo se dê conta”

Wagner Moura explica que o governo não debate e não apresenta alternativas para a crise econômica, responsabilizando apenas o povo. “Se o governo enfrentasse a sonegação das empresas, as isenções tributárias descabidas e não fosse vassalo dos credores da dívida pública, poderíamos discutir melhor o que alardeiam como rombo da Previdência. Mas eles não querem discutir nada, nem mesmo as mudanças demográficas, um debate válido", afirma o ator. 

Para ele, outros interesses permeiam essa ação. "O governo quer é votar logo a reforma, acalmar os credores, passar a conta para o trabalhador e partir para a reforma trabalhista antes que o povo se dê conta”. Porém, o ator encerra o artigo com um tom de esperança, após os grandes atos manifestados pelo povo em todo o país no último dia 15 de março, contra a reforma da previdência proposta pelo governo Temer.

Para o ator, cada dia fica mais claro os interesses que estão por trás desta proposta e o povo terá discernimento e irá se rebelar. “No último dia 15, havia mais de um milhão de pessoas nas ruas do país. Parece que não é só dos artistas que eles deverão ter medo”, conclui o artigo.

Ataques e censuras continuam

A opinião do ator Wagner Moura, contrária aos interesses políticos da direita conservadora no país tem chamado a atenção de muitos defensores golpistas. O próprio jornal Folha de S.Paulo em que o artista é colunista nas terças-feiras publica um artigo de opinião divergindo e criticando a opinião do ator. O texto não está assinado e foi publicado ainda nesta terça (21), algumas horas depois da publicação do texto do artista. Mas é destaque da capa do jornal online. O artigo usa uma foto do ator e o título "Wagner Moura, vamos falar de Previdência?" conduzindo o leitor a acreditar que Wagner Moura o tenha escrito.

O próprio líder do movimento social, professor de filosofia da USP, Guilherme Boulos, membro da coordenação nacional do MTST e da Frente de Resistência Urbana foi descartado pelo jornal Folha de S.Paulo no início deste mês. Ele escrevia às quintas-feiras e recebeu uma mensagem de dispensa do periódico.