Eleição na Holanda pune políticas de austeridade

“Rutte vence, Wilders bloqueado”. É praticamente assim que começam todos os comentários sobre as eleições legislativas na Holanda. Contudo, a verdadeira mensagem do eleitor foi outra: os partidos governamentais foram punidos por suas políticas liberais de austeridade e a traição dos sociais democratas do PVDA (Partido do Trabalho, sigla em holandês) resultou numa espetacular queda.

Por Marc Botenga, no jornal “Solidaire”, do Partido do Trabalho da Bélgica

Mark Rutte

Eles tinham prometido uma política social aos holandeses. Em seu lugar, aplicaram uma política de austeridade muito à direita. Hoje pagam o preço dessa traição. Os liberais do VVD (Partido Popular para a Liberdade e a Democracia, sigla em holandês) comemoram porque perderam menos. Na verdade, deveriam sentir vergonha. Mark Rutte, primeiro-ministro e chefe dos liberais, repetia os propósitos do nacionalista islamofóbico Geert Wilders, do PVV (Partido para a Liberdade, sigla em holandês). Os problemas sociais estiveram ausentes dos debates.

Os social-democratas afundam

A coalizão governamental VVD-PVDA perdeu cadeiras no Parlamento. Quem mais caiu foram os sociais-democratas. Na campanha eleitoral de 2012, eles tinham prometido aos holandeses uma política social. Mas se apressaram a entrar numa coalizão com os liberais de Rutte, que tomou medidas de austeridade às custas da atenção à saúde e das aposentadorias e pensões. Hoje, os sociais-democratas não obtiveram mais que 6% dos votos: uma degringolada histórica. Eles perdem, por assim dizer, quatro quintos dos seus eleitores. O ministro das Finanças, Jeroen Dijsselbloem vai, portanto, perder seu posto ministerial. Ele ainda preside o Eurogrupo (que reúne os países da zona do euro) e ficou tristemente famoso por sua dura abordagem da questão grega.

Após as eleições, o VVD não teve senão elogios para com o “senso de responsabilidade” da social-democracia. A falência desta enfraqueceu igualmente todo o campo progressista. Claramente, os eleitores votaram em menor número na centro-esquerda. Tudo beneficiou a direita.

Os liberais nas pegadas de Wilders

Igualmente, o primeiro partido governamental, o liberal VVD, perde oito cadeiras no Parlamento. Uma perda menor da que Mark Rutte temia e do que previam as pesquisas. A operação de “salvação” de Rutte contou com dois componentes.

Primeiro, Rutte retomou os propósitos de divisão e ódio de Geert Wilders. Todo mundo devia “agir normalmente”. As pessoas deviam canalizar seu descontentamento para aqueles que “não atuam normalmente”, ou seja, as minorias, os muçulmanos, os refugiados, a Turquia… Não se devia falar dos problemas sociais, nem da especulação imobiliária ou dos seguros de saúde privados. O governo Rutte fez da Holanda um paraíso fiscal, onde empresas de todo o mundo buscam um endereço de “caixa postal” a fim de escapar dos impostos. As multinacionais ficam, assim, com as mãos livres e os acionistas podem enriquecer à saciedade. Wilders é inteiramente favorável a isso. Por diversas vezes, ele votou contra proposições do SP (esquerda, Partido Socialista, sigla em holandês) que se opunham ao seguro de saúde dedutível, o pagamento antecipado pelo paciente. Quanto à proteção aos locatários contra os aumentos dos aluguéis, Wilders e o VVD também disseram “não” em uníssono.

Em busca de uma alternativa social

O segundo componente do discurso de Mark Rutte foi a velha cantilena de que o crescimento econômico doravante beneficiaria todos os cidadãos. Mas, depois de anos de política neoliberal, ocorreu o inverso. São cada vez mais numerosos os holandeses que adiam seus tratamentos de saúde devido ao aumento das tarifas (seu número mais que duplicou desde 2010). A idade da aposentadoria aumenta. O mercado da habitação está em crise, com aluguéis muito caros. Os estudantes devem tomar empréstimos para financiar seus estudos e é pesadamente endividados que eles começam em seguida uma carreira. No mercado de trabalho, há atualmente cerca de um milhão de pessoas ocupadas em regime de precariedade, muito mal remuneradas e sem acesso a uma proteção social digna deste nome.

Isto precisa mudar, é o que os eleitores pensam. De uma maneira ou de outra, todos os partidos de oposição progridem. Alguns se posicionam no conforto do centro, como o CDA (os democratas-cristãos, sigla em holandês), D66 (liberais de esquerda) e o GroenLinks (a esquerda verde), que sobe com uma imagem jovial e dinâmica. Outros se perfilam em torno de um tema ou de um grupo de público particular – Partido para os Animais, Partido dos Aposentados (50Plus) e o Partido dos Imigrantes (DENK, sigla em holandês). O SP é o partido que tem mais votos à esquerda. Seja qual for o governo que se formará depois das eleições, a pressão de baixo será essencial para arrancar uma verdadeira mudança.

Há manifestamente grandes oportunidades para um tal movimento de esquerda, que substitua a traição dos social-democratas por uma alternativa social unificadora.