Justiça suspende venda de gasoduto da Petrobras

A Justiça Federal em Sergipe concedeu liminar suspendendo a venda, feita pela Petrobras, de 90% da rede de gasodutos Nova Transportadora do Sudeste (NTS) ao consórcio liderado pelo grupo canadense Brookfield. A ação que questionou o negócio – no valor de US$ 5,19 bilhões – foi movida pelo Sindicato dos Petroleiros Alagoas Sergipe (Sindipetro AL/SE).

gasodutos

A entidade argumenta que a Petrobras não observou as normas de licitação no processo de desinvestimento, o que teria gerado prejuízo à estatal. Alegou ainda que o negócio gera risco de dano irreparável, "pois se a alienação se consumar, talvez não possa vir a ser desfeita, em razão da indenização que a empresa poderia se ver obrigada a pagar ao terceiro de boa-fé que comprasse aquele bem".

Na fundamentação, o juiz de Sergipe Marcos Antônio Garapa de Carvalho concordou com o sindicato e alegou que o procedimento utilizado pela Petrobras no negócio parece não atender aos princípios republicanos da “legalidade, impessoalidade, publicidade e eficiência”. “A empresa não comprovou ter havido ampla publicidade da oferta daquele ativo para venda, o que certamente atrairia mais interessados e poderia determinar a elevação do preço".

Segundo o juiz, de acordo os próprios informes que a empresa divulgou ao mercado, a negociação com a Brookfield teria ocorrido “em caráter de exclusividade”, o que, segundo a decisão do magistrado, “parece ofender o princípio republicano da impessoalidade, já que não está suficientemente claro por quais razões e em que circunstâncias a compradora foi escolhida”.

A decisão afirma ainda que a operação de alienação da NTS “não parece ser eficiente, ao menos como exposta nos informes da Petrobras”. O juiz destaca que a subsidiária foi criada em razão de “Termo de Compromisso assinado com a Agência Nacional do Petróleo, Gás Natural e Biocombustíveis”, com o objetivo de reestruturar cadeia de transporte de gás natural no país, segmentando-a entre uma subsidiária do Sudeste (NTS) e uma do Norte-Nordeste (TAG).

“O simples fato de ter havido tal compromisso assumido com a agência reguladora deixa ainda mais clara a importância do objeto explorado pela NTS, atividade econômica destacada no próprio texto da CF/88; importância evidente em si mesma já que o gás natural tem sido empregado como ‘motor’ de muitas indústrias, em substituição à eletricidade, ao menos desde a crise energética do começo dos anos 2000, para se fazer referência a fatos históricos recentes”.

Para o magistrado, se aquela atividade é monopólio da União e a empresa que o explora pretende transferi-la a terceiros, “essa transferência deve ser feita da maneira mais transparente possível, tendo em vista os interesses econômicos envolvidos”.

Além disso, o juiz defende que “parece ser pouco prudente” vender justamente a subsidiária responsável pela distribuição do gás natural no sudeste do país, região que concentra a maior parte das indústrias e que gera a maior parte do produto interno bruto do Brasil e que, portanto, tende a ser mais rentável que a subsidiária do Norte-Nordeste.

“Ora, se uma empresa qualquer se vê na necessidade de alienar parte de seu ativo para aumentar sua liquidez (“fazer caixa”), será pouco provável que ela escolha justamente a fatia mais rentável de seu patrimônio para tanto, já que uma escolha dessas vai de encontro à lógica comum de qualquer negócio.

Segundo o magistrado, “não parece ser economicamente viável” vender patrimônio da empresa pelo preço anunciado, contratar a comparadora para continuar a prestar o mesmo serviço que a subsidiária vendida prestava e manter uma outra subsidiária sua (a Transpetro) contratada pela compradora, como operadora das atividades.

Marcos Antônio Garapa de Carvalho destacou também o fato das estimativas de faturamento e lucro da NTS no período apontarem para a possibilidade de os compradores recuperarem todo o capital investido em menos de 1/3 do período total do contrato. Para o juiz, isso “parece apontar para uma ainda maior lesividade da alienação, pois o negócio parece ser muito lucrativo e não haveria motivos para a alienação”.

“Num resumo, por que vender uma empresa que é da Petrobras, que presta serviços à Petrobras, para uma empresa estrangeira composta por fundos de investimentos britânicos e chineses, para que os serviços continuem a ser executados por ela e pela Transpetro?”, questiona, defendendo que é “no mínimo temerário” vender ativos patrimoniais em momentos de crise econômica.

“Ou seja, parece que está a haver uma simples transferência de patrimônio público rentável a terceiros sem uma contrapartida justa para a vendedora e, frise-se, para os interesses nacionais”, diz a decisão.

O magistrado ainda sublinha que não se pode deixar de levar em conta o impacto que a alienação de NTS pode vir a ter na cadeia produtiva instalada no mesmo local, bem como nos empregos diretos e indiretos ali existentes.

“Se a União pode bancar a manutenção de determinadas operações da companhia por questões de política econômica, como já o fez em passado recente, uma empresa estrangeira, como a que se apresenta como interessada na aquisição, pode simplesmente liquidar o negócio ou elevar os preços praticados, com prejuízos ainda não estimados para o país, a região Sudeste e, o mais importante, para os milhares de seres humanos cujos empregos dependem direta ou indiretamente da NTS”, completa.

A NTS e a política do desmonte

A NTS é uma rede de cerca de 2,5 mil quilômetros de gasodutos. A venda foi aprovada em uma assembleia extraordinária de acionistas da Petrobras, em dezembro do ano passado. Era mais um passo da controversa estratégia de venda de ativos da companhia, levada adiante pela gestão de Pedro Parente.

O plano do governo Michel Temer inclui se desfazer desde a BR Distribuidora, passando pela Liquigás, pelas malhas de gás do Sudeste, os campos no Pré-sal e em Águas Rasas, e promete chegar às refinarias.

Diversos especialistas têm criticado essa diretriz da petroleira, afirmando que está em curso uma tentativa de desmonte da companhia. Com a venda de ativos tão importantes, a atual gestão estaria rompendo com uma das principais características das Petrobras, que é a de ser uma empresa integrada, responsável desde a extração até a venda nos postos de combustíveis.