Após tentativa de golpe Venezuela tende à estabilização, diz professor

Após mais uma ameaça de golpe da oposição do governo da Venezuela nesta segunda-feira (9), "a situação tende a se estabilizar", segundo análise de Gilberto Maringoni, professor de Relações Internacionais da Universidade Federal do ABC (UFABC).

Por Rafael Tatemoto

Nicolás Maduro - AVN

A Assembleia Nacional venezuelana, controlada pela oposição, declarou que o presidente Nicolás Maduro havia abandonado o cargo, defendendo que ele não estaria cumprindo suas obrigações constitucionais enquanto presidente. A decisão foi aprovada com 106 votos a favor, todos de opositores de Maduro. A bancada de sustentação do governo, de 55 parlamentares, retirou-se do plenário da Assembleia.

O Tribunal Supremo de Justiça (TSJ), porém, posicionou-se imediatamente contrário à decisão, anulando o posicionamento do parlamento.

“Eles perderam a batalha sobre o referendo revogatório. Houve uma intensa movimentação desde o início do ano passado [2016], com a oposição colhendo assinaturas. O governo contestou a quantidade das firmas. Chegou-se ao final do ano e viu-se que elas não estavam regulares”, explica Maringoni, autor do livro A Revolução Venezuelana.

A oposição, então, decidiu mudar seus métodos. “A partir de janeiro de 2017, se houvesse referendo, caso o presidente seja destituído, quem assume é seu vice, não há convocação de novas eleições. A única saída dentro da legalidade que a oposição tem agora é levantar o que está disposto no artigo 233 da Constituição da Venezuela. Esse dispositivo coloca uma série de hipóteses em que podem ser convocadas novas eleições no período que resta de mandato. Nenhuma se aplica a Maduro. A única que resta é alegação de abandono do cargo”.

O abandono de cargo é uma das hipóteses de “ausência absoluta” – também possível nos casos de morte, renúncia, incapacidade física ou mental, ou destituição pela Justiça. Caso tivesse sido mantida, a declaração levaria a novas eleições em até 30 dias.

“Não tem como [alegar abandono do cargo], então eles forçaram a realidade. A Suprema Corte já disse que isso é ilegal, não há nenhum indicativo de abandono. Faz parte de uma tentativa de eles criarem um factóide, não tem nenhuma possibilidade”, diz. “Tentou-se reproduzir na Venezuela, com a legislação, os golpes em Honduras, Paraguai e Brasil. Esse golpe, por essa via, não se viabilizou. Dizer que ele abandonou o cargo é forçar a realidade. Essa ação fracassou, por enquanto. É o último recurso no plano legal”, explica.

“A situação na Venezuela continua muito difícil, mas há um alento: o aumento do preço que petróleo, que foi significativo ao longo de 2016”, continua Maringoni.

No final do ano passado a Opep reestabeleceu cotas de produção para seus membros, diminuindo significativamente a oferta mundial do produto e, consequentemente, elevando seu valor. Em janeiro de 2016, o preço do barril de petróleo cru girava em torno de 26 dólares. No mesmo período deste ano, dobrou, alcançando o patamar de 52 dólares.

“Como a Venezuela continua dependente do petróleo – e isso é um problema sério – a perspectiva é de melhoria. Não que vai mudar da água para o vinho, mas é uma tendência de melhoria do quadro. Não está na situação que estava há alguns meses”, projeta Maringoni.

Histórico

A declaração, e sua posterior anulação, é mais um capítulo na disputa entre os poderes na Venezuela. Desde agosto de 2016, a Justiça considera que o Legislativo vem atuando “em desacato” às instituições, por realizar sessões com a presença de três parlamentares que tiveram seus mandatos suspensos por suspeitas de fraude nas eleições.