2016 e o futebol feminino

Oxalá estamos a poucos dias do encerramento de um ano recheado de desgosto, retrocesso, assalto aos direitos conquistados pela classe trabalhadora e a evidente articulação de grupos elitistas para a manutenção de seu status quo.

Por Lu Castro

Formiga Rubensson

Ainda que o desânimo nos tenha tomado o espírito em vários momentos deste fatídico 2016, convém reforçar que os obstáculos nos são apresentados como forma de fomento da luta que nos aguarda em 2017.

Dentro desta perspectiva, sublinho a necessidade de permanecermos firmes ante as possíveis investidas contra o que já conquistamos para as mulheres do futebol. Importante destacar que no ano em que disputamos os Jogos Olímpicos em casa, “saltamos” de sexto lugar em Londres para quarto lugar. No ranking FIFA, o Brasil passou de 4º lugar em dezembro de 2013 ~antes dos investimentos na seleção permanente~ para 9º no ranking do último 23 de dezembro.

Se avaliarmos os recursos injetados na seleção, a qualidade de nossas atletas e o tempo entre um torneio olímpico e outro, é fácil afirmar que a campanha Rio 2016 foi sofrível. Não bastasse a desilusão com as Olimpíadas ~apesar de não projetar medalha para o Brasil, mantive a esperança~, ainda tivemos dois mundiais de categoria de base em que fomos muito mal se considerarmos os investimentos nas seleções Sub17 e Sub20.

Não demorou para que a comissão técnica fosse dispensada e contra todas as expectativas, a CBF anunciou a primeira mulher a comandar a seleção feminina principal: Emily Lima. Além da escolha, que corrobora a necessidade de cargos com representatividade feminina, a primeira competição da seleção sob o comando de Emily foi conquistada com um futebol muito diferente do que vínhamos acompanhando. E, saliente-se: diferente, no caso, foi sinônimo de melhor.

Se dentro de campo as futebolistas deram show, o sexismo se fez presente em manchete de jornal. A mobilização que promovemos nas redes sociais foi suficiente para uma retratação e a exposição negativa da publicação manauara. Ficou bem claro: Respeita as minas!

Mesma disposição não é encontrada entre as atletas. Em momentos como este, é imprescindível um posicionamento enfático onde o androcentrismo é gritante como no universo do futebol.

Há anos discorro sobre a necessidade das mulheres futebolistas se posicionarem como classe e se unirem para suprimir as tantas injustiças sofridas. De um jogo sem ambulância ao não repasse de recursos recebidos pela participação em algumas competições, passa da hora das mulheres da bola buscarem conhecimento sobre seus direitos e que estes suplantem o amor pelo jogo.

Reforço o que já manifestei em tantos outros espaços: Nada vale correr o risco de perder a dignidade. E isso invariavelmente ocorre no futebol feminino. Exemplos não faltam e lamento dizer que sobrarão em 2017. Começo pela não participação do Brasil na Algarve Cup em razão do custo e, segundo informações do comentarista da Band no Torneio Internacional de Manaus, por estar “desprestigiado”.

Até a Copa do Mundo da França, em 2019, teremos poucas oportunidades de testar o trabalho de Emily. A Algarve Cup seria fundamental para este teste e o “desprestígio” citado, significa a ausência de seleções como Estados Unidos, Alemanha e França, como se todo o futebol feminino se resumisse a estes três países.

Para a edição de 2017, estão confirmadas seleções como Noruega, Espanha, China, Dinamarca, Japão, Austrália, Suécia (campeão olímpica), Canadá (para quem perdermos a medalha de bronze), entre outras. Não entendo o “desprestígio” como argumento para ausência da nossa seleção.

Só para lembrar, a competição acontece desde 1994 e o Brasil participou pela primeira vez em 2015, ficando com o 7º lugar. Este ano, o Brasil ficou com o 2º lugar, perdendo para o Canadá. Em ano com poucas datas FIFA, não estar presente em torneio tradicional como este, implica uma absurda falta de planejamento, ou boa vontade mesmo.

Poderia passar horas pontuando todos os fatos e elementos que denotam a ausência de consciência de classe trabalhadora por grande parte das atletas brasileiras. Entretanto não acredito que minhas palavras serão tomadas com seriedade por todas, já que, de certo modo, o sonho do coletivo forte pertence a poucas, e estas, em sua maioria, já penduraram as chuteiras.

Ademais, da necessidade surge a ação, do caos nasce a ordem e da retirada de direitos é que se acorda para a luta como proletariado. Que pelo menos isso se realize no ano que se avizinha.

Continuaremos com força!