Preso e torturado, Aldo diz: Tenho profunda gratidão por D. Paulo

A morte de Dom Paulo Evaristo Arns, arcebispo emérito de São Paulo, repercutiu durante todo o dia nesta quarta-feira (14). Aos 95 anos, Dom Paulo teve uma trajetória que entrou para a história por seu compromisso com a democracia, no combate à ditadura militar nas décadas de 60, 70 e 80, e por sua atuação em defesa dos mais pobres.

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Mas para a vida de algumas pessoas, a atuação de Dom Paulo Evaristo Arns representou o fim da tortura e da repressão. É o caso de Aldo Arantes, advogado, membro do Comitê Central do PCdoB, que foi preso pela ditadura em 1976, por ocasião da Chacina da Lapa.

“Dom Paulo Evaristo Arns teve uma atitude muito corajosa de combate à ditadura militar e de solidariedade aos presos, de apoio e denúncia da tortura e dos assassinatos”, reafirma Aldo.

E segue: “Eu, pessoalmente, tenho um reconhecimento muito grande e uma gratidão profunda pela sua luta em defesa da democracia e o papel que desempenhou na minha vida, pois a atitude que ele tomou naquele momento ajudou que a tortura que era cometida contra mim cessasse”.

Aldo Arantes conta que em 1976 foi preso, juntamente com outros trabalhadores. “Minha mãe, que foi me visitar no DOPS e viu as marcas da tortura, o procurou. Ele revelou que Dilermando Monteiro, então comandante do II Exército, havia prometido que não haveria tortura, mas minha mãe mostrou que não era verdade e pediu ajuda. Dom Evaristo disse que a saída era denunciar, mas que todos corriam o risco de sofrer o que eu estava sofrendo. Minha mãe, com o apoio do Dom Evaristo, denunciou”, relembra.

Aldo disse que após sua libertação, decidiu fazer uma visita ao arcebispo, como forma de agradecimento pela sua atitude. “Dom Paulo me confidenciou que antes da minha prisão na Lapa, tomou conhecimento de que a repressão iria realizar o massacre e tentou nos avisar, mas não conseguiu, pois muitos estavam na clandestinidade. Ele ficou sabendo disso num encontro na embaixada americana”, conta.

A chacina da Lapa aconteceu em 16 de dezembro de 1976. Foi uma operação da ditadura militar contra o Comitê Central do PCdoB, que culminou com o assassinato de três dos dirigentes do partido: Pedro Pomar, Ângelo Arroyo e João Batista Drumond.

E acrescentou que Dom Paulo contou a ele que após a denúncia da tortura, o general Dilermando, que assumiu o comando do exército após o assassinato do jornalista Vladimir Herzog e do metalúrgico Manoel Fiel Filho, havia jurado que, enquanto fosse general, não haveria tortura.

“Após a denúncia da minha tortura, o general passou a ligar para ele para pedir que fosse celebrada uma missa de 31 de março. Ele não aceitou. O general insistiu em tentar falar com ele por telefone, até que decidiu ir pessoalmente até Dom Paulo. O general dizia que era uma data muito importante, mas Dom Paulo o lembrou da promessa que havia feito e descumpriu. O general se calou e foi embora”, contou.

E conclui: “Todo preso político ou qualquer pessoa que conheça a luta contra a ditadura tem que reconhecer o papel do Dom Evaristo. A sua opção pelos pobres, pelos trabalhadores e pela liberdade une cristãos e comunistas. Nós temos o dever de reconhecer o seu papel nessa luta”.