Reforma da Previdência de Temer agrava situação degradante do campo

Calamitosa: É a realidade do trabalhador rural na avaliação do secretário de Assalariados(as) Rurais e de Políticas Sociais na área da Previdência Social da Federação dos Trabalhadores na Agricultura no Estado do Paraná (Fetaep), Carlos Gabiatto. Oito anos é a média de idade em que o homem e a mulher do campo começam a trabalhar, com jornadas de 15 horas e excluídos do acesso às políticas públicas. A reforma da Previdência Social de Michel Temer agrava a situação.

Por Railídia Carvalho     

Trabalhador rural

Anunciada nesta semana e tramitando com velocidade recorde no Congresso Nacional, a Proposta de Emenda Constitucional (PEC) 287, proposta por Michel Temer, institui a idade mínima de 65 anos para a aposentadoria de todos os brasileiros. Sem distinção. 

Pela regra atual, os trabalhadores rurais que comprovam a atuação na atividade podem se aposentar aos 60 anos, os homens, e aos 55 anos, as mulheres. Na atual reforma, o agricultor terá que trabalhar mais cinco anos enquanto a agricultora mais dez anos.
É o tiro de misericórdia no trabalhador que, pelas degradantes condições em que atua na zona rural, tem uma expectativa de vida e capacidade laboral menores do que tem em média o trabalhador urbano. 
Completam o quadro de calamidade as estatísticas divulgadas em 2011 pela Confederação Nacional dos Trabalhadores Rurais Agricultores e Agricultoras Familiares (Contag): Apenas 1% da população rural tinha acesso à rede sanitária, 8,7 milhões de pessoas vivem sem água no campo e 40% da população do campo nunca havia ido a uma consulta médica em 2008. 
Sem futuro
“Quando se fala em reforma sabemos que não é para a agregar mas, sim, para retirar direitos”, analisou Gabiatto. Na opinião dele, o conteúdo da proposta de Temer decreta o fim da esperança do trabalhador rural permanecer no campo produzindo alimento. 
 
“A aposentaria atualmente representa para mais de 70% dos aposentados 90% da renda daquele trabalhador e trabalhadora. O trabalhador que se aposenta hoje aos 60 anos, com muita dificuldade, ainda continua trabalhando para complementar a renda da família. Quem vai dar trabalho para quem tem 65 anos? Sem contar que no Sul a expectativa é de 70 anos mas no Nordeste é menor”, enfatizou o dirigente. 
Jaelson Santos é o presidente do Sindicato dos Trabalhadores Rurais de Jupi, localidade do Agreste pernambucano. Trabalha na agricultura desde os 8 anos de idade e hoje está com 39 anos. 
 
“Essa notícia tira toda a perspectiva da gente, que somos uma classe sofrida, de ter um futuro pela frente. Acaba com o sonho de ter um lazer no futuro e acaba mesmo com a autoestima de você estar trabalhando se dedicando a produzir alimentação”, declarou ao Portal Vermelho.
Contribuição inviável
“Um agricultor hoje que trabalha no pesado e no serviço braçal quando chegar o tempo de se aposentar, se chegar, estará sem condições físicas e mentais para ter acesso a um benefício que é de direito”, exemplificou Joelson. O pacote de maldades de Temer para o trabalhador rural prevê também uma contribuição obrigatória para a Previdência. 
 
Gabiatto afirmou que essa contribuição é inviável para o trabalhador rural. “Nem sempre o trabalhador tem renda mensal. A maioria são rendas bimestrais ou anuais. Considerando isso, vai haver um recebimento menor por parte da Previdência e a inadimplência vai aumentar”, esclareceu.
Precarização
A reforma da Previdência proposta por Temer torna mais distante a aposentadoria do trabalhador e da trabalhadora rural, que em boa parte é penalizado pelo trabalho informal. Segundo Joelson, o trabalhador tem dificuldades em comprovar a atuação no campo, o que gera situações que fizeram a cidade de Jupi registrar a recusa de cerca de 30% dos pedidos de aposentadoria. 
 
Gabiatto informou que houve um período no Paraná que metade dos pedidos de aposentadoria foi rejeitada pelo Instituto Nacional da Seguridade Social (INSS).  “O trabalhador, principalmente aquele bóia-fria, que percorre as fazendas vendendo o seu trabalho, não é reconhecido pelo empregador, daí ele precisa recorrer à Justiça do Trabalho”, complementou.
Para conseguir o benefício o trabalhador enfrenta dificuldades que vão desde a relação de documentos para a aposentadoria até às diversas interpretações da lei pelos agentes do INSS. Ainda assim mantinha uma expectativa de vida que se desfaz com o texto da reforma. 
Economia nos municípios
“Para a grande maioria dos rurais, a aposentadoria representa uma condição de vida que ele nunca teve. Na grande parte do nosso país poucas famílias vão ter uma renda per capita de um salário mínimo”, lembrou Gabiatto.
 
Segundo o dirigente da Fetaep, são 20 milhões de aposentados na área rural. Os recursos movimentam a economia de pequenos municípios do país. Gabiatto exemplificou que no município de Jesuítas (PR) a renda das aposentadorias é três vezes maior que a verba do Fundo de Participação dos Municípios (FPM).
Em Jupi não é diferente. “Na região atravessamos um tempo de seca há cinco anos. A aposentadoria dos rurais é uma das economias que gera e tem segurado o município ao lado do Bolsa Família, de políticas públicas dos governos anteriores”, afirmou Joelson. Segundo ele, o mais recente censo do IBGE apontou que 65% da população do município são formados por agricultores familiares.
Mudança na aposentadoria dos trabalhadores rurais não impactará apenas o trabalhador. Esse é um dos argumentos dos dirigentes para formar uma frente de oposição à PEC 287. De acordo com Gabiatto e Joelson, as entidades de trabalhadores têm realizado reuniões com o poder público, associações e juntas comerciais para se contrapor ao texto da reforma atual.
“Houve uma melhoria muito grande com a política de valorização do salário mínimo no governo Lula. Aqueceu o comércio, melhorou a qualidade de vida. É preciso mostrar a importância da Previdência para o município, qual a economia que gera dentro do município. Hoje é claro que essas mudanças na Previdência vão ter consequências para o comércio. Quem vai querer se manter no campo produzindo para não conseguir se aposentar?”, questionou Joelson.
Gabiatto completou que está sendo realizado um planejamento para o início de 2017 devido às mudanças nas Câmaras e nas prefeituras após as últimas eleições. O diálogo será retomado com os novos gestores e parlamentares.
“A grande maioria dos trabalhadores, seja no sul, sudeste, norte, nordeste e centro-oeste é calamitosa até porque a Previdência rural é muito nova. Tem praticamente 25 anos. Daí você pegar uma coisa de 25 anos e diz que não presta mais. Os trabalhadores não vão aceitar retroceder.”