Testemunhas do próprio MPF derrubam tese de acusação contra Lula

Os depoimentos das testemunhas no processo contra Luiz Inácio Lula da Silva na 13ª Vara Federal de Curitiba tem reforçado que a denúncia do Ministério Público Federal aceita pelo juiz Sérgio Moro são baseadas apenas em convicções. Nesta quinta (24), foi ouvida a quinta testemunha de acusação, o ex-diretor da Petrobras, Nestor Cerveró, que afirmou que não conhecia e não teve contato com Lula quando assumiu a diretoria, em 2003, e que não foi indicado pelo ex-presidente ao cargo.

Por Dayane Santos

Deltan Dallagnol - EPA

“Não houve negociação com o Lula. Eu soube que quem fazia essas indicações na época era o ministro Zé Dirceu. Não conheci o presidente Lula nessa época e não sei de nenhuma interferência dele neste caso”, afirmou Cerveró, que condenado cumpre prisão domiciliar

Foi o que bastou para a mídia afirmar que Cerveró mudou o depoimento. A manchete do UOL, site ligado à Folha de S. Paulo, disse: "Cerveró muda versão e nega que Lula o tenha indicado para a Petrobras em 2003". No entanto, a afirmação de Cerveró não é novidade. Em depoimento de delação premiada vazado pela grande mídia em junho desde ano, o ex-diretor afirmou que aos investigadores que não foi indicado pelo ex-presidente Lula para a área internacional, mas disse que interpretou como se fosse, pois, alguém disse a ele que Lula teria dito ao José Sérgio Gabrielli, presidente da Petrobras na época.

Sobre o triplex no Guarujá, principal alvo das investigações do MPF e apontado como sendo de propriedade oculta de Lula, Cerveró foi incisivo em dizer que não conhece o local. “Eu não conheço nem o Guarujá. A informação que eu tenho é a da mídia”, disse.

Cerveró disse que o então presidente defendeu a instalação de refinarias no Nordeste e a internacionalização da empresa, mas reforçou que Lula jamais interferiu em qualquer contrato.

“Quando eu entrei a Petrobras atuava em 6 países. Quando eu saí, eram 27. O presidente Lula era simpático à ampliação da Petrobras como uma ampliação da atuação do Brasil no exterior”, afirmou Cerveró.

Ao sair da audiência, o advogado de Lula, Cristino Zanin, afirmou que o depoimento confirmou que o ex-presidente Lula não tem qualquer envolvimento com os contratos relacionados na denúncia e também com o triplex do Guarujá.

"Em momento algum, Nestor Cerveró fez qualquer afirmação que pudesse envolver o ex-presidente Lula. É mais um delator que vem depor e não confirma qualquer acusação do Ministério Público. A acusação referente ao triplex ruiu, porque não há qualquer sustentação em provas que possa sustentar essa denúncia", reforçou Zanin.

Outra tese dos procuradores que caiu por terra foi a "corrupção sistêmica". No depoimento desta quarta, Cerveró disse que quando assumiu o cargo, não firmou nenhum acordo para pagamento de propina ou arrecadação para fundos partidários, tese que fundamento a convicção dos procuradores da Lava Jato. ”Anteriormente a minha nomeação eu não fiz nenhum tipo de acordo preliminar de qualquer tipo de compromisso nesse sentido. Depois da minha nomeação aconteceu, como já descrevi em outros depoimentos”, afirmou.

Questionado pelo próprio MPF, Cerveró enterrou a estratégia da acusação de que havia "corrupção sistêmica" ao afirmar que não sabe dizer se Lula tinha conhecimento sobre a utilização da diretoria para distribuição de valores para os partidos.

“Eu não sei dizer. As minhas reuniões com o presidente Lula foram sempre reuniões em conjunto com a diretoria. Eu nunca tive uma conversa privada com o presidente Lula sobre este assunto”, afirmou Cerveró.

Ora, se Lula era o responsável por todo o esquema, como diz o MPF, como Ceveró, réu confesso nos crimes da Lava Jato, não saberia?

A cantilena de que alguém disse que disseram foi mais uma vez a marca do depoimento de Cerveró nesta quinta. Disse que precisou sair da diretoria da área internacional por negociações políticas e que o ex-presidente da Petrobras, José Eduardo Dutra, teria dito a ele que Lula falou que o queria no cargo de diretor financeiro. “Eu teria que sair do cargo e Lula falou para o conselho me indicar para a outra diretoria que estava vazia na época, mas isso é o que ele me disse”, falou.

Sobre seu padrinho, Delcídio do Amaral, também delator e testemunha de acusação, Cerveró disse que o ex-senador recebeu propinas em relação as Alstom e GE. Ele lembrou do caso envolvendo a gravação em que Delcídio aparece pedindo para que não fosse citado no depoimento de delação premiada do ex-diretor.

Delcído, por ser filiado ao PSDB, foi convidado para ser Diretor de Gás e Energia pelo então ministro Rodolpho Tourinho, do governo FHC (1999 a 2001). Ele saiu do PSDB para se filiar ao PT em 2001, se elegendo senador em 2003. Diante da influência que exercia por ter ocupado o cargo durante o governo FHC, Delcídio admitiu em delação que atuou dentro do PT para manter Cerveró na diretoria da Petrobras, agora como diretor da área Internacional.

Além de descartar qualquer envolvimento de Lula, Cerveró disse que o ex-presidente não participou da suposta tentativa de obstrução da Justiça ao tentar comprar o seu silêncio nos depoimentos. O fato foi revelado em gravações feitas pelo seu filho em conversas com Delcídio, o que çevou a sua cassação.

"Ele [Cerveró] disse que quem tinha interesse em impedir que fizesse a delação era o próprio Delcídio", contou Zanin.

Sob orientação dos seus advogados, Cerveró se recusou a responder se está negociando acordos de delação com outros países. É a quarta testemunha listada pelo Ministério Público Federal no processo contra o ex-presidente Lula que estaria negociando colaboração com outros países. E a quinta, em 8 testemunhas, que se recusa a responder perguntas por estar negociando acordos de delação com autoridades brasileiras ou estrangeiras.

Roberto Costa

O também ex-diretor de Abastecimento da Petrobras, Paulo Roberto da Costa, disse nunca ter tido nenhuma reunião sozinho com o ex-presidente Lula nem qualquer conversa a respeito de atividades fraudulentas.

Costa também negou que o apelido "Paulinho", divulgado amplamente pela mídia como sendo o modo que chamava o ex-presidente Lula. Segundo ele, esse é o apelido que tem entre seus familiares.

"Nunca tive intimidade com o presidente Lula. Não existe isso dele ter usado (esse apelido) diretamente. Nunca tive uma reunião sozinho com o presidente Lula. Se ele usava com outras pessoas, eu não sei."

Os depoimentos das testemunhas arroladas pelo próprio MPF reforçam que não há provas, apenas ilações, suposições, e hipóteses, ou melhor, as convições dos procuradores.