O México em choque pelo triunfo de Donald Trump

A vitória de Donald Trump repercutirá na América Latina e seus cidadãos e governantes o sabem. Os jornais mexicanos despertaram com manchetes como “terremoto!”, supondo o futuro político do país vizinho e prevendo que seu país será o mais afetado pelas políticas comerciais e sociais que a Casa Branca pode passar a tomar.

Enrique Peña Nieto - Divulgação

O novo presidente dos Estados Unidos, principal sócio comercial do país latino-americano, baseou sua campanha eleitoral num constante ataque xenófobo sobre os mexicanos, tachados por ele de delinquentes em várias ocasiões. Trump ameaçou realizar deportações massivas de latinos indocumentados assim que chegar ao poder.

Todos esses ataques desmedidos contra um sócio comercial prioritário dos próprios Estados Unidos foram feitos por um magnata nova-iorquino que também prometeu levantar um muro ao longo de toda a fronteira entre ambos os países. Mas essa pode soar como um problema menor para os que já vivem do lado norte da fronteira, se comparado com os efeitos que teria para os mexicanos, de ambos os lados, a possível renegociação do tratado de livre comércio e o controle do envio de remessas de dólares, outras duas promessas de Trump.

O México recebe cerca de 30 bilhões de dólares anuais através das remessas dinheiro dos seus imigrantes nos Estados Unidos – isso é mais do que arrecadado a partir das vendas de petróleo. Até agora, a única boa notícia a respeito da abrupta desvalorização do peso mexicano com relação ao dólar – pelo chamado Efeito Trump – é pelo fato de que as remessas de 2016 cresceram em 25% em comparação com o ano anterior, e na metade deste ano já chegavam a 17,7 bilhões de dólares.

Mas isso é um detalhe perto do fato de que aconteceu o que ninguém queria que acontecesse. Já nesta quarta-feira, o governo mexicano começou a trabalhar num plano de contingência, para preparar o país para enfrentar os diferentes caminhos que podem se apresentar para uma economia dependente do comércio com o que agora não é mais um vizinho tão amigável.

O presidente Enrique Peña Nieto tardou sete horas para reagir ao fato de que seu novo interlocutor será Donald Trump. Seu encontro com o magnata há poucas semanas, em plena campanha eleitoral estadunidense, fez desabar os seus índices de popularidade. A opinião pública mexicana não o perdoou por sua passividade diante de um fanfarrão dedicado a depreciar os mexicanos nos Estados Unidos. Agora que esse fanfarrão já é presidente, o mandatário mexicano se limito a publicar mensagens de felicitação em sua conta de twitter, dizendo que “o México e os Estados Unidos são amigos, sócios e aliados, que devem seguir colaborando pela competitividade e pelo desenvolvimento da América do Norte”.

Posteriormente, o presidente mexicano informou que havia mantido um diálogo “amável e respeitoso” com Trump, e que tem uma reunião marcada com o novo presidente, para iniciar um “novo capítulo” da relação bilateral, na qual garantiu que o México terá um trato “preferencial”.

Contudo, esses desejos chocam com o que disseram o ministro da Fazenda, José Antonio Meade, e o presidente do Banco do México, Agustín Cartens, na coletiva que foram obrigados a fazer, de forma urgente, às sete da manhã, poucas depois de se conhecer o triunfo do republicano. A entrevista visava conter os ânimos dos mercados, devido à queda livre do peso mexicano, que atingiu marcas negativas históricas.

Durante a jornada desta quarta-feira (9), o peso mexicano caiu cerca de 10%, ficando em 20,22 pesos por dólar. A perspectiva é de que supere o recorde de 23 pesos por dólar até o final desta semana, o que significa que o país terá que revisar as taxas de juros e os gastos correntes do Executivo, para evitar uma fuga massiva de capitais como resultado da debilidade da moeda nacional.

“Nossas finanças públicas e a fortaleza das nossas instituições públicas e privadas nos permitem evitar reações prematuras que se adiantem aos fatos e que por enquanto desconhecemos”, declarou Meade.

Enquanto isso, todos os grandes meios de comunicação do país vivem o mesmo estado de incredulidade, assim como toda a população: “Por incrível que pareça, Trump ganhou e festejou assim”, mostrou a capa do diário Milenio, que trazia dois subtítulos: “México forte após as eleições nos Estados Unidos” e “Fazenda: peso continua em queda”.

Já o periódico Excelsior anunciou que “Com o triunfo de Trump, o México defende sua fortaleza econômica com reformas”, enquanto El Universal dizia “Clinton obtém mais votos, mas Trump se impõe no colégio eleitoral”. Outra capa foi a do diário Reforma: “Triunfo de Trump surpreende o mundo”.

Em todo caso, os danos e a fratura social é profunda entre os vizinhos que historicamente já mantinham relações complicadas. Os bons tempos surgido após a assinatura do tratado de livre comércio (nos Anos 90), conseguiram diminuir um pouco essas tensões históricas, que agora voltam a se estremecer, com o doloroso triunfo de um candidato que se passou os quinze meses da campanha se burlando e humilhando os mexicanos. “Quem vai pagar o muro?” perguntava Trump aos seus seguidores nos comícios, e a resposta vinha em uníssono, entre gargalhadas: “o México!”.

A mensagem de desprezo foi entendida no lado sul da fronteira, e instalou um panorama complicado de se recompor, entre um líder que insultou a todo um país e um povo, e o governo que não pode se dar ao luxo de romper relações com esse líder e o país que governará. Choveu forte durante as últimas horas na Cidade do México, caiu uma autêntica tempestade, de tristeza e de indignação.

Brasil

Por sua parte, no Brasil, o presidente Michel Temer também enviou sua mensagem: “senhor presidente eleito, lhe felicito pela eleição como presidente dos Estados Unidos. O Brasil e os Estados Unidos são duas grandes democracias, que compartilham valores e mantém historicamente fortes relações nos mais diferentes âmbitos. Tenho certeza que trabalharemos juntos para estreitar ainda mais os laços de amizade e cooperação que unem os nossos povos. Desejo a você o pleno sucesso como governante dos Estados Unidos”.

Além da nota oficial, numa entrevista para uma rádio local, Temer disse que a vitória de Trump “não muda nada” entre os dois países, porque “a relação do Brasil com os Estados Unidos é uma relação institucional, de Estado a Estado”.