Ingressos caros, elitização das arquibancadas e poder das emissoras

O confronto entre corinthianos e o Grupamento Especial de Policiamento em Estádios (Gepe) não foi a única violência do jogo Corinthians X Flamengo. O valor dos ingressos para o público geral, R$ 80,00 (Fla) e R$ 100,00 (Timão), é uma agressão às duas torcidas, caracterizadas pelo perfil popular.

Por Penélope Toledo*

estádio vazio

Entradas a preços altos têm sido uma constante, principalmente para a torcida visitante, e envolve vários clubes. O Coritiba, por exemplo, se recusou a vender a sua cota de ingressos para o clássico contra o Atlético-PR, em protesto aos valores definidos pelo arquirrival: R$200,00 (inteira) e R$100,00 (meia-entrada).

Não é só em competições entre clubes. A CBF estabeleceu que o preço mínimo a ser pago pelos potiguares para assistir à partida entre Brasil x Bolívia, pelas Eliminatórias da Copa do Mundo, era R$150,00. Uma baita inflação, considerando-se que há cerca de um ano, os jogos da Seleção custaram R$ 60,00 (em Salvador) e R$ 70,00 (Fortaleza).

Enquanto isso, os setores populares dos estádios têm sido reduzidos ou exterminados, como é o caso da famosa e lendária Geral, do Maracanã. E seus lugares estão sendo tomados pelas frias cadeiras numeradas e pelas aristocráticas áreas vips.

Consequências no estádio

A consequência imediata é a queda de público nos estádios. O líder do ranking de equipes das séries A, B e C em 2016 até o momento, segundo o Futdados, é o Corinthians, cuja média é de 31 mil pagantes por jogo, o que representa uma ocupação de cerca de apenas 69% do estádio. Na sequência vêm Palmeiras, São Paulo, Grêmio e Cruzeiro.

O perfil de quem vai ao estádio mudou. Substituindo o povão, expulso, eis o público elitizado, consumidor de diversos produtos nas arenas. Gente que só vai quando o time está bem, que vê o jogo sentada, sem cantar e empurrar, sem bandeiras, faixas e coreografias, fazendo coraçãozinho para as câmeras. Gente que pode ser chamada de tudo, menos de torcedora.

Os planos de fidelização até barateiam as entradas, mas às custas do encarecimento para quem não tem plano. Além de transformarem torcida em clientela, com carnês de pagamentos, pontuações e prêmios. Há jogos decisivos vendidos apenas a quem tem muitos pontos, descartando quem mora longe e não pode ir sempre.

Consequências fora do estádio

Fora do estádio, resta assistir pela TV, o que dá grande poder à Globo, que detém o monopólio da transmissão aberta. No Flamengo, que teve a maior receita em 2015, a verba televisiva foi 36%, quase R$ 200 milhões. Em segundo vem o marketing, que também se utiliza da TV. As transferências de atletas representam 3% sobre o total.

Responsável pela principal fonte de renda de muitos clubes, a emissora tem o poder de escolher quais partidas serão transmitidas, seus horários, – ainda que prejudique os/as torcedores/as, como os jogos às 22h – e o quanto cada clube vai receber, com cotas diferenciadas que geram arrecadações discrepantes.

Se o jogo não for o escolhido, o/a torcedor/a é obrigado/a a pagar canais por assinatura para acompanhar seu time.

A arquibancada como espaço popular

Longe dos clubes mais badalados, o valor dos ingressos é verdadeiramente popular. O Salgueiro, de Pernambuco, por exemplo, tem o preço médio de R$3,00. E o Bragantino, campeão paulista em 1990 e vice do Brasileiro de 91, tem média de R$5,00.

Com o Maracanã fechado para a Olimpíada, os/as torcedores/as de Flamengo e Fluminense se deram bem no início do Brasileirão, pois seus clubes mandaram os jogos em cidades menores e reduziram o valor dos ingressos. Na volta do Maraca e sendo reta final do campeonato, entretanto, o valor das entradas disparou.

Ou seja, quem é pobre não tem o direito de assistir aos jogos de todos os clubes, tampouco em todas as fases das competições. Isto, em um esporte que se reivindica popular, isto, em um país em que mais da metade da população é classificada como de baixa renda (50,9%).

Perdem os/as torcedores/as, que são tolhidos/as da emoção ímpar tomar as arquibancadas e vibrar de perto com o seu clube do coração. Perde o futebol, que vê a festa mágica de cores, luzes e sons dar lugar à frieza do espectador padrão-Fifa.