Moro não se declarar impedido de julgar Lula revela estado de exceção

Para Geraldo Prado, professor de Direito Processual Penal da Universidade Federal do Rio de Janeiro, afirma que o fato do juiz Sérgio Moro, responsável pelo processo da Lava Jato na primeirainstância, não se declarar impedido de processar e julgar o ex-presidente Lula é uma demonstração do estado de exceção que o Brasil vive atualmente.

Geraldo Prado professor da UFRJ

"Sérgio Moro não se declarar impedido de processar e julgar o ex-presidente Lula depois de divulgar ilegalmente escutas telefônicas de Lula e da ex-presidente Dilma e após o TRF4 declarar que o juiz atuou fora dos marcos legais porque diante de situação excepcional nos mostra o que realmente a Lava Jato revelou", afirmou o jurista.

Prado ressalta que o fato do TRF ter justificado a conduta ilegal de Moro, apenas significou que ele não será penalizado, salvo se o Conselho Nacional de Justiça (CNJ) identificar irregularidade no procedimento administrativo, o que pode levar anos.

"O fato incontroverso à luz do direito é que, ao despir-se objetivamente da imparcialidade, que é premissa da atuação jurisdicional, e ver isso reconhecido pelo tribunal, ainda que a título de comportamento excepcional, Sérgio Moro naquele momento assumiu a postura contraposta a de Lula e tornou-se impedido de julgar", explica.

E completa: "Seguir no processo por iniciativa própria e/ou com aval do tribunal reafirma o que ninguém ignora, no Brasil e hoje também muito claramente no exterior: que a "única grande revelação da Lava Jato" é a de que a Constituição da República foi colocada de lado neste processo. Ela, Constituição, não vale mais".

Para justificar as suas condutas, Moro admitiu que "estamos em tempos excepcionais". Segundo Prado, "quando um juiz de primeira instância suspende a aplicação da Constituição, qualquer que seja a hipótese, e segue dirigindo o processo com respaldo do tribunal, não há mais regras, a segurança do direito foi substituída pela força apoiada exclusivamente na autoridade".

Geraldo Prado rebate a tese que de a Lava Jato revelou a grave e incontestável situação de corrupção no Brasil. "Esta sempre foi bastante conhecida. Dizer ignorar e ignorar de fato são coisas distintas. Tampouco a Lava Jato mostrou como enfrentar a corrupção, pois em outros Países, que experimentam situações semelhantes, igualmente graves, a apuração dos crimes obedece a normas legais e não se converte em cruzada", enfatizou.

Para ele, a Lava Jato revelou, em sua maioria, "uma incrível capacidade de somente enfrentar a corrupção corrompendo a Constituição, consciências e liberdades".

Mas ressalta que em vários procedimentos houve investigação, citando a cooperação internacional que, segundo ele, mostrou-se relevante instrumento de descoberta de crimes e a análise criteriosa de dados obtidos mediante levantamento de sigilos construiu hipóteses acusatórias plausíveis.

"No entanto, quando de forma deliberada a legalidade foi jogada para escanteio, o que se viu foi apenas mais do mesmo. Mais do mesmo em prejulgamentos, em condutas de índole política não disfarçada porque ancoradas no discurso do interesse público", reforçou.

Para o professor da UFRJ, "o cenário está dominado por um moralismo tão de ocasião, como em outras épocas, quando era necessário mudar para manter tudo do mesmo jeito".

"O público supostamente "dono da opinião" está cansado da corrupção e, como se dominado por um pensamento mágico, aguarda ansioso o clímax, para tocar sua vida adiante, não falar mais disso", salientou ele, se referindo às manipulações das grande mídia com seus vazamentos seletivos. "Até a Lava Jato, como se de gente se tratasse, já declarou que está perto do fim", lembrou.

"O único final efetivo, gostem ou não os que discursam em favor do que vivemos, é o do estado de direito. Sei que há muitos que lutam pelo restabelecimento da legalidade e, principalmente, da racionalidade no campo jurídico e político. Estes que teimam devem confiar em sua luta pacífica. Devem lembrar da máxima de Rui Barbosa: a liberdade individual não é bem de um único sujeito, mas patrimônio comum da sociedade", concluiu.