Para funcionários do Ipea, presidente constrangeu pesquisadores

A Associação de Funcionários do Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Anfipea) divulgou nota, nesta sexta (14), na qual critica a postura da Presidência do órgão, que contestou em seu site estudo realizado por pesquisadores do instituto sobre os impactos negativos da PEC 241 na Saúde. A Anfipea se solidariza com os autores do estudo, avalia que a nota da Presidência "impõe constrangimentos" à atuação dos pesquisadores e destaca importância da independência.

lozarno, iepa

A Nota Técnica Ipea “Os impactos do Novo Regime Fiscal para o financiamento do Sistema Único de Saúde e para a efetivação do direito à saúde no Brasil”, publicada no dia 21 de setembro e assinada por Fabiola Vieira e Rodrigo Benevides, aponta que, caso seja aprovada, a PEC que fixa um teto para os gastos públicos vai retirar recursos da saúde.

Em uma área já reconhecidamente subfinanciada, não será possível sequer manter o atual e já insuficiente grau de acesso e qualidade de serviços, mostra o estudo, que ganhou ampla repercussão.  

“A PEC 241 impactará negativamente o financiamento e a garantia do direito à saúde no Brasil. Congelar o gasto em valores de 2016, por vinte anos, parte do pressuposto equivocado de que os recursos públicos para a saúde já estão em níveis adequados para a garantia do acesso aos bens e serviços de saúde”, afirmam os pesquisadores.

Na última terça (11), o presidente do Ipea, Ernesto Lozardo, divulgou nota desautorizando o estudo. Segundo o texto, publicado com destaque no site da instituição, as análises feitas pelos pesquisadores “são de inteira responsabilidade dos autores e não representam a posição do Ministério do Planejamento, Desenvolvimento e Gestão (MPDG), tampouco do Ipea”.

Em dez tópicos, o presidente do Ipea tenta desconstruir as informações da pesquisa. "A posição institucional do Ipea é favorável à PEC 241, por entender que ela possibilitará o equilíbrio das contas federais e um novo círculo virtuoso de crescimento", escreveu. Lozardo assumiu após o impeachment de Dilma Rousseff, sob questionamentos dos funcionários do órgão em relação à sua qualificação para o cargo.

No mesmo dia em que a nota foi publicada, a coautora do estudo, Fabiola Vieira, deixou o cargo que ocupava no Ipea.

A Anfipea afirma que a Nota Técnica em questão integra um conjunto de estudos sobre a PEC 241, orientados pela mesma abordagem metodológica, e que o texto foi previamente avaliado e aprovado, inclusive pela Presidência do Ipea.

"A NT nº 28, em particular, foi apresentada e debatida em reunião da Diretoria Colegiada, a convite da Presidência do Ipea. Assim, todos os membros da Diretoria colegiada, bem como o Presidente da Instituição, tiveram a oportunidade de conhecer e avaliar previamente os resultados do referido estudo, antes de liberá-lo para divulgação", diz a associação, para quem o texto publicado por Lozardo "desqualifica" o trabalho dos autores do estudo.

"A Afipea considera que a nota técnica assinada pela Presidência do Ipea impõe constrangimentos à atuação dos pesquisadores da instituição no alcance de um dos seus principais objetivos finalísticos: 'Contribuir para a qualificação do debate público quanto aos rumos do desenvolvimento do país e da ação do Estado'. Tal tarefa exige comprometimento institucional com a produção de conhecimento independente, sem alinhamento pré-determinado a posições oficiais. O ambiente de pesquisa só é rico se plural, não devendo ser interditado por “posições institucionais” favoráveis ou contrárias aos temas em debate", diz a entidade.

Segundo a Anfipea, "divergências teóricas, metodológicas e de paradigmas são próprias da produção do conhecimento" e "é essencial que um órgão público de Estado, como o Ipea, garanta a divulgação isenta de trabalhos realizados pelos pesquisadores que atuam na Casa".

"Assim, a Afipea vem manifestar solidariedade e apoio ao grupo técnico envolvido nos estudos sobre a PEC 241 e repudiar o procedimento adotado pela Presidência do Ipea, comprometendo-se a permanecer vigilante em relação a quaisquer atitudes que impliquem constrangimento aos pesquisadores e desqualificação de seus trabalhos", encerra a nota.