Paulo Pimenta: O golpe é aliado da cultura do estupro 

Pesquisa divulgada ontem revela que um terço dos brasileiros e brasileiras culpa a vítima pelo estupro. 30% das pessoas pesquisadas concordam com a frase “A mulher que usa roupas provocativas não pode reclamar se for estuprada”, e 42% dos homens concordam que “Mulheres que se dão ao respeito não são estupradas”.

Por Paulo Pimenta* 

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Os dados da pesquisa são um reflexo da cultura do estupro ainda muito arraigada na sociedade brasileira. Pode-se falar na existência dessa cultura na medida em que há algumas percepções na sociedade que levam muitas pessoas a acreditar que o estupro é uma resposta natural do homem a alguma atitude feminina.

Recentemente, o governador de Pernambuco, Paulo Câmara (PSB), defendeu recomendações feitas pela Polícia Militar de seu estado supostamente para prevenir casos de estupro. Todas elas eram dirigidas às mulheres: evitar o excesso no consumo de bebidas alcoólicas, andar na companhia de pessoas de confiança, evitar exposição nas redes sociais.

Usar roupa curta, ingerir bebidas alcoólicas e sair sozinha à noite são comportamentos da vítima frequentemente apontados pela sociedade como provocadores do estupro. Entretanto, acreditar que quando as mulheres fazem isso elas estão causando o abuso é como dizer que qualquer comportamento da mulher tem por motivo a relação sexual com um homem. É assumir a noção de que elas são meros objetos sexuais, e não sujeitos plenos.

Percepções como essas ignoram até mesmo as estatísticas. 70% dos casos de estupro no Brasil são cometidos por parentes, namorados ou amigos/conhecidos da vítima, de acordo com o IPEA, e não por um desconhecido que a vítima conheceu enquanto bebia, ou que a violentou por encontra-la sozinha na rua. Essa pesquisa aponta, ainda, que também 70% das vítimas de estupro são crianças e adolescentes.

Reduzir os altos índices de estupro no Brasil – em que se estima que apenas 10% dos casos sejam registrados e, ainda assim, registra-se um caso a cada 11 minutos – passa, portanto, por medidas que foquem nos agressores. O país precisa de políticas públicas sérias de combate à desigualdade de gênero como um todo, e de combate à violência sexual, para desmantelar a raiz do problema, que está em nossa cultura sexista.

Desenvolver ações de combate à discriminação de gênero e às diversas formas de violência que ela envolve, entretanto, é incompatível com um governo em que a mulher só tem espaço como primeira dama, e cujos cargos de alto escalão reproduzem exatamente esses valores. Um ministério todo composto por homens brancos e heterossexuais é inconciliável com a postura de incessante luta contra o machismo que o Estado brasileiro precisa adotar.

Uma das primeiras medidas do Ministro da Educação golpista, Mendonça Filho, por exemplo, foi receber em seu gabinete Alexandre Frota, que já fez apologia ao estupro publicamente. Na contramão de todas as políticas de promoção de igualdade de gênero e de combate à valores sexistas na educação desenvolvidas pelo MEC nos últimos anos, esse governo ilegítimo já chegou demarcando espaço ao lado do machismo e dos retrocessos.

O golpe é um aliado do crescimento dessas estatísticas, da cultura do estupro, da reafirmação de valores que colocam a mulher em posições subalternas e de objetificação. Lutar pela garantia dos direitos das mulheres, pelo respeito aos direitos humanos e pelo combate à discriminação e violência de gênero é resistir a Temer e a tudo o que ele representa.