Ministros do STF criticam denúncia da Lava Jato contra Lula

Ao apresentar denúncia contra o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva sem provas e "espetaculosas" como em um reality show, os procuradores da Lava Jato conseguiram uma quase unanimidade: praticamente todos os setores criticaram a falta de argumentos da peça. Um dos magistrados comentou que os procuradores, sentindo-se apoiados por parte da imprensa, "estão decolando", perdendo a base, a referência.
 

Dallagnol contra Lula - Foto: Rodolfo Buhrer/Fotoarena/Estadão Conteúdo

A colunista Mônica Bergamo, da Folha de S.Paulo publicou a informação nesta segunda-feira (19) em que afirma que ministros do Supremo Tribunal Federal (STF) fizeram muitas ressalvas à apresentação da denúncia pelo procurador Deltan Dallagnol e consideraram o comportamento dos investigadores "espetaculoso".

Limites

O ex-presidente do Supremo Tribunal Federal (STF), Ayres Britto, foi questionado por jornalistas o que achava sobre a denúncia do MPF não trazer provas concretas contra Lula e da forma espetaculosa que foi a coletiva de imprensa. O ex-ministro disse não querer entrar no fato "se tem provas ou não", mas disse que cada instituição deve-se limitar ao seu papel, tanto a políticia quanto o judiciário. 

"Acho que cada qual no seu quadrado normativo. A polícia abre inquérito, investiga, acolhe provas, faz diligências, pericia as coisas e conclui com relatório. E encaminha para Ministério Público e tira o time de campo. O Ministério Público entra em campo para apreciar os fundamentos do relatório policial e, se se convencer de que há material suficiente no plano factual e humano para o oferecimento de denúncia, faz a sua denúncia formalmente. E tira o time de campo. Aí entra em cena o Poder Judiciário. Se entender que a denúncia do Ministério Público é suficientemente robusta, aceita. Senão, rejeita", disse em entrevista.

O ex- ministro disse ainda que a divulgação do conteúdo das peças jurídicas em questão deveria ficar a cargo da imprensa. "A imprensa é que vai divulgar as coisas, porque tudo é público. Cada qual no seu quadrado normativo, a divulgação do conteúdo dessas peças jurídicas fica sob a responsabilidade da imprensa", disse o ex-presidente do STF.

Denúncia pirotécnica

Em recente artigo, o jurista Dalmo Dallari classificou a denúncia como uma "exibição circense muito espalhafatosa": "Por qual motivo, apresentando publicamente e com linguagem pirotécnica uma espetaculosa denúncia, ele (Deltan Dallagnol) não apontou fatos que a justificassem e não fez o enquadramento jurídico da denúncia? A conclusão final destas considerações é que a Procuradoria Geral da União deve ser alertada e deve agir com rigor para impedir que outros Procuradores, pela ambição de ganhar evidência ou por qualquer outra razão também inaceitável, envolva desse modo o nome da instituição, que tem a mais alta responsabilidade social e que deve ter desempenho inatacável, para gozar da confiança e da admiração do povo brasileiro", afirmou.

Baseada em delação inválida

A situação se agravou com a notícia de que a denúncia da força-tarefa da Lava Jato contra o ex-presidente Lula, apresentada na última quarta-feira (14), contém uma informação que só aparece no esboço da delação premiada do empresário Léo Pinheiro, que foi recusada pela Procuradoria-Geral da República. Pinheiro, sócio da OAS, disse que a empreiteira descontava os repasses que fez para o apartamento tríplex do Guarujá de uma espécie de conta-corrente que a empresa mantinha com o PT, usada para pagar propina de obras da Petrobras.

No documento que fez para negociar o acordo de delação premiada, Pinheiro, sócio da OAS que já foi condenado a 16 anos de prisão, dizia: "Ficou acertado com [João] Vaccari que esse apartamento seria abatido dos créditos que o PT tinha a receber por conta de propinas em obras da OAS na Petrobras".

Obsessão por Lula

A senadora Vanessa Grazziotin (PCdoB-AM) também comentou sobre a denúncia espetaculosa do MP contra o ex-presidente Lula. "A vítima da vez foi o ex-presidente Lula, por quem, tudo indica, os ditos procuradores nutrem especial obsessão, a ponto de arriscarem as próprias carreiras ao fazerem uma gravíssima acusação sem qualquer prova material", afirmou.

"Tudo o que restou foi um Power Point confuso, recheado de ilações e suposições. De tão inconsistente e leviana, nem mesmo os adversários do ex-presidente ousaram defender a atitude dos procuradores".

Desastre pelos aliados

Até o ultraconservador jornalista da revista Veja, Reinaldo Azevedo criticou a falta de credibilidade da denúncia do coordenador da força-tarefa da Lava Jato. Segundo Azevedo, a denúncia constrange os meios jurídicos. “A avaliação quase unânime é a de que Dallagnol se perdeu, encantado com a própria retórica. O que se avalia é que o MPF terá de se dedicar ao esforço defensivo de demonstrar que nada tem contra Lula”, escreveu. O jornalista publicou ainda que apesar de tentar demonstrar que Lula chefiava uma organização criminosa, o procurador não apresentou provas, o que seria um “erro primário, fruto do açodamento e do estrelismo”.