Alice Portugal: ACM Neto foge ao debate e é ingrato com Dilma

Com a estratégia de campanha de debater a aliança do prefeito ACM Neto com os grupos políticos que tocaram o impeachment da presidente Dilma Rousseff, a candidata a prefeita Alice Portugal (PCdoB) também faz questão de enfatizar que se for eleita vai priorizar o “social”, coisa que entende que o atual gestor não faz. 

Qual seria a diferença de uma eventual gestão da senhora para a do atual prefeito ACM Neto?

Primeiro governar é fazer escolhas. A prioridade de uma cidade como Salvador, não tenho dúvidas: não pode ser a prioridade de apenas reformar cartões postais. É uma cidade com graves problemas sociais, repartida, que tem a desigualdade social mais visível do País, entre as capitais. Temos um grande cinturão de pobreza e isso nos inspira a fazer a escolha pelos que mais precisam, para que a cidade se integre. Óbvio que com a vocação turística que temos não vamos deixar a cidade ficar como, infelizmente, já ficou. É necessário que possamos manter, estimular a indústria do turismo e embelezar a cidade. Mas a escolha orçamentária e de efetiva prioridade dos recursos, é para o social.

Se falou muito na campanha sobre as obras do Rio Vermelho. A senhora pretende fazer uma auditoria, se for eleita, para verificar se houve coisa errada?

Vamos auditar as licitações. É fundamental na Estação da Lapa, no Rio Vermelho e em outras áreas da cidade. Assim como é fundamental se rever a forma de cálculo do IPTU. Se auditar as taxas adquiridas através das multas de trânsito, que foram R$ 165 milhões em três anos. Nossa expectativa é trabalhar com auditorias em várias áreas da administração. Se na prefeitura tivesse R$ 70 milhões para aplicação em obras, faria uma revisita à orla, especialmente no Rio Vermelho. Faria lá uma restauração. E possivelmente isso poderia ser feito com um valor muito menor do utilizado. Posso lhe dizer que com R$ 60 milhões eu faria vinte creches na periferia da cidade.

A reforma no Rio Vermelho seria diferente?

Sim. Uma restauração mantendo o bucolismo e a tradição cultural do bairro. A escolha foi por uma reforma árida no Rio Vermelho. Na Barra (o que se fez) foi uma passarela para trio elétrico sem nenhum atrativo naquele espaço fechado. E o lado de dentro da Barra, falido.

Mas desconfia de superfaturamento, ou considera uso errado?

Por enquanto posso falar de escolha mal-feita. Quem fala em superfaturamento é a vice-prefeita em exercício. E é isso que de fato, é necessário que os órgãos de controle vejam o que foi dito e se manifestem.

Como a senhora está encarando essa campanha com a censura nos programas eleitorais?

Estamos vivendo novamente tempos sombrios no Brasil e em Salvador. Lamentavelmente, vivemos sob a égide de um golpe. E essa é uma adjetivação que eu dou de maneira precisa porque é o que penso. Tribunais e autoridades do Direito do mundo inteiro já afirmaram que a presidente Dilma não cometeu crime de responsabilidade. Obviamente o objeto político, o aproveitamento e a ampliação da crise mundial com as lentes da política levaram a um impeachment fraudulento, por isso é golpe. Ao adjetivar o momento político não estou cometendo injúria e difamação contra ninguém. Falo a minha opinião. E eu que tenho lutado contra a mordaça do Ministério Público, da magistratura, me sinto nesse momento amordaçada. Mas não vão calar a minha voz. É golpe e quem apoia golpe é golpista. Rogo ao TRE que julgue a principal para que essa liminar pare de viger porque tenho direito à opinião.

Sente-se desconfortável com o apoio do PT, que tem vários de seus membros investigados pela Lava Jato? Se a senhora chama Neto de golpista por apoiar Temer, ele pode dizer que, no seu caso, a ligação é com o partido cujos membros estão envolvidos em corrupção.

O Poder Judiciário, o Ministério Público, a Polícia Federal estão executando seus trabalhos. Pessoas que tenham comprovadamente delitos têm que responder diante da Lei. E quanto a isso estamos observando o caminhar dos fatos para verificação de culpa ou não, de todas as pessoas envolvidas de partidos, sem partidos, agentes financeiros, gestores. Isso tudo está explícito para o Brasil. Isso é uma coisa. Outra coisa é política com letras maiúsculas, que eu realizo há 37 anos de militância. Por isso o apoio que o PT, o PSB, o PSD, o PTN nos dão é de grande importância. Na minha compreensão, eu sou do PCdoB, o partido mais antigo em exercício político do Brasil. Temos grande experiência de injustiças históricas cometidas contra membros do meu partido. Sabemos que é preciso ir ao termo da Lei. Mas nunca vimos uma atrocidade tão grande a um partido como estamos vendo em relação ao PT. Os governos de Lula e Dilma foram os que mais deram direitos à sociedade brasileira. Não estão sendo punidos por seus erros, mas sim pelos seus acertos.

Qual a opinião da senhora em relação ao juiz Sérgio Moro? Ele é apontado pelo PT como grande mentor dessa perseguição toda.

É um juiz de primeiro grau que está se beneficiando de uma técnica investigativa que é a delação premiada. É muito importante que vejamos, com olhos de ver, como diria Ruy Barbosa, que a técnica da delação premiada tem que ter um processo de grande imersão, porque o réu confesso está devolvendo milhões de dólares de roubo aos cofres públicos, muitas vezes pode também aumentar histórias imiscuindo-se na política para diminuir sua pena. Então, é preciso que os tribunais superiores façam esta separação do joio e do trigo para que verifiquem se os réus confessos não estão buscando tirar dos seus ombros o peso das penas e jogar para outrem. Não sou julgadora do juiz, mas espero que o juiz seja justo e até então ele tem sido um juiz político, e isso precisa ser observado.

Pode esclarecer o que prometeu em relação à tarifa zero para estudantes, desempregados e beneficiários do Bolsa Família?

Falei na convenção, pois é o meu desejo. No entanto, tenho que ter responsabilidade de criar um grupo de trabalho, e é isso que está no meu programa, onde participem empresários do sistema de transporte, usuários, sindicato da categoria e a sociedade civil. Com esse grupo de trabalho diante da planilha do município e da planilha de lucros dos empresários de ônibus, vamos verificar, mesmo que seja em forma gradual, um mecanismo de aplicar a tarifa social para estudantes, desempregados, algo que possamos fazer em benefício dos que mais precisam.

Como a senhora analisa a aprovação da gestão do prefeito ACM Neto?

Reconheço que a cidade ganhou uma maquiagem que pode ter impactado num primeiro momento. Quando você vai nos serviços, até o governo anterior era melhor que o atual em relação ao social, ao tratamento ao servidor público, à ausência do assédio moral nas repartições públicas municipais e à própria situação de saúde e educação no município. Por isso ele está fugindo dos debates. Eu o desafio, pelo maior jornal da cidade, a vir para o debate comigo nas emissoras de TV, olho no olho, sob as circunstâncias sociais da cidade. Quanto a pesquisas, tivemos uma série histórica de erros (nas pesquisas) com o governador Jaques Wagner e especialmente o governador Rui Costa, que entrou na campanha com 3%. Entrei com 8%. O próprio instituto encomendado pela televisão de propriedade do prefeito já me dá 10% na última fotografia, e eu tenho certeza que nossa curva é ascendente. A campanha é curta. É o tostão contra o milhão, o Davi contra o Golias.

A senhora acha, então, que o prefeito não levaria as filhas dele para o serviço de saúde e as escolas do município?

A questão particular é uma escolha. A verdade é que, nesse momento sabemos que do ponto de vista da saúde, uma mãe com uma criança febril numa madrugada chuvosa de Salvador não tem o que fazer se não tem um plano de saúde, a não ser resfriar a criança até amanhecer o dia e ir para um hospital estadual. Porque é uma calamidade. Não há médico nos postos. O que funciona, ele é muito ingrato: deveria agradecer à presidente Dilma. Quando ele apoiou o golpe foi ingrato porque a presidente Dilma garantiu o Mais Médicos em Salvador e isso melhorou muito a cobertura da saúde da família. Ele diz que dobrou, mas foi o Mais Médicos do governo federal, tão criticado porque trouxe médicos do exterior, todos com salários pagos pelo governo federal. Ele é fujão pro debate e é ingrato com a presidente Dilma, que colocou à disposição uma quantidade grande de creches para Salvador e ele disse que não tinha terreno para fazer as creches. Eu até, num encontro casual, perguntei por que ele não verticalizava o projeto. Não houve interesse. A escolha dele é por uma política de elite, voltada para o grande mercado da construção civil e isso lamentavelmente faz com que a cidade tenha aprovado hoje um PDDU…

A senhora pretende rever o PDDU?

Sim, já estudei isso, é possível rever sim, isso porque não houve audiências dentro do padrão exigido pela própria lei. Um projeto que sobe o gabarito dos prédios da orla marítima, leva o sombreamento a vários pontos da orla, diminui em cinco mil hectares a área de preservação ambiental de Salvador, aquece o miolo da cidade. Salvador tem dificuldade com as encostas que dissolvem nas chuvas e em relação à ventilação. Precisamos da ventilação marítima. É um Plano Diretor que arrebenta com a cara da cidade.

Enfim, por que o eleitor deveria votar na senhora?

Sou uma militante política e social há 37 anos de apenas um partido, que nunca mudou de lado. Tenho opiniões sólidas de que as pessoas devem valer pelo que são e não pelo que têm. Entendo política não como mecanismo de corromper ou de ganhar vantagens pessoais e de grupo. Política para mim é instrumento de interferir para melhorar a vida das pessoas. Estabeleci o sim como lema porque Salvador, o nosso povo, tem recebido o não cotidianamente na saúde e na educação.

Biaggio Talento/ Jornal A Tarde
Foto: Edilson Lima/ Ag. A Tarde