Procuradora da República diz que Temer é delatado e repudia o golpe

A vice-procuradora da República, Ela Wiecko, pediu exoneração do cargo, nesta terça-feira (30), depois de ter revelado que o presidente interino, Michel Temer, "está sendo delatado". Em entrevista, a procuradora classificou o processo de impeachment contra a presidenta Dilma Rousseff como "um golpe" e declarou que "tem muita gente dentro da instituição" que pensa como ela.

vice-procuradora da República Ela Wiecko - Reprodução STF

"Eu acho que, do ponto de vista político, é um golpe, é um golpe bem feito, dentro daquelas regras", afirmou. Questionada se era então um golpe com a participação do Supremo Tribunal Federal e da Procuradoria Geral da República, da qual ela faz parte, ela respondeu: "Aí tem que ser uma conversa muito mais comprida".

A entrevista foi motivada porque a procuradora apareceu em um vídeo participando de um protesto contra o impeachment em Portugal, quando estava de férias. Em entrevista à revista Veja, Wiecko disse que participou como cidadã, não como procuradora.

"Tem muita gente que pensa como eu dentro da instituição", disse ainda ela. "Eu estou incomodada com essas coisas que estão acontecendo no Brasil. Acho que não foi da melhor forma possível", salientou.

Sobre Temer ela foi enfática ao afirmar que não reconhece o seu governo. "Pelas coisas que a gente sabe do Temer, não me agrada ter o Temer como presidente. Não me agrada mesmo. Ele não está sendo delatado? Eu sei que está. Eu não sei todas as coisas a respeito das delações, mas eu sei que tem delação contra ele. Então, não quero. Mas as coisas estão indo", frisou.

Diferentemente do que faz com outros magistrados que apoio o golpe contra o mandato da presidenta eleita, a Veja tentou constranger a procuradora por se posicionar contra o impeachment. "Eu não posso falar nada? Não posso ter nenhuma liberdade de manifestação? (Isso) é um pouco exagerado, né?", respondeu.

Em nota, o presidente da Comissão de Direitos Humanos e Minorias da Câmara, deputado Padre João, emitiu uma nota em solidariedade à Wiecko.

“Colaboradora de anos e anos desta Comissão de Direitos Humanos e Minorias da Câmara dos Deputados, Ela Wiecko é uma referência em lutas essenciais à nossa democracia: contra o trabalho escravo, pelos direitos dos povos indígenas e quilombolas, pela igualdade racial e de gêneros, pela ética na política. Uma pessoa cuja sensibilidade social e compromisso com a Justiça são indissociáveis de sua atividade profissional e posicionamento cidadão”, diz o texto da nota. E completa: “Respeitamos sua decisão de renunciar ao cargo de Vice-Procuradora Geral da República, registrando no entanto a lacuna que se abre na instituição neste momento delicado da vida nacional, com tantos riscos à democracia e aos direitos humanos. Sabemos que poderemos continuar contando, como sempre contamos, com sua atuação funcional destemida e consequente na defesa dos direitos fundamentais do povo brasileiro”.