Para Moro, crime de vazamento é apenas “reprovável”

Em palestra proferida em Curitiba para alunos do curso de direito da universidade Unibrasil, nesta quarta-feira (24), o juiz federal Sérgio Moro, responsável pela Lava Jato na primeira instância e detentor no maior número de casos de vazamentos envolvendo processos ou investigações que estão sob segredo de justiça, disse que o crime é reprovável.

Por Dayane Santos

Sérgio Moro - Reprodução/Youtube

"Vazamento ocorre quando existe um processo mantido sob sigilo e uma informação acaba sendo tornada pública de maneira indevida, sem que tenha sido levantado o sigilo do processo. Isso é algo reprovável", explicou o magistrado.

O que Moro chama de “reprovável” não é tratado pela lei como uma questão moral, mas tipificado como crime. O artigo 325 do Código Penal estabelece que a violação de sigilo funcional, praticado contra a Administração Pública ao "revelar fato de que tem ciência em razão do cargo e que deva permanecer em segredo, ou facilitar-lhe a revelação", é crime.

Em artigo acadêmico, Moro defendeu o uso da opinião pública, ou seja, da imprensa, como instrumento para satisfazer a punição judicial. A declaração foi por conta da reação dos magistrados do Supremo Tribunal Federal (STF) por conta do vazamento da delação do empreiteiro da OAS que resultou na capa da revista Veja desta semana, em que cita uma relação próxima, mas sem qualquer indício de irregularidade, do delator com o ministro do Supremo, Dias Toffoli.

Moro disse que é complicado apurar vazamentos sem que seja quebrado o sigilo de jornalistas. "Isso é algo difícil de apurar a autoria, salvo se nós partirmos para a quebra de sigilo de jornalistas, o que é algo também constitucionalmente muito complicado e, também, nada desejável", afirmou.

Em março, Moro admitiu que não deveria ter autorizado a divulgação de escutas telefônicas entre o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva e a presidenta Dilma Rousseff, mas chamou o atropelo à Constituição de “equívoco”.

Tentando minimizar o crime, o juiz federal de Curitiba disse que não teve intenção de provocar polêmicas, conflitos ou constrangimentos e pediu “respeitosas escusas” ao STF.

A farra de vazamentos de delações tem sido uma dos principais instrumentos de ilações por parte do consórcio golpista. Um exemplo emblemático do uso político dessas delações foi a capa da revista Veja na véspera do primeiro turno das eleições de 2014, com o título: “Lula e Dilma sabiam de tudo”. A publicação evidenciou a manipulação de trechos de um depoimento, ainda em segredo de Justiça, que não tinha qualquer relação com os fatos. Apenas uma tentativa de mudar os votos que reelegeram a presidenta Dilma.

Em fevereiro deste ano, o Conselho Nacional de Justiça aprovou a Resolução 217, que adota várias medidas para tentar impedir o vazamento seletivo de informações sigilosas constantes nos autos de investigações criminais. Uma das medidas altera regras do próprio Conselho relativas à quebra de sigilo e interceptação telefônica e de endereços eletrônicos, passando a estabelecer a obrigatoriedade da requisição por parte do juiz para instauração de investigação a respeito da quebra do sigilo, sob pena de responsabilização do magistrado.

“Lamentavelmente foi preciso uma resolução do Conselho Nacional de Justiça para tentar coibir uma prática criminosa que se propaga em nosso país, em que atores estatais proativos estão, muitas vezes, a serviço de determinada parte da imprensa para atacar a reputação alheia e não para trabalhar e fazer jus ao salário que recebem do Estado”, disse Rômulo de Andrade Moreira, procurador de Justiça do Ministério Público no estado da Bahia e professor de Direito Processual Penal da Universidade Salvador.