Olimpíada permite que mundo conheça a força deste país, diz Orlando

A abertura oficial dos Jogos Olímpicos do Rio de Janeiro acontece nesta sexta-feira (5). A festa será no estádio do Maracanã, a partir das 20 horas, e já mexe com o cotidiano da cidade e do país. Considerado o maior evento esportivo do planeta, juntamente com a Copa do Mundo, a Olimpíada do Rio será a primeira realizada no Brasil e na América do Sul. A competição contará com a participação de 10.500 atletas de 206 países.

Por Dayane Santos

Orlando Silva - Foto: Clécio Almeida

“Chegou nossa hora”, disse o então presidente Lula, em outubro de 2009, durante discurso na sessão de apresentação da candidatura Rio 2016 ao Comitê Olímpico Internacional (COI), pouco antes da votação que escolheu o Brasil como país sede dos jogos derrotando a campanha de Madri, Dinamarca, Chicago e Tóquio.

Ninguém duvida que o ex-presidente Lula foi o personagem central e o principal cabo eleitoral do Brasil na campanha dos Jogos Olímpicos e da Copa do Mundo. Mas outros nomes atuaram na retaguarda dessa conquista. Um deles foi o Orlando Silva, atual deputado pelo PCdoB de São Paulo, mas que durante o governo Lula exerceu os cargos de secretário Nacional de Esporte, secretário Nacional de Esporte Educacional e secretário-executivo do Ministério do Esporte e, em 2006, foi empossado como Ministro do Esporte.

O Portal Vermelho conversou com Orlando nesta quinta-feira (4), no escritório do deputado em São Paulo. Nas paredes, vários quadros com fotos e reportagens que contam um pouco da trajetória do parlamentar, marcada principalmente pela militância no movimento estudantil onde chegou a ser o primeiro presidente negro da União Nacional dos Estudantes (1995).

Ao entrar na sala, Orlando tem em mãos alguns envelopes e pede o auxílio de uma de suas assessoras para indicar um profissional que faça o restauro de uma importante recordação de infância.

“Lá em casa, em Salvador, todo ano tinha enchente. E todo ano a enchente levava as poucas fotografias embora. Eu só tinha uma foto de quando era criança, mas me mandaram essas duas antigas que encontram. É do meu batismo. Essa aqui não dá para ver que sou eu, mas a outra dá. Estou ao lado de meu pai, que já morreu. Será que a gente consegue restaurar?”, disse. A conversa continua de maneira informal e ele me pergunta se teria alguém para indicar par ao restauro da fotografia que foi tirada em preto e branco. O papel fotográfico estava bem danificado, dando ainda mais veracidade ao seu relato.

Orlando nasceu em Salvador, em 1971. Como ele mesmo contou, sua família era muito humilde e morava na periferia da cidade. Com apoio principalmente da mãe, conseguiu superar as dificuldades e dedicado aos estudos venceu o preconceito e a pobreza. Cursou Direito na Universidade Católica de Salvador e aos 20 anos passou a morar em São Paulo.

Na entrevista, Orlando resgatou como foram os dias que antecederam a votação do COI e o clima pouco antes do anúncio que confirmou o Brasil como país sede dos jogos. Ele também destacou a importância do evento para o país, mesmo diante da grave crise política que enfrentamos.

“Os eventos vão permitir que o mundo conheça a violação grave à democracia que o nosso país vive nesse momento. Acontecerão muitas manifestações e protestos e vejo isso como algo positivo para que o mundo conheça a realidade dura que do Brasil hoje”, salientou.

Quando ministro, Orlando Silva realizou os Jogos Pan-Americanos e os Jogos Parapan-Americanos de 2007, que foi marcado pelo recorde de medalhas de ouro. “No dia seguinte ao fim dos jogos, a manchete de um dos jornais era: ‘Os jogos Pan-Americanos tinham tudo para dar errado, mas deu certo’. É a falta de crença na capacidade de fazer do Brasil, de realizar”, lembrou.

Quando ministro, ajudou a colocar o Brasil no centro da agenda esportiva internacional ao trazer a Copa do Mundo de 2014 e as Olimpíadas. Entregou 6.000 obras de infraestrutura esportiva em todo o país, de quadras em escolas até grandes complexos esportivos. Foi um dos responsáveis pelo desenvolvimento da Bolsa Atleta, maior programa de apoio direto a atletas de alto rendimento do mundo, além de programas sociais como Segundo Tempo e Esporte e Lazer das Cidades, oferecendo atividade física orientada para um número de jovens e crianças.

Confira a íntegra da entrevista.

Portal Vermelho – Orlando, foi na sua gestão como ministro que o Brasil fez a campanha e venceu para sediar os Jogos Olímpicos e a Copa do Mundo. Como se sente com a concretização desses dois eventos?

Orlando Silva – Eu vejo com muita felicidade. Fico muito feliz porque a Copa do Mundo aconteceu e foi um grande sucesso, apesar de toda a campanha que foi feita contra. Aliás, recentemente a Folha de S. Paulo publicou editorial dizendo que esperava que as Olimpíadas reproduzissem o que foi o sucesso da Copa do Mundo. Eles falam isso hoje, mas na época só criticavam e tentavam desconstruir a importância desse evento para o Brasil.

A conquista da Copa do Mundo e das Olimpíadas servia a uma estratégia de projeção do Brasil no mundo. O Lula acreditava que o nosso país precisava aparecer para o mundo com a força que possui. Com a força que tem na economia, pois nós já éramos uma das 10 economias mais importantes do mundo. Com a força que tem pela população e pelo papel estratégico que tem no hemisfério Sul.

"A abertura dos Jogos Olímpicos do Rio vai permitir que no mundo inteiro, bilhões de pessoas conheçam um pouco da cultura e da história do Brasil. Há países que tentam se projetar no mundo pelo belicismo, como os EUA. O Brasil, pelas características históricas, políticas e culturais que possui, encontrou outras formas de se projetar" 

O Lula concebeu Olimpíada e Copa do Mundo como parte desse processo de projeção do Brasil porque são os dois maiores eventos – não só esportivos, mas de visibilidade -, que o mundo tem. A abertura dos Jogos Olímpicos do Rio vai permitir que no mundo inteiro, bilhões de pessoas conheçam um pouco da cultura, da história e da força do Brasil. Há países que tentam se projetar no mundo pelo belicismo, como os EUA. O Brasil, pelas características históricas, políticas e culturais que possui, encontrou outras formas de se projetar.

Vermelho – Qual é a importância dessa projeção para o país?

Orlando – Isso tem, em primeiro lugar, uma dimensão econômica. Porque quando se projeta o país no mundo se induz o turismo, que é um setor que emprega extensivamente e o país tem um potencial. Pode-se projetar marcas e produtos também. Na Ásia, por exemplo, tanto no Japão quanto na Coreia, os jogos Olímpicos foram utilizados para promoção de marcas e produtos daqueles países. Na Espanha e na Austrália, Barcelona e Sidney foram projetadas pelo setor turístico para o mundo inteiro. Segundo, tem uma dimensão de afirmação do pais no mundo. Quando a China fez os jogos de 2008 era para mostrar ao mundo o seu poderio, reforçando que estava pronta para ser uma potência internacional. A Alemanha, quando fez a Copa do Mundo, tentou quebrar aquela imagem do país vinculada à Segunda Guerra Mundial. E mais, quebrar aquela imagem do alemão sisudo e fechando. Quem foi na Copa da Alemanha se surpreendeu. Por isso, tem uma dimensão econômica, cultural e política.

Vermelho – Qual era o clima da delegação do Brasil antes da abertura dos envelopes, em 2009?

Orlando – Era de tensão total, mas também de muita confiança porque na estratégia que montamos trabalhávamos sempre pedindo o voto e também pendido o segundo voto. Nós desejávamos ser o segundo voto de todos que estavam disputando. Na primeira votação, o Brasil passou em primeiro, salvo engano. Caiu a cidade de Chicago, com Barack Obama, que estava presente, e tudo. Praticamente todos os votos de Chicago vieram para o Brasil na votação seguinte. Na terceira votação, caiu Tóquio e praticamente todos os votos vieram para o Brasil. Se observar os votos de Madri do primeiro para o último turno foi praticamente o mesmo número. Fomos bem-sucedidos porque nós conseguimos ser a segunda opção de todos. E nós usávamos como discurso para construir essa segundo opção o fato de que nós somos a pátria mais multirracial do mundo. Nós poderíamos dizer que éramos a segunda pátria do Japão pela colônia japonesa que temos no país. Dos italianos, africanos, árabes, todos poderiam se ver no Brasil. Podemos dizer que os 200 países que participam dos jogos, com certeza todos terão torcedores porque o Brasil tem gente de cada canto do mundo.

Vermelho – Qual era a motivação de vocês que gerava tanta confiança?

Orlando – A ideia que o Lula sustentou desde os primeiros dias de governo foi a de não desistir nunca. É uma coisa do brasileiro que o Lula encarnou muito bem, por isso a sua forte identidade com o povo. Naquele momento, o Lula valorizava muito a autoestima. Me recordo de um episódio que ele contou numa das reuniões preparatórias para tentar inspirar a equipe em que relatava que foi encontrar George Bush, então presidente norte-americano, num evento. Entrava vários presidentes que iam cumprimentando os demais e conversando como se nada tivesse acontecido. Quando Bush entrou no salão, todos os presidentes ficaram de pé aguardando para ser cumprimentado por Bush. O Lula sentado estava, sentado ficou. O Bush cumprimentou a todos e quando chegou para cumprimentar o Lula ele se sentou para conversar. Simbolicamente ele contava essa história para dizer que nós somos iguais aos outros e não temos que nos subordinar a ninguém. Então, essa ideia de que nós temos a mesma capacidade dos outros e temos que lutar até o fim e não desistir nunca foi decisivo para inspirar a nossa campanha e estimulou a confiança de outros países na capacidade do Brasil.

Vermelho – Conte um pouco de como foi a campanha do brasil junto ao Comitê Olímpico e a sensação que tiveiram ao ser confirmado que o país seria sede dos jogos?

Orlando – Foi muito bonito. Foram pelo menos dois anos de campanha. Uma campanha que era muito desigual porque nós enfrentamos os Estados Unidos, a Espanha e o Japão, países ricos. Existia uma desconfiança muito forte com o Brasil, que foi agravada pela grave crise econômica e pelo fato do país ser sede de outro grande evento dois anos antes, a Copa do Mudo. A desconfiança era muito grande. Foi ali que brilhou a estrela do presidente Lula que fez um trabalho de corpo a corpo.

Me recordo que em Pequim, durante os jogos, o Lula recebeu inúmeros membros do Comitê Olímpico Internacional. Durante a cerimônia de escolha do país, o Lula chegou três dias antes e conversou com pelo menos 40 dos quase 100 eleitores. Foi uma peça chave para que o país tivesse essa conquista. Quando percebemos que depois de tanto sacrifício e esforço, o Brasil sairia vitorioso, fomos tomados pela felicidade.

Vermelho – Pela sua trajetória de vida e sua origem simples, essa conquista teve um significado especial?

Orlando – Foi também uma vitória pessoal e do nosso partido, pois a estrutura básica do Ministério do Esporte era de companheiros do PCdoB. Tivemos um papel de liderança naquele processo, mas principalmente foi uma vitória do país porque o Brasil celebrou. Como o Lula falou na época, foi uma espécie de cidadania internacional que o Brasil assumiu naquele momento porque revelou uma confiança da comunidade internacional em nosso país.

Vermelho – Quais foram as vantagens trazidas pela realização desses eventos?

Orlando – Para o Brasil, a Copa do Mundo e a Olimpíada fez com que antecipássemos investimento que, mais cedo ou mais tarde, teriam que ser feitos nas cidades que receberam os eventos. No Rio de Janeiro houve uma revitalização forte do centro. Mexeu muito na estrutura de transporte urbano da cidade e do ponto de vista esportivo, nós preparamos muitos treinadores e atletas. Temos novas instalações e mais equipamentos. Portanto, seja na dimensão econômica, política, cultural ou esportiva, são grandes oportunidades. O Lula entendeu isso claramente e batalhou pessoalmente para conquistar esses eventos.

"O Lula foi chave para conquistar e, no caso das Olimpíadas, a Dilma foi chave para preparar o país. Infelizmente, numa situação insólita, um presidente interino tenta surfar numa onda que ele não conhece e receberá uma sonora vaia do povo na abertura desse evento"

Vermelho – A atuação do ex-presidente foi crucial…

Orlando – Era um sonho antigo. O Brasil tinha recebido a Copa de 1950 e vários países realizaram mais de uma edição. O Brasil tinha feito apenas uma e tinha aquele trauma [referindo-se à Copa de 1950]. O trauma nós não resolvemos porque a seleção foi mal e nós não tivemos o resultado que esperávamos, mas o sonho de realizar a Copa o Lula foi o inspirador. Por isso, eu não tenho a menor dúvida em dizer que só tivemos Copa do Mundo e só vamos ter jogos Olímpicos e Paraolímpicos graças ao Luiz Inácio Lula da Silva. Pelo esforço dele de projetar o Brasil no mundo e pelo empenho na preparação desses eventos. O Lula foi chave para conquistar e, no caso das Olimpíadas, a Dilma foi chave para preparar o país. Infelizmente, numa situação insólita, um presidente interino tenta surfar numa onda que ele não conhece e receberá uma sonora vaia do povo na abertura desse evento.

Vermelho – Como envolver nação neste evento?

Orlando – Para conquistar a Olimpíada, por exemplo, já havia uma união importante. Me recordo que tanto na Copa como na Olimpíada, governadores e prefeitos se mobilizaram, o mundo esportivo se mobilizou e se uniu em torno da conquista desses eventos. O esforço de preparação – e eu destacaria o papel do ex-ministro Aldo Rabelo que foi chave nas várias etapas de preparação – também é um esforço de mobilização nacional. Vimos o processo de circulação da tocha pelo país. O sentido é de mobilizar e levar um pouco desse evento para cada estado do Brasil. Para tribos indígenas, para terras quilombolas, para o litoral, para o interior, para as cidades grandes, médias e pequenas, enfim, para todos os estados do país. Creio que essa foi uma das inciativas importantes para fazer a nacionalização.

Foi feito também um programa de investimentos em infraestrutura esportiva que alcançou todos os estados. Isso é um legado esportivo que fica depois que passar. É a semente dos Jogos Olímpicos que estará presente em todos os estados. E, particularmente, nessa semente está presente o DNA do PCdoB, que por sua presença no Ministério do Esporte insistiu muito que não bastava ter apenas boas equipes durante os jogos de 2016.

Para nós, tão importante quanto chegar bem e competir bem em 2016 era seguir bem para frente. Não queremos seguir o exemplo da Grécia, que alcançou um bom resultado durante os jogos, mas depois resultou uma grave decadência no esporte. Mesmo a Espanha, que evoluiu no esporte, ficou aquém do resultado alcançado nos jogos de Barcelona. Queremos seguir o exemplo do Japão, da Coreia da Austrália, países que chegaram a elite mundial do esporte durante as Olímpiadas que fizeram, mas permaneceram. Esse é o desafio. Creio que essa noção de um evento nacional, de mobilização do país e de deixar um legado pode ser os fundamentos para que nós possamos continuar sendo um país relevante do ponto de vista esportivo.

Vermelho – Os críticos afirmam que o Brasil não deveria se preocupar em sediar eventos como esse porque tem questões mais urgentes na agenda do país. Como você responde a essas críticas?

Orlando – Eu acho que é um argumento de má fé porque para saúde e educação, que são duas áreas sensíveis do Brasil, existe receita vinculada. Tem um recurso reservado para ser executado. Se ele é mal executado, isso é um outro problema. Não podemos misturar alhos com bugalhos. Não foi tirado um centavo da educação para se fazer as Olimpíadas, Paraolimpíadas e nem mesmo na Copa do Mundo. Portanto, é uma manobra de má fé.

Além disso, se abstrai as oportunidades para o desenvolvimento econômico que esses eventos oferecem. Seguramente o Brasil, que vive um momento difícil na sua economia, inclusive no emprego, estaria em condições ainda mais agravantes se não tivesse os jogos olímpicos, pois o aquecimento que produziu na construção civil, que ativa várias cadeias produtivas, gerou empregos e funcionou quase como uma medida anticíclica na região metropolitana do Rio. Mas não somente no Rio de Janeiro. Um estudo feito pela Fundação Getúlio Vargas mostra o impacto econômico dos jogos na economia de São Paulo, Minas e em outros estados. Portanto, não houve desvio de recursos de áreas essências como a saúde e educação, e mais que isso, gerou empregos e desenvolvimento econômico no curto prazo. E no médio prazo, a projeção do país vai continuar estimulando o turismo, que é uma indústria que emprega extensivamente e que o Brasil tem um grande potencial. Vale lembrar que, por ser tão importante para o desenvolvimento, nações importantes entram na disputa para sediar esses eventos.

Vermelho – Alguns setores da imprensa propagam a teses de que o Brasil não está preparado para receber eventos de tamanha relevância mundial. Antes da Copa do Mundial, diziam que o evento seria um fiasco, que aeroportos iam entrar em colapso, que os estádios não seriam construídos… Como você responde a essas críticas?

Orlando – Infelizmente ainda temos um complexo de vira-las, como dizia Nelson Rodrigues. Tudo que é de fora é bom e aqui nada presta. Eu percebo que, sobretudo na grande mídia, esse complexo é mais acentuado: focam toda luz nas dificuldades e abstraí as coisas positivas. Dou como exemplo o que aconteceu nos Jogos Pan-Americanos do Rio, em 2007. No dia seguinte ao fim dos jogos, a manchete de um dos jornais era: ‘Os jogos Pan-Americanos tinham tudo para dar errado, mas deu certo’. É a falta de crença na capacidade de fazer do Brasil, de realizar. Às vésperas dos jogos olímpicos, o que se fala é que a delegação da Austrália faz muitas críticas à Vila Olímpica. Ninguém fala que todas as instalações esportivas estão prontas. Ninguém fala que todo o sistema de transporte, de segurança, aeroportos e alimentação estão funcionando direito. Se uma delegação ou se alguém do birô da elite do comitê olímpico reclama que o jantar servido a eles não tinha vinhos, mas foi servido água, vira manchete.

Considero que nada é perfeito e os jogos no Brasil não serão perfeitos. Mas não é muito diferente de outros eventos. Estive na copa da Alemanha, da África do Sul, na Olimpíadas da China, fui a Londres inúmeras vezes e conheço a experiência da Espanha. Sei que também tiveram dificuldades, mas o fundamental é que os jogos aconteceram com sucesso. E no Brasil será a mesma coisa. Mas teremos algo que ninguém tem: o povo brasileiro que celebrou durante a Copa do Mundo e vai celebrar durante os Jogos Olímpicos e Paraolímpicos. Tenho muita confiança no sucesso desses eventos.

Vermelho – As dificuldades enfrentadas pelo Brasil são muito diferentes das enfrentada por outros países?

Orlando – Quando falamos em projetar o Brasil para o mundo temos que projetar por inteiro. Nós não podemos ocultar as desigualdades, as diferenças, os problemas econômicos e sociais do Brasil. Não podemos impedir que os visitantes vejam que há uma população de rua, moradias precárias, que temos um sistema de transporte com limitações. No entanto, não ocultar que existem problemas não nos impede de fazer os eventos. Enfrentamos as dificuldades de moradia, de transporte, de desigualdade social, ao mesmo tempo temos que ter inciativas que possam estimular o desenvolvimento e esses eventos são estímulos.

Fazer eventos nas grandes capitais é o que acontece no mundo. Nós fizemos opções. Poderíamos fazer a Copa do Mundo somente em oito cidades. Decidimos fazer em doze porque o Brasil é um continente e queríamos levar o evento para o país inteiro. Agora, nas Olimpíadas, decidimos colocar mais quatro cidades que é uma forma de nacionalizar. Creio que esse é o caminho certo. Quando nós nos expomos para o mundo e nos confrontamos com a nossa realidade, criamos um estímulo para enfrentar as dificuldades. Temos capacidade de resolvê-las para que esses problemas sejam superados.

Vermelho – Qual é a importância de sediar um evento como esse para o cidadão comum, para o povo brasileiro?

Orlando – É uma experiência ímpar para o Brasil. Eu imagino que o que vai passar pela cabeça das centenas de meninos e meninas que vão entrar no estádio do Maracanã na abertura dos Jogos Olímpicos, na sua maioria jovens simples e pobres que terão a grande oportunidade de participar, provocará um grande impacto na alma de cada um. É importante para afirmação da nossa capacidade. Nós podemos dizer que temos a capacidade de fazer tudo. Nós sabemos disso, mas pouca gente no mundo sabe. Na campanha das Olimpíadas nós falávamos que o Brasil era autossuficiente na produção de hidrocarbonetos, ou seja, de petróleo. Dizíamos: no Brasil, extraímos petróleo a 9, 10 quilômetros debaixo da lama e da água, o pré-sal; no Brasil produzimos aviões. As pessoas no mundo não têm noção da força econômica do Brasil. Era a oportunidade de projetar a nossa capacidade e reafirmar a nossa autoestima. Reafirmar a capacidade que o brasileiro tem de construir grandes coisas. E isso vale para mim, para um atleta simples e para o brasileiro torcedor, que terá a satisfação de ver o Brasil realizando com sucesso uma grande iniciativa.

Vermelho – Vivemos uma grave crise política. Mesmo assim o evento vai se realizar. Qual o impacto disso para a projeção do país?

Orlando – Os eventos vão permitir que o mundo conheça a violação grave à democracia que o nosso país enfrenta nesse momento. Acontecerão muitas manifestações e protestos e vejo isso como algo positivo para que o mundo conheça a realidade dura que do Brasil hoje.

Quando fizemos a campanha para o Brasil ganhar as Olimpíadas, nós dizíamos: ‘Podem vir para o Brasil, pois somos uma democracia consolidada. Temos instituições estáveis’. Infelizmente, o discurso que fizemos no passado não corresponde à realidade. Quem chegar no Brasil vai perceber que temos uma democracia frágil e vivemos uma gravíssima instabilidade política. Enfrentamos um golpe parlamentar. Por isso, considero que a realização do evento será uma oportunidade para que possamos fazer e ampliarmos a denúncia da situação no Brasil. Ao mesmo tempo, é importante que o país e a nação realize uma iniciativa que tem um peso e vai fazer parte da história do país. Assim como acredito que não dá para ocultar os problemas econômicos e sociais do Brasil, não podemos ocultar a gravíssima crise política e a grave violação à democracia que está em curso neste momento.