Sibá Machado: O interesse nacional  

Ainda há os que pensam que tudo que é bom para os Estados Unidos é bom para o Brasil. Os adeptos dessa tese agora cultuam a Parceria Comercial Transpacífica (TPP), lançada pelos Estados Unidos em nome dos benefícios "incondicionais" do livre comércio. Trata-se o acordo como se fosse revolucionário e inovador, mas há vários questionamentos, inclusive de setores organizados da sociedade americana.

Por Sibá Machado*

Sibá Machado: O interesse nacional

A TPP casa-se com a Parceria Transatlântica de Comércio e Investimentos (TTIP), entre Estados Unidos e União Europeia. Dois mega-acordos que deixam os Estados Unidos como ator central na economia mundial e englobam cerca de metade do comércio do planeta. É, de fato, o resgate da hegemonia do eixo Estados Unidos, UE e Japão, frente a novos atores como China e os emergentes (inclusive o Brics) que ameaçam a velha ordem.

O objetivo maior é adequar a economia mundial aos interesses das multinacionais da tríade, num momento de incertezas econômicas. Busca-se enfraquecer os emergentes e consolidar os interesses geoestratégicos dos Estados Unidos. A bandeira do livre comércio é pura balela, já que a média das tarifas comerciais aplicadas entre os pretendentes à TPP já é bem baixa.

Trata-se de uma espécie de mega-Alca, o famigerado projeto enterrado há doze anos. Quer se abrir o setor de serviços — o que mais cresce e gera empregos no mundo — nos países emergentes e em alguns desenvolvidos, com privilégios especiais ao setor financeiro.
Preconiza-se a abertura de soberania, com condicionantes que impeçam a aplicação de legislação nacional ou restrições a bancos e outras instituições. Os emergentes ficariam sem instrumentos para enfrentar ataques especulativos contra as moedas, por exemplo. Uma ditadura do capital financeiro. O pacote inclui a abertura de setores estratégicos como educação, saúde, comunicações etc.

Pela TPP, os Estados Unidos reafirmam a intenção de abrir o setor de compras governamentais, de grande importância para estimular o mercado interno. Naturalmente, os emergentes teriam poucas condições de competir com as potências. No caso do Brasil, essa medida inviabilizaria a política de conteúdo nacional da Petrobras, que impulsiona a indústria naval e gera renda e empregos localmente. Em resumo, conferem-se privilégios abusivos a estrangeiros, inclusive com a possibilidade de impor arbitragens internacionais, em detrimento dos Estados nacionais.

Argumenta-se que não podemos ficar de fora das "cadeias produtivas globais" e critica-se nossa opção pelo Mercosul e nossa política externa. Análise errada. Nossa política não é isolacionista, e foi nos últimos 11 anos que nossa participação no comércio mundial passou de 0,88% para 1,46% — 63% de aumento. Nos últimos três anos, diminuiu, devido à crise mundial e à sobrevalorização do câmbio, mas não por causa do Mercosul. Interesse nacional vale. Os Estados Unidos que o digam.