As passageiras “perigosas” do vôo 3437

Por Julieta Palmeira*

Uma delegação de 73 baianas estava entre os 240 passageiros do vôo 3437 da Tam que saiu de Salvador, às 10h57min, no dia 10 de maio, última terça-feira, em direção à Brasília para participar da 4ª Conferência Nacional de Políticas para Mulheres. Representavam parte da delegação da Bahia e foram eleitas na etapa estadual, coordenada pela Secretaria Estadual de Políticas para Mulheres da Bahia. Lá estavam trabalhadoras, estudantes, professoras e moradoras de bairros populares de vários municípios da Bahia, empoderadas para participar do fórum máximo de definição de políticas para esse segmento.

Ainda com o avião em solo, prevalecia confraternização e alegria características desses momentos de encontro e, mais relevante, uma grande animação por estarem juntas na expectativa de participar de um espaço de decisão da sociedade, que em sua maioria ainda são tão restritos as brasileiras.

Subitamente algumas começam a cantar “Tia Eron, ninguém aguenta porque você não nos representa”. Logo já eram muitas vozes agudas, ritmadas, acompanhadas por aplausos de alguns homens. A cantoria era uma referência à deputada federal baiana Eronildes (PRB) que acabava de entrar no avião. No último dia 17 de abril, a deputada, considerada próxima ao ex-presidente da Câmara dos Deputados, Eduardo Cunha, votou favorável ao impeachment da presidenta Dilma Rousseff e pior, em sua declaração de voto disse que representava as mulheres, em especial as negras da Bahia. Fato que indignou a maioria das mulheres dos diversos movimentos sociais, em especial as do movimento anti-racista. Diversos vídeos de participantes do vôo registram as cantorias sem nenhuma tentativa de agressão física. Não estavam promovendo nenhum risco ao vôo, mas sofreram com alertas permanentes do comandante para se calarem sob ameaça do avião não levantar vôo. Durante o vôo ouvia-se, vez ou outra, uma retomada da cantoria direcionada à deputada Eronildes e também ao deputado tucano Jutahy Magalhães “Jutahy eu não me engano, o seu nariz é de tucano”.

Ao aterrissar, já com o avião em segurança no solo, retomaram a cantoria e com certa indignação com a forma com que eram tratadas pelo restante da tripulação. Sem contar, com o mau humor, para pensar na melhor hipótese, de alguns poucos passageiros desabituados com viagens de delegações para eventos desse tipo. De repente, o comandante anuncia que toda a delegação deveria permanecer no avião aguardando a Policia Federal. O restante dos passageiros foi liberado, incluindo os deputados presentes e a deputada Eronildes. As baianas ficaram detidas por mais de uma hora, dentro de um avião, sem ar condicionado e foram obrigadas a apresentar seus documentos de identidade. Somente foram liberadas após intervenção das deputadas Alice Portugal (PCdoB), Moema Gramacho (PT), Maria do Rosário (PT) e da secretária de Políticas para Mulheres da Bahia, Olivia Santana. Algumas mulheres estreavam a viagem a Brasília, outras participavam pela primeira vez de evento nacional. É possível que algumas viajavam pela primeira vez de avião.

Um abuso. Exorbitou a TAM ao solicitar a presença da Policia Federal, por sua iniciativa, ou por solicitação de quem quer que seja. Transgrediu a Policia Federal ao ouvir somente um lado e manter detidas as mulheres que exerciam o seu direito de expressão numa democracia.

A plenária da 4 Conferência neste 11 de maio, prestou solidariedade as baianas, em sororidade, irmanadas na luta em defesa da democracia. Essas “perigosas ” seriam as primeiras a sofrerem repressão política num tempo obscuro que se subtrai direitos e agride a democracia?

Saudações as baianas do vôo 3437 que honram a luta das mulheres pela em nosso país e não admitem subtração de direitos conquistados. São as belas guerreiras da democracia.

*Julieta Palmeira é conselheira estadual de Comunicação e convidada do Ministério das Mulheres à 4ª Conferência Nacional de Políticas para as Mulheres