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O rigor militante do marxismo de Augusto Buonicore

A Fundação Maurício Grabois e Editora Anita acabam de lançar Linhas Vermelhas, livro que reúne artigos escritos ao longo de duas décadas, sobretudo para a imprensa do PCdoB.

Por José Carlos Ruy

Augusto Buonicore - Reprodução

O marxismo brasileiro vai bem, obrigado! O recente lançamento de Linhas Vermelhas: Marxismo e os dilemas da Revolução (Artigos e ensaios críticos) de Augusto Buonicore é uma demonstração da vitalidade do pensamento revolucionário no Brasil.

O livro (lançado pela Fundação Maurício Grabois / Editora Anita Garibaldi) reúne artigos publicados no espaço de duas décadas. Não é um livro acadêmico (no sentido limitado dessa palavra, aquele que exige uma certa neutralidade do autor). Ao contrário, os artigos nele publicados são textos que unem teoria e prática e atendem às exigências do combate teórico, que saíram principalmente em publicações ligadas ao Partido Comunista do Brasil (de cujo Comitê Central Augusto Buonicore é membro).

São textos que, à margem das minúcias formais do academicismo, não abrem mão do rigor investigativo e expositivo. Neste particular, estão perfilados à longa tradição marxista que exige acima de tudo clareza conceitual e expositiva.

Augusto Buonicore expõe, em Linhas Vermelhas, desde a trajetória do pensamento de Marx e Engels, até questões atuais enfrentadas pelo pensamento revolucionário.

Tem o mérito de fugir ao facilitário de certa forma dogmática de pensar segundo a qual há respostas para contradições atuais em obras escritas há muitas décadas, e que transformam o marxismo em um pensamento talmúdico segundo o qual soluções escritas no passado, “clássicas”, seriam aplicáveis de maneira ahistórica a diferentes idades da trajetória humana.

Não. Marxista afinado com a realidade concreta de seu tempo, Augusto Buonicore enfrenta questões atuais com o rigor que a tradição marxista exige. E o passeio que faz pelos problemas contemporâneos é extenso.

Lá estão questões filosóficas que incluem o debate da modernidade e suas circunstâncias. Aqui merece destaque o artigo onde enfrenta o enorme preconceito existente, mesmo entre muitos marxistas, em relação à contribuição de Friedrich Engels, polêmica que expõe com rigor demonstrando a improcedência das ideias que tentam desqualificar a contribuição teórica fundamental do companheiro de Marx e co-fundador do materialismo moderno.

Aborda a ciência política e o debate, necessário, do conceito de Estado ou da questão do partido. Em relação à história o leque é ainda mais amplo e inclui a atuação de Marx e Engels na conjuntura de seu tempo, sobretudo na Alemanha e na França – em especial o artigo que trata da Comuna de Paris – ou a Guerra Civil americana.

Questões mais atuais surgem nos textos que tratam das relações entre liberalismo e democracia, o mito moderno que o pensamento liberal (neoliberal, melhor dizendo) insufla e, por isso, coloca com força na pauta dos debates teóricos e políticos.

Afinal, Linhas Vermelhas se beneficia de intervenções no debate feitas ao longo de duas décadas! E que abordaram aspectos fundamentais para o entendimento da política de nosso tempo – lá estão temas como o colonialismo, a questão nacional, o fascismo, o racismo, as questões de gênero e de opressão da mulher. E também reflexões, importantes, sobre maio de 1968 em Paris, o golpe de Estado de Pinochet no Chile (1973) e a Revolução dos Cravos em Portugal (1974). Foram movimentos que, tendo acontecido há tantas décadas, são ainda cheios de lição para as lutas políticas atuais.

A tradição marxista tem sido marcada pelo debate do pensamento revolucionário em dois âmbitos – a universidade, mas também o partido. São espaços de debate que, com suas especificidades, se influenciam e se alimentam. Exigem rigor e tem particularidades próprias. No partido, o debate exige tomada de posição transparente e militante no sentido forte e amplo da palavra. Linhas Vermelhas se inclui neste âmbito – o debate e a propagação do pensamento marxista no âmbito partidário. Mas não se esgota nele, e se dirige aos combatentes pela revolução e pelas mudanças sociais e contra o capitalismo e sua feição moderna, o neoliberalismo. Nesse sentido, é um livro militante.