Quase 70% do mundo possui internet sem franquia, aponta ONU

Em meio à polêmica sobre a intenção de algumas operadoras de telecomunicações brasileiras limitarem os dados na banda larga fixa, ressurgiu o debate sobre qual é o principal modelo ofertado em todo o mundo. Franquia ou ilimitado? Para justificar uma possível efetivação da franquia, defensores da restrição chegaram a afirmar que a banda larga fixa limitada já é tendência em outros países.

Usuários protestam contra limite de franquia para internet fixa

Contudo, dos 190 países monitorados pela União Internacional de Telecomunicações (UIT), 130 deles oferecem prioritariamente planos de banda larga fixa com internet ilimitada. Ou seja, 68% dos países optaram por modelos sem franquia. A UIT é o organismo internacional das Nações Unidas (ONU) responsável por criar padrões e recomendações globais sobre as Tecnologias de Informação e Comunicação (TICs).

No final de cada ano, a organização publica o relatório “Medição da Sociedade da Informação” (Misr), que traz dados atualizados sobre as telecomunicações e divulga o ranking de países de acordo com o seu nível de acesso às TICs, conhecido como Índice de Desenvolvimento das TICs (IDI).

O último relatório, publicado em novembro de 2015, mostra que a Coreia do Sul continua na liderança de países melhor avaliados, seguidos da Dinamarca e Islândia. O Brasil está apenas na 61º posição, bem distante dos Estados Unidos (15º), que possui um dos modelos mais competitivos do mundo. Na frente do Brasil, encontram-se também três países sul-americanos: Uruguai (49º), Argentina (52º) e Chile (55º).

Do dez países com melhor ranking de desenvolvimento das TICs, apenas três países aplicam prioritariamente planos limitados: Reino Unido, Luxemburgo e Islândia. Os demais optavam, até a data do levantamento, por modelos ilimitados. Entre eles, a líder Coreia do Sul e a segunda colocada, a Dinamarca.

O relatório destaca também a grande ascensão do serviço móvel de celular, que chegou a mais de 7,1 milhões de inscrições em todo o mundo. Enquanto isso, a adesão à internet cabeada ainda aumenta lentamente em relação aos outros anos monitorados. Atualmente, há 800 milhões de inscritos com banda larga fixa.

Marco Civil diz que internet não pode ser bloqueada

Em 2014, o Congresso Brasileiro aprovou a lei Lei nº 12.965, conhecida como Marco Civil da Internet, que classifica a internet como serviço essencial aos brasileiros. "Hoje, se você é um adovgado e precisa de protocolos oficiais, só consegue tirar certidões pela internet. Para fazer um curso à distância, a mesma coisa. Por isso, a internet é um serviço essencial", explica Flávia Lefèvre, conselheira do Terceiro Setor do Comitê Gestor da Internet no Brasil (CGI) e representante da Associação de Consumidores Proteste. De acordo com esse entendimento, qualquer tipo de bloqueio da internet no Brasil se torna ato ilegal.

"Antes mesmo do comparativo com outros países, nós precisamos observar que o Marco Civil da Internet não permite que serviços essenciais sejam interrompidos no Brasil", explica Flávia Lefèvre.

Sobre a possibilidade de as empresas limitarem a velocidade após o uso da franquia, Flávia não considera a medida ilegal desde que respeitem um patamar mínimo de velocidade capaz de suprir os serviços públicos essenciais. Em 2011, o Plano Nacional de Banda Larga determinou que a Anatel colocasse um parâmetro mínimo de qualidade da internet, que se traduz hoje na internet popular com velocidade mínima de 1 Mbps, voltada para assinantes de baixa renda. Na visão da conselheira, esse é o único parâmetro mais claro do que seria essa velocidade mínima. "E olha, se você considerar o que é o mínimo para a UIT, esse número seria de, pelo menos, 2 Mpbs", compara.

A Telefônica, responsável pelos serviços da Vivo, e a Claro, responsável pela NET, foram procuradas por oferecem em seus planos atuais a possibilidade de limitar ou bloquear a velocidade após o vencimento da franquia. Contudo, até o fechamento dessa reportagem, somente a Telefônica respondeu dizendo apenas que "a Vivo cumpre todas as determinações legais e regulatórias existentes". A empresa afirma também que "nunca aplicou bloqueio ou redução de velocidade no serviço de banda larga fixa", apesar de prever essa possibilidade em contrato.

Atualização: após publicação da reportagem, A NET enviou resposta padrão onde afirma que "não houve qualquer alteração nas políticas e características dos planos de banda larga fixa por ela comercializados, desde o seu lançamento" e que atenderá as determinações da Anatel. No contrato da empresa chefiada pela Claro, consta a previsão legal de redução da velocidade quando a franquia do plano chegar ao seu limite, que pode ocorrer a critério da Net.

Franquias no Brasil são insuficientes para consumo multimídia

No dia 18 de abril, o diretor da Agência Nacional de Telecomunicações (Anatel), João Rezende, chegou a dizer que “a questão da propaganda do ilimitado acabou de alguma maneira desacostumando os usuários. Foi uma má educação ao consumo que as empresas fizeram ao longo do tempo”, referindo às mudanças nas franquias. Contudo, no dia 22 de abril, a Anatel voltou atrás e proibiu que as operadoras brasileiras ofereçam planos com franquia por tempo indeterminado, até que a questão seja analisada “com base nas manifestações recebidas pelo órgão”.

A polêmica sobre a implementação de franquias mobilizou internautas brasileiros que criaram a campanha #InternetJusta, com petições onlines e duras críticas ao modelo de franquia – que já existem no serviço de internet móvel 3G e 4G.

Durante o debate, Estados Unidos, Reino Unido e Espanha foram citados como exemplos países que aplicam o modelo que limite o pacote de dados por mês. Contudo, essa não é a regra preferencial da maioria dos países, que possui, por exemplo, China, Singapura, Canadá e Alemanha como uns dos optantes preferenciais pelo modelo ilimitado, conforme indica relatório da UIT. Para a organização, os Estados Unidos, na verdade, entram na conta dos países com planos ilimitados pois possuem uma grande concorrência com os dois modelos de acesso no mercado.

Confira a lista completa dos países de acordo com o modelo de dados clicando aqui ou na imagem ao lado.

Estados Unidos x Brasil

A competição norte-americana pelo melhor modelo de banda larga fixa se reflete na opinião dos estadunidentes em fóruns online Em 2011, o usuário "KwayZee" perguntou no fórum bodybuilding.com se o seu novo plano com 50 GB/mês seria uma quantidade decente para ele. "Eu faço um monte de streamings de Netflix e preciso de uma quantidade decente para jogar".

Como resposta, outros participantes desse fórum foram taxativos ao dizer que 50GB seria insignifcante para o seu objetivo. O usuário Desice chegou a exemplificar o problema: "você poderá ter uma vida difícil somente vendo vídeos em 240p e 360p [baixas resoluções] no Youtube… e menos internet significará mais academia? Obrigado, Deus, pela minha banda larga ilimitada", brincou.

Outros usuários narraram uas experiências com pacotes que nunca reduziram a velocidade após a estourar o limite contratual, mas recomendaram, sempre que possível, a opção pela rede ilimitada.

Enquanto o plano citado no fórum oferecia 50GB por mês, no Bbrasil um plano de 1 Mbps da empresa NET possui franquia de apenas 20 gb por mês. Considerando que um filme em HD da Netflix consuma 3GB por hora*, o assinante brasileiro desse plano conseguiria ver apenas 6 filmes em alta definição por mês – isso se ele não gastar a franquia com outras atividades como navegar no Facebook ou fazer uma videoconferência. Depois de estourar o limite, o contrato da Net informa que a empresa poderá reduzir a velocidade do usuário.

No caso da empresa Vivo (que adquiriu recentemente a GVT) um plano de 4 Mbps promete a mesma franquia de 50GB, que é suficiente para ouvir 13 dias seguidos de música ou rádio web (150 MB por hora) ou, então, baixar apenas um game que possui em média 50 GB.

Depois de estourar o limite, o contrato da Vivo alerta que poderá reduzir a velocidade ou, até mesmo, bloquear a internet a critério exclusivo da empresa. Veja o trecho abaixo:


As empresas OI e TIM não entraram no comparativo porque seus contratos, promocionalmente, não restringem a navegação de acordo com o consumo do assinante. .

*O consumo de dados por tipo de atividade foi calculado de acordo com as informações disponíveis no site da empresa de consultoria Teleco.