Com Meirelles e Skaf, Temer acena ao mercado e contra o povo

As precoces confabulações do vice-presidente Michel Temer para montar uma equipe e uma plataforma – para o caso de vir a substituir a presidenta Dilma Rousseff – não deixam dúvidas de para quem ele governaria. Até então, os afagos e acenos foram para o mercado financeiro e para os empresários da Fiesp. Aos trabalhadores e à classe média, as sinalizações apontam para o empobrecimento, o fim de proteções sociais e a redução de direitos.

Por Joana Rozowykwiat

Temer e Skaff

Nesta terça, em entrevista a O Globo, Temer diz que “se tivesse que assumir hoje, o ministro da Fazenda seria ele”, referindo-se a Henrique Meirelles, ex-presidente do Banco Central. Um defensor da chamada “independência do BC”, Meirelles é tido como um nome do financismo internacional. A declaração de Temer é, portanto, um claro gesto para os mercados financeiros, um recado de que está comprometido com o ajuste fiscal e com a busca de superavit.

Vários economistas têm apontado, contudo, que esse caminho leva ao aprofundamento da recessão e penaliza ainda mais o trabalhador, gerando desemprego e reduzindo renda. Devem ser esses os sacrifícios aos quais Temer se referiu no discurso que ele vazou, ensaiando a traição contra sua presidenta e o povo que a elegeu.

Na outra ponta, aliados de primeira hora de Temer no golpe, os empresários da Federação das Indústrias do Estado de São Paulo (Fiesp) já enviaram seu emissário ao Palácio do Jaburu para reivindicar retribuição. Na última segunda, o presidente da entidade, Paulo Skaf, disse à imprensa que apresentou a Temer “formas de se ajustar as contas sem o aumento de impostos”.

Esta parcela do empresariado – que foi agraciada nos governos Dilma com quase R$ 400 bilhões em desonerações de tributos, entre 2011 em 2016 – ironicamente tem promovido uma campanha por menos impostos e contra a presidenta.

Na verdade, a Fiesp esconde o real problema dos impostos no país: hoje, os ricos pagam pouco, enquanto os mais pobres e a classe média pagam demais. No momento em que setores progressistas defendem uma reforma tributária que signifique justiça fiscal, a Fiesp promove a desinformação, tentando angariar apoio popular para a sua causa particular.

Resta explicitar como um eventual governo Temer poderia se comprometer com os anseios de Skaf e seus liderados. Matérias publicadas nos últimos dias mostram as opções que estão sendo consideradas. “O grupo que apoia o vice-presidente Michel Temer vai insistir na proposta de desvincular benefícios – incluindo os da Previdência – dos reajustes concedidos ao salário mínimo”, informa O Estado de S. Paulo.

A proposta representa um retrocesso em relação às conquistas obtidas nos últimos anos, quando foi implementada a valorização do salário mínimo e aumentou o poder de compra do trabalhador. Seria, então, um passo atrás na redução das desigualdades de renda.

Na prática, com a eliminação da indexação de qualquer benefício com o valor do salário mínimo, o trabalhador poderá, por exemplo, receber como aposentadoria um salário inferior ao mínimo vigente. Vale ressaltar que o piso de R$ 880,00 já é qualificado pelo Dieese como abaixo do suficiente para uma pessoa viver com dignidade.

“A ideia é acabar também com as vinculações constitucionais, como gastos obrigatórios com saúde e educação, que engessam o Orçamento federal”, continua a matéria de O Estado de S. Paulo. O que o PMDB de Temer já propôs, inclusive em um documento assinado pelo próprio vice-presidente, é o que chama de Orçamento Base Zero.

Significa que receitas destinadas à saúde e educação, por exemplo, não seriam mais vinculadas a percentuais mínimos previstos na lei orçamentária e, sim, avaliadas ano a ano. Ou seja, ao invés de ser obrigado por lei a investir nessas áreas, cada governo ficaria livre para decidir onde aplicar os recursos, que ficariam à mercê de seus interesses momentâneos.

Estima-se que este tipo de medida possa gerar a descontinuidade de programas sociais e o maior temor é que, em um momento de crise, os cortes atinjam essas áreas essenciais, hoje protegidas pela lei.

Para marcar ainda mais seu compromisso com o equilíbrio fiscal a partir do corte de despesas, “Temer também se comprometeria com uma reforma mais estruturante, dos gastos da Previdência Social”, diz ainda o jornal paulista.

O que a plataforma Ponte para o Futuro, do PMDB, propõe é que a idade mínima de aposentadoria não seja inferior a 65 anos para homens e a 60 anos para mulheres. Tal medida afeta especialmente os mais pobres, que, em grande parte, começam a trabalhar muito cedo e demorariam mais tempo para poder se aposentar.

Ainda assim, depois de todo esse “pacote de maldades”, que atinge em chjeio o povo, analistas ouvidos pela BBC avaliam que um aumento de impostos mais à frente será inevitável.

"No curto prazo, o governo vai ter de achar uma forma de ampliar a receita para fechar a conta – isso será inevitável", diz à agência britânica Marcos Molica, sócio-responsável pela gestão de recursos da Rosenberg Partners."Uma opção menos polêmica seria um aumento da Cide (o imposto sobre combustíveis)", sugere na reportagem Alessandra Ribeiro, economista da Consultoria Tendências.

Pelos acenos divulgados na mídia, caso o processo de impeachment seja levado adiante, não apenas o governo eleito será removido do poder, como em seu lugar será entronizado tudo aquilo que o povo tem rejeitado nas urnas, desde 2002 – menos Estado, menos direitos, menos renda, mais desigualdade.