The Economist: A grande traição

O consultor na área de petróleo e colunista do Vermelho Haroldo Lima, analisando a artigo intitulado “A Grande Traição”, capa da revista conservadora britânica The Economist  [21 de abril] que trata do quadro político brasileiro, observa que “independente de juízos que a mim parecem de uma generalidade excessiva, a revista britânica é mais condescendente à presidenta Dilma que a nossa funesta grande mídia”. 

Capa The Economist traz o Cristo Redentor SOS

Haroldo Lima, que também é membro do Comitê Central do PCdoB, destacou da reportagem a referência ao perfil trágico do Congresso Nacional, mas, para ele, faltou aprofundar nos reais motivos que fizeram com que o parlamento brasileiro estivesse hoje tão mal representado. “Por que [o Congresso] regrediu tanto? Por que cresceu tanto a bancada do BBB, Boi [pecuarista], Bala [armamentista], Bíblia [evangélicos]?”, questiona.

Para Haroldo, uma gama de fatores combinados atingiu esse resultado. “Um rumo político reacionário já estava implantado na grande mídia; uma turma arraigadamente retrógrada tomou o Poder Legislativo e o Judiciário assumiu a prática reacionária predominante, por não ser eleito, por depender do Legislativo”, reflete.

O dirigente critica ainda a falta de ações políticas que alterassem o quadro de crise vivida hoje, o que chamou de carência de “mudanças sustentáveis” e de “audácia desenvolvimentista” que permitisse “o aprofundamento da recessão explosiva”.

“Como também não existiu em todo esse tempo uma politização da população que ia socialmente emergindo, em que pese grandes avanços sem base sólida; e como, finalmente, diferentes formas de corrupção tinham ganho foros de práticas inevitáveis, arraigadas, o resultado foi esse, a débâcle [derrota, desastre, ruína].”

Mobilização

Apesar disso, Haroldo acredita na sensatez da sociedade e na mobilização popular para que uma tragédia ainda maior não ocorra no Brasil. “Estamos procurando mobilizar massas, sobretudo jovens, e fazer corpo a corpo com os senadores. Sobrevive a expectativa de que, quando começar a fase do julgamento, presidido por Lewandovski, haverá a necessidade de provas dos ditos crimes, e aí o processo golpista pode ser barrado. A ver.”

Artigo

A revista narra a votação, ocorrida no último 17 de abril, na Câmara dos Deputados, como um dos “espetáculos” mais “esdrúxulos”: “Alguns vinham enrolados na bandeira nacional. Um deles chegou a soltar um rojão de confetes. Muitos aproveitaram para dedicar o voto a suas cidades, religiões, causas paroquiais – até os corretores de seguros foram lembrados. O parecer recomendando que as acusações contra a presidenta fossem encaminhadas para julgamento no Senado acabou aprovado por 367 votos a 137, com sete abstenções”, aponta um dos trechos.

“A decisão ocorre em um momento particularmente difícil para o Brasil”, analisa o artigo. “O Brasil enfrenta sua pior crise econômica desde os anos 1930. Entre o segundo trimestre de 2014, quando teve início a recessão, e o fim deste ano, o PIB brasileiro deve sofrer retração de 9%.”

Entretanto, o artigo ressalta que a crise econômica e política que atravessa o Brasil não é só fruto de erros cometidos pela presidenta Dilma e do seu partido, o PT, mas da “classe política inteira” que deixou o país na mão, “através de uma combinação de negligência e corrupção. Os líderes não vão reconquistar o respeito dos cidadãos e recuperar a economia a não ser que haja uma limpeza geral”, analisa.

The Economist
lembra que a votação da Câmara não sacramenta a saída da presidenta da República, mas acredita que ela é iminente. O Brasil, no entanto, “não deve lamentar”.

Golpistas

O texto trata ainda da situação do PMDB, que há poucas semanas anunciou a saída do governo, tendo o vice-presidente e vários ministérios ainda ocupados e o envolvimento de muitos líderes deste partido com corrupção. “O que é alarmante é que muitos dos que trabalham por sua saída [Dilma], são, em muitas maneiras, piores.” “O PMDB está desesperadamente comprometido”, aponta a revista, lembrando que o presidente da Câmara dos Deputados, Eduardo Cunha, é réu no Supremo Tribunal Federal (STF) e acusado de receber propinas no escândalo da Petrobras.

Acusação desimportante

“No curto prazo, o impeachment não resolverá o problema. A acusação em que se baseia o pedido de impeachment da presidenta – de que ela teria recorrido a artimanhas contábeis para fazer com que o deficit fiscal parecesse menor do que era – é tão desimportante que apenas alguns congressistas se deram o trabalho de mencioná-la em suas diatribes de dez segundos.”

Governo ilegítimo de Temer

A revista avalia que “se Dilma for destituída por conta de tal tecnicalidade, Temer terá dificuldade para se legitimar junto à grande minoria de brasileiros que ainda apoia a presidenta. Em qualquer outro país, a combinação de crise econômica e dissensão política talvez fosse perigosamente inflamável. O Brasil, porém, dispõe de reservas extraordinárias de tolerância. Por mais divididos que estejam sobre o impeachment, os brasileiros não parecem dispostos a ir às vias de fato. As três últimas décadas mostram que o país é capaz de passar por crises sem descambar em golpes ou colapsos. E é justamente aí, talvez, que resida um fio de esperança”, analisa o periódico.