Jovens atrizes da Cidade de Deus cantam contra a violência de gênero

Em agosto do ano passado, a cantora Elza Soares apresentou o single Maria da Vila Matilde, que faz parte do álbum Mulher do Fim do Mundo, lançado em outubro. Se na poderosa interpretação da cantora a música já soou como um manifesto feminista de combate à violência contra as mulheres, na de jovens atrizes negras moradoras da Cidade de Deus (RJ), a letra ganhou ainda mais força.

Fernando Barcellos Falar sobre raça e gênero não é uma escolha, é uma necessidade

“Cadê meu celular? Eu vou ligar pro 180, vou entregar teu nome e explicar meu endereço. Aqui você não entra mais, eu digo que não te conheço. E jogo água fervendo se você se aventurar (…) Você vai se arrepender de levantar a mão pra mim”, brada a canção composta por Douglas Germano. (Vídeo abaixo) 

O grupo de teatro Os Arteiros, que tem sede na Cidade de Deus, lançou esta semana em sua página do Facebook um vídeo em que oito atrizes interpretam um trecho de Maria da Vila Matilde para anunciar o próximo trabalho da trupe. Em menos de dois dias, o vídeo teve mais de 215 mil visualizações e 3 mil compartilhamentos. Segundo o diretor Fernando Barcellos, a escolha não foi aleatória, já que discussões sobre questões de gênero têm sido cada vez mais constantes nos encontros. “Os Arteiros é um grupo de teatro que trabalha com 40 crianças e jovens de 12 a 17 anos, em sua maioria meninas. Ultimamente, tenho percebido que elas estão mais donas da situação, debatendo o machismo em quase todas as rodas de conversa que fazemos quase que diariamente”, afirma.

A ideia de fazer um espetáculo sobre questões de gênero tomou corpo depois de Barcellos escutar diversas histórias das atrizes-mirins: “Quando indagada sobre o que era feminismo, uma garota do projeto respondeu: 'Eu não sei o que é feminismo, mas se é bom para as mulheres, é bom pra mim e eu apoio.' Foi depois dessas demonstrações de poder e força dessas meninas tão jovens e depois de ouvir o disco Mulher do Fim do Mundo, da Elza, que eu resolvi apresentar o disco para elas e propor um espetáculo feito somente pelas meninas.”

Só Com Mulheres ainda está em fase de pesquisa, sem data de lançamento. O tema deve girar em torno de uma reunião de mulheres que resolvem acabar de vez com a desigualdade de gênero e com o machismo, mas percebem que isso só será possível se todos os homens forem eliminados do planeta. “A discussão (que vamos propor) é como acabar com machismo sem acabar com os homens?”, conta o diretor de Os Arteiros.

“Nossa vontade não é so entreter, é fazer pensar, fazer com que o público saia do teatro refletindo. Falar sobre raça e gênero não é uma escolha, é uma necessidade. Vivemos um momento em que as agressões contra as mulheres, contra os negros e, mais ainda, contra as mulheres negras têm ficado mais evidente. E essa nova geração não aceita mais isso: elas estão indo pra cima, sem medo, pra tomar o que já deveria ser delas há muito tempo”, declara Barcellos.

 

Aguardem nosso próximo trabalho. Somente com mulheres!

Publicado por Os Arteiros em Quarta, 27 de janeiro de 2016