Até onde vai oposição argentina?

O dilema do último ano dentro do campo opositor na Argentina esteve centrado nos eixos unidade/divisão e crítica convicção/aceitação seletiva de algumas políticas de decisão. Neste sentido, Maurício Macri (Cambiemos) e Sérgio Massa (UNA – Frente Renovadora) foram delineando espaços diferenciados que competem entre si pelo voto kirchnerista.

Por Gisela Brito, no Celag

Massa e Macri - oposição na Argentina - Reprodução

A duas semanas das eleições presidenciais, as pesquisas de intenção de voto realizadas nas principais empresas de consulta privadas coincidem em projetar um cenário sem grandes variações dos resultados de agosto deste ano: a Frente para a Vitória [de Daniel Scioli, sucessor de Cristina Kirchner] continua liderando e a incógnita é se conseguirá ou não se eleger no primeiro turno; o “macrismo” não conseguiria crescer e poderia, inclusive, perder votos; e o “massismo” iria manter um apoio similar ao das primárias, e poderia até crescer em alguns pontos.

Com estas projeções, a disputa de Cambiemos e Frente para a Vitória não se concretizaria em um cenário de polarização. Um dado a ser levado em conta é que o crescimento da UNA se daria às custas da perca de apoio da Cambiemos e da FPV (cujo voto é menos volátil), o que poderia facilitar a eleição de Scioli no primeiro turno. O último trecho da campanha poderia ser decisivo para um resultado que ainda está aberto.

Neste panorama pré-eleitoral, Cambiemos e UNA estão se vendo paradoxalmente forçados a competir entre si mais para ocupar o segundo lugar que para ganhar as eleições, isso já lhes renderia espaço no segundo turno [a ser realizado em 22 de novembro]. O principal desafio que enfrentam ambas as forças em disputa “intra-oposição” é não parecer perante os eleitores com a “etiqueta” de “segundos” colocada antes do tempo, no lugar de “candidato vencedor” ou “potencial presidente”. Em outras palavras, o risco de assumir – em termos simbólicos – demasiadamente rápido uma derrota, o que os deixaria em uma posição ainda pior para tentar unir forças e apelar ao “voto útil” em um possível segundo turno.

Por isso a estratégia da Cambiemos está centrada em buscar polarizar com a FPV, ignorando a UNA, para se posicionar como o melhor competidor do kirchnerismo. Já no caso de Massa, o terceiro lugar o pressiona a se destacar para evitar ser “engolido” pelos outros dois polos. Sua estratégia está centrada em uma campanha com alto impacto midiático, cujos eixos se estruturam em torno de propostas agressivas sobre falta de segurança pública e narcotráfico, com um lugar também central para o plano econômico. Se fosse há alguns meses, UNA parecia que se diluía (inclusive em termos literais, com uma boa de seus dirigentes que voltaram para a FPV ou migraram para macrismo), o panorama atual parece ser mais alentador. Uma boa estratégia de comunicação é a aliança com o governador de Córdoba (terceiro maior distrito eleitoral) que serviu para apaziguar as águas e recuperar algum espaço que já havia sido perdido.

Para Cambiemos as dificuldades nas últimas semanas foram enormes: depois que seus candidatos perderam quase todas as eleições locais, a tentativa de se camuflar com algumas políticas centrais do kirchnerismo assumindo-as como conquistas já definitivas fez retroceder a identidade que vinham construindo como espaço político. Para piorar, se somou a isso vários escândalos de corrupção na administração do governo da capital do país. Estes fatos compõem um panorama extremamente complexo frente às eleições.

Ou seja, nesta conjuntura pré-eleitoral as incógnitas e as disputas continuam na ordem do dia, tanto entre situação e oposição como no interior de cada campo. É necessário esperar para ver os resultados que determinarão a continuidade, ou não, do projeto político iniciado em 2003, prestando atenção em especial nhoque acontecer na província de Buenos Aires, onde o desempenho da FPV será determinante para a definição nacional.

Entretanto, o dia seguinte às eleições, é de esperar novidades no campo opositor que podem ir muito além do próprio resultado eleitoral. 2015 vem sendo o “ano judicial” como recurso para tentar desgastar o governo. Esta via, que iniciou de maneira escandalosa com o Caso Nisnman em janeiro e cujo capítulo mais recente foi a questão de fraude em Tucumán, ainda tem muito água por rolar se os resultados eleitorais não favorecerem, ao menos é assim que entendem os setores reacionários. Ante um contexto adverso, a oposição poderia tentar judicializar sua derrota.

Por isso a imprensa de oposição já especula como instalar na agenda disputas jurídicas em torno da intepretação das porcentagens obtidas, dependendo se contempla ou não os votos em branco, ou com a possibilidade de que diante de denúncias de irregularidades nas eleições, o poder eleitoral pudesse adiar o segundo turno, ou até mesmo a pose do próximo presidente, prevista para 10 de dezembro.

Soam como disparates – igual aos vistos no caso Nisman e na fraude em Tucumán – mas podem ser razoavelmente efetivos se a aposta é deslegitimar o próximo governo. Ou seja, a disputa não é tanto pelo resultado final, mas sim pelo “durante” para instalar um fenômeno midiático. Esta parece ser a única alternativa para a oposição que carece não só de uma liderança aglutinadora, cujas forças internas não conseguiram, tampouco, articular um projeto de país possível com o qual pudessem disputar o poder de igual para igual com o kirchnerismo.