“Estupra pra ela ver o que é ser encoxada de verdade”, disseram

A frase do título partiu de pessoas que apoiaram um agressor durante um ato de violência sexual no metrô de São Paulo. Dados do Anuário do Fórum Brasileiro de Segurança Pública mostram que mais de 50 mil estupros foram registrados em 2013. Já o Ipea aponta que apenas 10% dos casos são reportados à polícia. O instituo mostra que existem anualmente 527 mil tentativas ou casos consumados de estupro no Brasil, dos quais 89% das vítimas são mulheres e 70% crianças e adolescentes.

Por Mariana Serafini

violência contra a mulher - Divulgação

A jovem de 17 anos que motiva o título desta matéria foi atacada por um agressor dentro de um vagão do Metrô da capital Paulista. Ao reclamar ela se chocou ainda mais com a reação dos outros passageiros que com gritos de “estupra” apoiaram o agressor. Este É apenas um dos milhares de casos de assédio em locais públicos que acontecem diariamente. Segundo uma pesquisa feita pelo Instituto Avon, em parceria com o Data Popular, 78% das mulheres já sofreram esse tipo de violência.

Um estudo do Senado Federal afirma que uma em cada cinco mulheres já sofreu algum tipo de violência; destas, 26% continuam convivendo com o agressor. Gisele Santos, de apenas 22 dois anos, tem uma vida inteira pela frente, mas agora com uma marca irreversível. Ela teve as mãos e os pés decepados pelo companheiro, Elton Jones Luz de Freitas, de 26 anos, quando expressou a vontade de terminar o relacionamento de sete anos.


Gisele, dias antes do crime e depois de já ter passado por uma série de cirurgias 


Depois de quatro dias internada na UTI, em São Leopoldo, no Rio Grande do Sul, Gisele teve os pés reconstruídos, mas os médicos não conseguiram reverter o caso das mãos. No mesmo dia que cometeu o crime, Elton se apresentou na delegacia e desde então está detido no Presídio Central de Porto Alegre.

As consequências sofridas por Gisele ao tentar terminar um relacionamento estão longe de ser uma exceção. Em pesquisa do Data Popular e o Instituo Patrícia Galvão, 70% dos brasileiros afirmaram que as mulheres sofrem mais violência dentro de casa do que em espaços públicos.
A violência de gênero é aguda no Brasil, só na última década 43,7 mil mulheres foram assassinadas. Muitas destas, vítimas do machismo, violentadas e mortas pelo simples fato de serem mulheres. É o caso de Martina Piazza Conde, de 27 anos, estuprada e assassinada com requintes de crueldade pelo homem com quem ela escolheu passar a noite depois de uma festa.


O sorriso e a espontaneidade de Martina eram suas características mais marcantes 
 

O crime aconteceu em Foz do Iguaçu, no interior do Paraná, Martina tinha vindo do Uruguai para estudar na Universidade de Integração Latino-Americana. Feminista, empenhou sua curta vida a denunciar a violência contra a mulher e criar mecanismos de empoderamento feminino. Costumava dizer que “mulher bonita é a que luta”.

O assassino de Martina estava num bar bastante frequentado pelos estudantes da Unila. Como qualquer outro jovem, ele conversou com diversas mulheres naquela noite, e em todas as vezes tentou leva-las para outro lugar, objetivo que só atingiu no fim da festa, com Martina.

As câmeras de segurança do prédio onde Martina o levou (não era a casa dela e sim de uns amigos que estavam de viagem) mostram os dois entrando juntos e em algumas horas ele saindo sozinho, completamente sujo de sangue. O corpo dela só foi encontrado dias depois, com muitas marcas de violência. Na delegacia ele confessou o crime e sem hesitar disse que aquele era seu objetivo do dia: matar uma mulher.


A mãe de Érkia, que já sabe quem são os quatro assassinos da filha, pede justiça 
 

O Mapa da Violência mostra que em dez anos o índice de homicídios de mulheres aumentou 17,2%. Em Brasília, Erika Bezerra da Silva, de 14 anos, foi assassinada com mais de 40 facadas por quatro homens adultos, um deles com quem mantinha um relacionamento, na madrugada desta quinta-feira (24). Ao perceber a movimentação estranha os vizinhos acionaram a Polícia Militar que chegou no local do crime e encontrou a adolescente ainda com vida. No entanto, após ser encaminhada ao hospital, ela não resistiu aos ferimentos.

Os dados mostram um país machista e extremamente violento, onde apesar dos mecanismos de proteção já existentes, como a Lei Maria da Penha e a Casa da Mulher Brasileira, milhares de mulheres ainda são estupradas, violentadas e assassinadas diariamente.

Ni Una Menos

A violência contra a mulher ganhou repercussão mundial em junho deste ano quando milhares de pessoas saíram às ruas de Buenos Aires, na Argentina, para pedir a aplicação da Lei de Proteção Integral com relação à violência contra as mulheres, aprovada em 2009 no país. Com a palavra de ordem “Ni una a menos”, que se refere ao feminicídio, a marcha tomou conta de mais 110 cidades na Argentina, Chile, Uruguai e México. Cartazes com frases como “é pela vida, chega de mortes” e “o machismo mata”, estamparam as manifestações.


Com cartazes do cartunista Liniers, milhares de mulheres saíram às ruas para exigir o fim da violência em Buenos Aires 


O cartunista Liniers, famoso por suas tirinhas ácidas e ao mesmo tempo divertidas, autor de Macanudo, publicou sua personagem Madariaga, com o punho cerrado em alusão à campanha. Dias depois, em São Paulo, ele contou que se assustou com a repercussão da tirinha. Segundo ele, na manifestação em Buenos Aires algumas pessoas já tinham tatuado a imagem da garotinha macanuda e ele recebia mensagens do mundo inteiro sobre a obra.

Em 2012, uma grande manifestação tomou as cidades de Pernambuco. Com velas empunhadas as mulheres fizeram vigílias pelo fim da violência. Na época, os números do estado atingiam cifras assustadoras, só em janeiro do mesmo ano 205 mulheres tinham sido assassinadas.