Vandré Fernandes: Uma história de amor e fúria

Nessa quinta (16), me deparei com uma frase nos jornais em que a presidenta Dilma foi categórica: Eu nunca desisti! Isso me fez lembrar do premiado longa de animação Uma história de amor e fúria, de Luiz Bolognesie.

Por Vandré Fernandes*, no portal da UJS

Cena do filme Uma história de amor e fúria - Divulgação

Uma história conta a paixão de um jovem índio guerreiro pela sua cunhã que perpassa por fragmentos da história do Brasil e indo para um futuro imaginário. Quando o protagonista vê Janaína ser morta pelo branco, nosso jovem guerreiro tupinambá se joga do alto do Pão de Açúcar, porém não morre, vira um ser encantado e voa pela história brasileira à procura do seu grande amor. Aí ele fala, diferente da presidenta, que desistiu pela primeira vez.

Em seu longa, Bolognesie inverte a lógica. Ele faz suas (re)leituras a partir do olhar do perdedor. O jeito que o diretor introduz os portugueses no genocídio indígena é impactante. Ao ver sua amada morta e seu povo dizimado, nosso personagem central cita a frase de desistente.

Avançando na história do Brasil, ele aborda a Revolta da Balaiada, no Maranhão. Nosso herói encantado encontra Janaína novamente e ao lado dela, ele constituiu uma família e comercializa balaios. Mas a elite brasileira sufoca os comerciantes através dos encargos cada vez mais altos e da violência. Ele vê sua filha sendo estuprada por uma espécie de chefe da guarda do fazendeiro.

Sem meios de sobreviver e vendo a crueldade acontecendo com a sua família, ele se junta a revolta no estado do norte. Os balaios tomam a Vila de Caxias e montam uma junta provisória. O governo brasileiro vendo a situação fora do controle, investe financeiramente na criação de um exército que já nasce com o intuito de reprimir as manifestações populares e de resguardar os interesses do Império e dos fazendeiros. O coronel Luis Alves, nomeado governador do Maranhão, ergue uma fortaleza para aniquilar os revoltosos e sai vitorioso da batalha, sendo condecorado, mais tarde, como Duque de Caxias.

Novamente o herói tem seu amor interrompido e desiste novamente.

Bolognesie dá um salto na história e o seu personagem chega na ditadura militar (1964-1985). Janaína agora faz parte do movimento estudantil que logo parte para a luta armada. Ele entra para o grupo, para ficar ao lado do seu amor, que como ele mesmo diz: “De novo do lado mais fraco, mas o brilho nos olhos dela, me dava a certeza de estar do lado certo”.

O grupo é preso e torturado. Ele perde o contato com Janaína. Passado alguns anos, ele a reencontra e ela está casada e com filho. Novamente ele desiste.

Em 2096, num futuro distante, a crise da falta d’água gera uma guerra em escala mundial.

Bem, mudando um pouco de assunto, cá para nós, se depender do governador de São Paulo, Geraldo Alckmin e sua falta de planejamento hídrico, essa guerra pode acontecer bem antes do que propõe o diretor. Aliás, ainda sobre o PSDB, a primeira cena desse episódio futurístico tem marca registrada dos tucanos. Três garotos vêem uma bola cair na lagoa, um deles segura um pequeno pote de água potável. Os policiais chegam percebem que o material foi roubado e executam os garotos friamente.

Mas, voltando ao personagem central, o nosso índio/balaio/guerrilheiro é agora um jornalista que denuncia as grandes corporações que desviam a água potável para a produção industrial do etanol. A população tem que se contentar com a água poluída do mar. Janaína é uma dançarina e o âncora das notícias, apesar das denúncias, se contenta com uma pequena cota de água potável e um dinheiro para levar a dançarina para a cama.

Porém, Janaína, além de dançar, faz parte de grupo guerrilheiro chamado “Água para todos”. O seu grupo sequestra o magnata da empresa ÁguaBrás querendo uma postura do governo brasileiro na redistribuição da água para beneficiar a população.

Nesse momento o diretor mostra que o herói na verdade sempre foi Janaína. Isso é dito pela boca do personagem central que frisa: “Janaína nunca desistiu”!

Infelizmente, o filme no Brasil não lotou os cinemas. Mas vale muito alugar em dvd ou baixá-lo para assisti-lo no computador, talvez comprá-lo, pois já é um clássico do cinema nacional.

E como diz a frase final do filme: “Viver sem conhecer o passado é viver no escuro”. E nem sempre a história contada pelos vencedores são as melhores histórias. Foi uma feliz escolha de Bolognesie.

Ou seja, que a história seja contada por pessoas que não desistam facilmente. Histórias cheias de amores e fúrias.

Assista ao trailer: