Obra inédita de Alejandro Zambra vira filme no Chile

Martín não quer recordar muito seu passado, tampouco tem interesse em contá-lo. Mas gostaria de inventá-lo, e acrescentar alguns bons momentos da vida dos outros para parecer que são seus. Provavelmente minta para conhecer uma garota e essa seja sua única saída para ser feliz. Martín é o protagonista do filme Vida de família, dirigido por Alicia Scherson e Cristián Jiménez, em uma mansão do bairro Yungay, no Chile.

Alicia e Cristián - La Tercera

O filme, baseado em um relato do escritor Alejandro Zambra, é o primeiro do convênio Film Friendly, do Ministério da Cultura do Chile. O acordo busca facilitar o cesso dos cineastas e artistas audiovisuais de várias regiões do país possibilitando rodar produções com baixas tarifas e diferenciadas, autorizações especiais e um apoio concreto. A prefeitura de Santiago lidera a iniciativa, que também se estende a Valdivia, Concepción e Valparaíso.

Vida de família, com um roteiro do próprio Zanbra, transcorre essencialmente em dois lugares: a casa de férias de Adriana Cousiño e as ruas ao redor. É como se fosse possível desprender, uma película de bairro, de armazéns e animais de estimação. A obra trata da vida de um personagem excêntrico e de seu flerte com uma vizinha. “Lemos o conto mais ou menos ao mesmo tempo, logo que saiu o livro de relatos Meus documentos. Na verdade Alícia o leu nesta época, eu soube pelo próprio Zambra que ele tinha um conto muito cinematográfico”, conta Cristián Jiménez (Bonsai), codiretor do filme junto com Alicia Scherson (El futuro).

Na história original Martin é um homem de 40 anos que acumula uma cadeia de pequenos fracassos na vida, e que um dia é chamado por seu primo distante, Bruno, para cuidar por alguns meses de sua casa. Isso porque le, sua esposa Consuelo e sua filha farão uma viagem a trabalho para a França e alguém deve cuidar da moradia da família. A melhor opção parece ser Martín, um homem sem família, sem vícios e sem manchas na vida.

“No conto original o casal formado por Bruno e Consuelo tem uma participação com pouquíssimo destaque. No filme há uma mudança e eles aparecem muito mais”, explica Alicia sobre o longa-metragem que conta com as atuações de Jorge Becker como Martín, Banca Lewin no papel de Consuelo e Cristián Carvajal como Bruno. A eles é agregado ainda a personagem de Paz (Gabriela Arancibia), ela é a tal vizinha que Martín conhece durante a viagem do casal de primos.

Martín inventa uma série de histórias, entre elas que a casa é sua e que o retrato de Consuelo na parede é, na verdade, da esposa que o abandonou.

“É um filme um pouco familiar. Somos amigos de Alejandro (Zambra) e por conhece-lo tanto fazer este longa foi natural. Eu vinha de uma gravidez, Cristián havia rodado um projeto em off e queríamos fazer algo em conjunto de forma que não nos demandasse tanto trabalho. Por isso decidimos dirigir juntos. Fizemos uma espécie de escala: cada dia é um que manda”, disse Alícia, que filma as cenas em sua própria casa, no bairro Youngay, com sua filha de oito meses ao lado dos refletores e claquetes.

“O conto pode ser muito melancólico, mas também tem bastante humor, como é habitual de Zambra. É um fio muito tênue que define sua literatura. É como dizer que o personagem principal é um mentiroso”, explica Jigménez, que antes deste projeto rodou Bonsai, baseado na novela de mesmo nome do autor chinelo.

Também para ambos é um filme de uma geração. “É curioso, mas todos temos 40 anos: os protagonistas, os diretores, o autor do conto. É um período de definitiva transição, de desapegar-se de algo que te amarra à tua família original, ou teus pais e entrar em outra etapa. Eu mesma tive minha filha aos 40 anos”, acrescenta Alicia.