Maria do Rosário leva novas calúnias de Bolsonaro ao Supremo

A deputada federal e ex-ministra dos Direitos Humanos Maria do Rosário (PT-RS) rebateu, nesta quinta-feira (14), as declarações feitas por Jair Bolsonaro (PP-RJ) a um grupo de estudantes que visitou a Câmara nesta semana. O ex-militar acusou Maria do Rosário de tentar esconder um suposto caso de abuso sexual contra menor de idade que teria sido praticado por um homem que foi casado com sua irmã.

Maria do Rosário x Bolsonaro

O caso foi descoberto por Maria do Rosário em 2003. À época, a deputada era relatora de uma CPMI (Comissão Parlamentar Mista de Inquérito) que viajou o Brasil levantando crimes contra a infância.

Discutindo questões de genêro e os atritos que teve com Maria do Rosário na Câmara, Bolsonaro disse às estudantes: "Você sabe por que ela me chamou de estuprador? Não foi só por causa do Champinha [menor de idade acusado de estuprar e matar uma adolescente], não. Foi por causa do cunhado dela também, que havia acabado de estuprar uma menor, de 11 anos de idade, 10 dias antes. Ela deveria ter pedido aqui [na Câmara] a punição do cunhado dela. Ela abafou de toda maneira o estupro do cunhado dela, do dia 30 de outubro de 2003. Ou você acha que sair com uma menina de 11 anos não é estupro de vulnerável?"

Em entrevista ao GGN, a ex-ministra disse que considera a acusação de Bolsonaro "inaceitável", "uma violência à minha dignidade". "É uma denúncia falsa. Em nenhum momento vacilei em exercer a minha responsabilidade. Eles foram presos em flagrante, denunciados no relatório final da CPMI e, como todos os demais [investigados], trabalhei para que fossem responsabilizados", frisou.

"Quanto a este deputado que me agride de todas as formas, a resposta que pretendo é sua condenação pelo STF [Supremo Tribunal Federal] e pelo STJ [Superior Tribunal de Justiça], pelas calúnias e injúrias que tem me proferido, inclusive mais está, porque está claramente documentado o trabalho que realizei na CPMI", indicou.

Em dezembro do ano passado, durante discurso no plenário da Câmara, Bolsonaro disse à Maria do Rosário que não a estupraria "porque ela não merece". Em entrevista posterior ao Zero Hora, ele reiterou a declaração: "Ela não merece porque é muito feia, não faz meu gênero. Jamais a estupraria". O pepista reafirmou às estudantes com quem conversou essa semana que reagiu daquela forma porque Maria do Rosário o ofendeu primeiro.

A deputada gaúcha, então, protocolou uma queixa-crime no Supremo solicitando que Bolsonaro responda por injúria e calúnia. A vice-procuradora-geral da República, Ela Wiecko, também denunciou Bolsonaro ao Supremo pelo crime de incitação ao estupro, a pedido do Conselho Nacional dos Direitos Humanos.

"O que pretendo é juntar essas palavras caluniosas [sobre tentativa de esconder um suposto crime de estupro] nas ações que já correm. São depoimentos caluniosos e posso provar pelo relatório [da CPMI] que está na internet, que pode ser visto por qualquer brasileiro. Espero que por mais esses motivos, ele venha a ser condenado. Jamais deixaria de fazer uma denúncia porque era contra alguém conhecido. A declaração que dei, aliás, repito hoje: foi um sofrimento terrível para as pessoas que conviviam com aquela pessoa. Mas o sofrimento maior é o da vítima de exploração sexual", endossou a ex-ministra.

O caso

Maria do Rosário foi relatora da Comissão Parlamentar Mista de Inquérito que investigou as situações de violência e redes de exploração sexual de crianças e adolescentes no Brasil, em 2003. “Foram dois anos de trabalho, visitamos 21 estados, denunciamos mais de 200 pessoas envolvidas em redes criminosas. Entre elas, uma pessoa que foi casada com minha irmã. Eu a denunciei, está no relatório da CPI, e espero que o trabalho do Ministério Público possa punir todos os responsáveis, inclusive este", disse ao GGN.

A petista lembrou que, à época, “pela surpresa do fato” de encontrar um conhecido entre os denunciados, sua reação foi a de relatar o ocorrido aos demais membros da CPMI, e não de "abafar" o fato, como sugeriu Bolsonaro. A deputada Ann Pontes (PMDB-PA), então, passou a ser a relatora do episódio.

A CPMI denunciou Flávio Renato de Brito Borges, que foi casado com a irmã de Maria do Rosário, e Carlos Alberto Fontana. Eles foram presos em 31 de outubro de 2003, em região de Porto Alegre conhecida como área de prostituição, na companhia de duas meninas, uma de 11 e outra de 15 anos. No relatório, consta passagem do inquérito no qual Flávio afirma que eles apenas deram carona à criança e adolescente, e que estavam na região com outro propósito.

Além de encaminhar cópias de toda a documentação do caso ao Ministério Público do Estado, a CPMI recomendou o indiciamento de Flávio Borges e Carlos Fontana, por “exploração sexual de criança ou adolescente". À Secretaria de Segurança Pública do Rio Grande do Sul, ao MP e ao Tribunal de Justiça do Estado, foi solicitado “agilidade e rigor na apuração e julgamento do caso.”

Ao que tudo indica, entretanto, Flávio Borges não foi condenado. Isso porque, em março de 2014, o Tribunal de Justiça de São Paulo ainda julgava uma ação por danos morais encaminhada por Flávio contra um jornal de Porto Alegre, que noticiou o fato de 2003. Na decisão, o juiz citou uma "sentença absolutória".

“Com efeito, o autor é cunhado da deputada federal Maria do Rosário e, conforme amplamente divulgado em novembro de 2003, teria sido flagrado com menores em seu carro nas imediações da Av. Farrapos, em Porto Alegre. Flávio se insurge com a forma como a notícia foi tratada pela imprensa, aqui neste caso o Jornal NH. O relatório do delegado de polícia que presidiu o inquérito e a cópia da sentença absolutória confirmam que o autor foi preso na companhia de outro sujeito e duas meninas menores de idade, tendo sido indiciado e denunciado nos termos do artigo 244-A, do Estatuto da Criança e do Adolescente. Então, nenhuma inverdade ou pré-julgamento foi praticado pelo órgão de imprensa”, despachou a autoridade judicial.