Crise entre PGR e PF suspende investigação de políticos da Lava Jato

A disputa entre policiais federais e procuradores da República na Operação Lava Jato tornou-se pública e ocupou espaço na grande mídia, que também passou a tentar impor seus interesses.

Teori Zavascki ministro do STF

O fato é que essa disputa paralisou parte das investigações relativa às suspeitas de envolvimento de políticos no esquema de corrupção na Petrobras. O Supremo Tribunal Federal (STF) determinou, a pedido do Ministério Público Federal, a suspensão de diligências a serem cumpridas em inquéritos que abrangem parlamentares.

Os desentendimentos entre policiais federais e procuradores surgiram a partir da abertura dos inquéritos autorizados pelo STF, em março. Segundo fontes, por conta do foro privilegiado, parlamentares investigados pediram para serem ouvidos na procuradoria da República e não na sede da PF. A procuradoria, por sua vez, confirmou a possibilidade.

O procurador-geral Rodrigo Janot teria ligado para o diretor-geral da PF, Leandro Daiello, e relatado o fato. Em resposta, Daiello disse que os investigados deveriam ser ouvidos na PF, pois a polícia estava cumprindo uma decisão do STF e que qualquer alteração deveria ocorrer mediante consulta do procurador à Corte. No entanto, os investigados não queriam mais depor para os delegados, o que aprofundou a crise.

O ministro da Justiça, José Eduardo Cardozo, a quem a PF é subordinada, tentou buscar o consenso em encontros separados com Janot e Daiello.

Hierarquia dos poderes

Outro ponto de divergência, segundo a imprensa, seria nos pedidos de novas diligências da Polícia Federal a partir dos documentos analisados sem consultar previamente a procuradoria.

Ainda fontes “muito confiáveis” da grande mídia, os policiais acusaram a procuradoria de tentar “limitar as investigações”, pois não havia justificativa para negar tais pedidos.

Já as fontes do lado da PGR teriam afirmado que a PF tomou a dianteira de forma indevida uma vez que o próprio ministro Teori Zavascki, relator da Lava Jato no STF, definiu na abertura dos inquéritos que o autor “incontestável” das investigações é o MPF.

Busca da verdade

Fofocas da mídia à parte, o impasse levou a PGR a pedir ao STF, na terça-feira (14), a suspensão dos depoimentos programados entre 15 e 17 de abril, o que foi atendimento pelo ministro Zavascki.

O ministro do Marco Aurélio Mello criticou a divergência entre os órgãos, mas enfatizou que é preciso respeitar a hierarquia. “O inquérito busca a verdade e é preciso que as instituições funcionem nas áreas reservadas pela lei. A Polícia Federal, o Ministério Público e, capitaneando, o STF. Não é uma coisa boa o desentendimento entre autoridades”, disse o ministro.

A Associação Nacional dos Procuradores da República divulgou nota reinterando a “confiança na Polícia Federal – notadamente em seu dever prioritário de cumprir mandados judiciais -, sem que entretanto isso signifique reconhecer pretensões a tarefas perante o Judiciário que não lhe competem, como já reconhecido, no caso, pelo próprio STF”.

Já Associação dos Delegados da PF se manifestou dizendo que “repudia a tentativa do Ministério Público Federal de interferir nas apurações da Polícia Federal na operação Lava Jato, com o pedido de Janot ao Supremo Tribunal Federal para a suspensão de depoimentos de sete inquéritos que seriam tomados nesta semana”.

Tom agressivo

Mas o presidente da associação, Marcos Leôncio, não poupou críticas e resolveu declarar guerra contra Janot. Leôncio, que esteve no Recife para divulgar a campanha por uma maior autonomia da PF no combate ao crime organizado e a corrupção, disse que “em Curitiba, tudo funciona às mil maravilhas, cada um respeita o papel do outro. Mas, em Brasília, temos um problema particular no STF”.

Não foi só isso. Leôncio disse também: “Janot colocou na cabeça que a Polícia Federal é dele, que vai fazer o que ele manda, o que ele quer. Janot colocou uma estrela no peito e agora pensa que é o delegado da PGR”.

Apesar do tom agressivo das declarações, Leôncio admitiu também que a "PF é obrigada a cumprir as orientações do MPF”, mas tentou minimizar essa obrigatoriedade ao afirmar que a “forma e o melhor momento quem sabe é o investigador”.

Segundo o presidente da associação dos delegados, Janot quer ter “o controle total”. Mas revela o seu real pensamento ao afirmar: “Se a gente trabalha por mais autonomia, se não quer ser subordinado a um partido, vai querer do MPF? Isto não existe”.

O que diz a Constituição

De fato, a Polícia Federal não deve ser subordinada a partido. Essa, aliás, foi uma das conquistas asseguradas pelos governos Lula e Dilma que acabaram com a era do engavetador-geral da República, em que nada se investigava.

Mas é subordinada – como Leôncio mesmo afirma -, aos poderes públicos do Estado, portanto ao Ministério Público. Por ser um braço armado do Estado, constitucionalmente a Polícia Federal não pode ter essa “independência” defendida por Leôncio, pois representaria um risco ao próprio Estado Democrático de Direito e aos direitos fundamentais dos cidadãos.

Vale ressaltar que existe um Projeto de Emenda à Constituição (412/2009) no Congresso Nacional que propõe essa “autonomia”.

Além disso, a Constituição Federal atribui o controle externo da atividade policial ao Ministério Público, previsto no artigo 129º, inciso VII, com o objetivo de fortalecer o sistema de freios e contrapesos entre os órgãos de poder.

Holofotes

Desde o início da Operação Lava Jato, além de denúncias de esquemas de corrupção, vazamentos seletivos e a tentativa de omitir alguns políticos, ficou evidente a disputa pelo holofote de agentes diretamente ligados às investigações.

A pergunta que fica é: quem quer buscar a verdade e quem está querendo atender aos seus interesses? O tempo revelará.

Do Portal Vermelho, Dayane Santos, com informações de agências