Economista propõe frente industrial para o Rio Grande do Norte

 

Coordenador do curso de Economia da Universidade Federal (UFRN), o economista e professor Wellington Duarte é severo nas críticas à falta de uma política de planejamento de desenvolvimento econômico para o Estado. Na sua avaliação, “falta coragem, ousadia e determinação” para promover “um choque de gestão” no setor econômico.

“Fazer reunião com Federação das Indústrias (FIERN) e Federação do Comércio (FECOMERCIO) não adianta. O Estado Não vai crescer. Você não vai ter um parque industrial só através de reuniões. Você tem que ter ações efetivas, uma parceria concreta com o governo federal, desenvolver o Programa de Aceleração do Crescimento (PAC). Vamos desenvolver o PAC como?”, questiona.

Para o professor, que é filiado do PC do B, partido sócio do governo Robinson Faria (PSD), a alternativa estaria em construir uma espécie de frente industrial e um pacto empresarial para o RN. “Você tem que se afastar desta visão patrimonial e fazer um grande pacto efetivo com a classe empresarial, classe política e classe dos trabalhadores. Ou se faz isso ou o nosso governador vai ser o gerente de uma folha de pagamento, que é o que tem sido feito nos últimos anos. Você gere a folha de pagamento, fica com problemas e não faz nada”, aponta. Confira sua entrevista exclusiva ao Jornal de Hoje.

O Jornal de Hoje – Qual a análise que o senhor faz do momento econômico no país?

Wellington Duarte – É um momento difícil, sem sombra de dúvidas. O País vive numa situação de encruzilhada. Nós temos uma crise política que está à vista de todos e uma economia que começou a ser travada em 2012. E esse travamento provocou uma série de rupturas, por exemplo, na política econômica que agora está tendo efeitos na cadeia produtiva como um todo.

JH – Que cenário o senhor vislumbra para este ano?

WD – Olha, o cenário é de dificuldades econômicas para o governo. A proposta do Levy (Joaquim Levy, ministro da Fazenda) é uma proposta recessiva, de conter a taxa de inflação via depressão do consumo. Isso é uma saída ortodoxa que foi feita na Europa e não deu resultado, que por sinal a Europa continua em crise, mas foi a saída que o governo encontrou para se aproximar dos mercados, principalmente do mercado financeiro. Em minha opinião é uma estratégica ousada, mas também tem impactos muito negativos na classe trabalhadora. Já começou o desemprego, a diminuição de empregos com carteira assinada e com o detrimento de emprego você tem um detrimento de produtos, porque você não tem consumo, quer dizer, é um ciclo vicioso que se aposta que com esse ciclo vicioso em determinado momento os agentes econômicos voltem a investir. É uma aposta ariscada no momento em que há uma crise mundial. Eu acho que esse ano a economia vai ter um PIB negativo, a não ser que mudem as variáveis econômicas daqui para o final do ano.

JH – Mas as medidas não são necessárias?

WD – Evidentemente que há já algum alento. A indústria de transformação, no início do ano, com seus dados desnacionalizados, teve uma pequena variação positiva. Mas ainda é muito pouco. Essa depressão do pouco investimento é que preocupa porque o que vai tirar o Brasil deste processo novo de crise é o investimento e a taxa de investimento é muito baixa 17%, era 19%. No mínimo deveria ser 26% do PIB.

JH – O que gerou esse quadro?

WD – Em minha opinião dois pontos aconteceram. Em 2007 a gente rompeu com um modelo que foi colocado neste país a partir da entrada do acordo com o FMI em 1998. Só que a gente focou muito no consumo, nós precisamos disso, a ascensão social precisava do consumo. Porém você tem que relacionar o consumo com a oferta e a competitividade do país com a moeda sobrevalorizada. O real estava muito valorizado em relação ao dólar, deprimiu as importações. O setor industrial não teve a potencialidade de efetuar esses grandes investimentos e começou a decrescer. Você pode pegar os dados de 2013 e de 2014, apesar da desoneração fiscal do governo que fez a redução do IPI e que gerou uma perda de arrecadação de R$ 170 bilhões em dois anos, isso é importante citar, não foi suficiente para motivar a grande indústria a produzir e aí você deprime o investimento e aí começa a impactar nas gerações de riquezas. Por isso que o PIB começou a cair entre 2012, 2013 e 2014.

JH – E a economia do RN, como fica diante deste cenário?

WD – Você sabe o que me preocupa? É quando você pega a estrada aqui a BR 101 e passa por João Pessoa, ver a quantidade de empreendimentos industriais que estão sendo feitos lá. Isso é o preocupante, porque até a Paraíba começa a ter um desenvolvimento voltado para o setor que realmente agrega que é o setor industrial e nós continuamos com essa mesmice de não pensar o RN da forma devida. Evidentemente que esse governo que mudou há dois, três meses não pode ser avaliado ainda do ponto de vista de gestão. Agora fica bem claro que o planejamento do governo não existe, é inexistente. O primeiro passo seria esse. Evidentemente que quatro anos é um tempo muito curto para você recuperar toda uma série de décadas e décadas de perda desta visão, diria até a visão empresarial do RN, porque a visão patrimonial é aquela visão tradicional de você dar incentivos fiscais. E você ter uma guerra fiscal é algo que impede que se desenvolva. Então você tem que se afastar desta visão patrimonial e fazer um grande pacto efetivo com a classe empresarial, política e os trabalhadores. Ou se faz isso ou o nosso governador vai ser o gerente de uma folha de pagamento, que é o que tem sido feito nos últimos anos. Você gere a folha de pagamento e fica com problemas e não faz nada. Eu acho que está chegando a hora, passou da hora do RN, nós temos contas externas, uma balança comercial negativa, desenvolvimento comercial pífio. 25% do PIB do RN é do setor público. Então, você tem que ver isso aí. A economia do RN é concentrada, quase 70% do PIB do RN está na região metropolitana de Natal. 42% do PIB do RN está em Natal. Você não pode querer desenvolver um Estado através deste pressuposto concentrador. E você tem três polos: Natal, Mossoró e Guamaré. Quer dizer que desenvolvimento é esse? Baseado em três pilares que podem se fragilizar porque o petróleo em terra está diminuindo de produção?

JH – Quais são, então, do seu ponto de vista, as alternativas existentes?

WD – Alternativa seria construir uma espécie de frente industrial para o RN. Há elementos para isso? Sim, nós somos produtores de commodities, nós produzimos ferro e ao que me consta ele não vai acabar nem hoje nem amanhã. Então, nós temos que observar o que o ferro pode trazer para o RN? Na região de Jucurutu, Parelhas, seria um alento. O desenvolvimento mineral, nós temos muito minerais no RN, mas o que se faz? Exportar ele de forma crua. O ferro vai para a China e volta na forma de aço, bem mais caro e se colocar a indústria aqui no RN, qualquer tipo de indústria, gera cadeia produtiva, qualquer tipo de indústria. Falta coragem, ousadia e determinação, precisamos de um choque de gestão. Na minha opinião, o gestor ele tem que ter primeiro a humildade de dizer ‘nós não temos, não’. Porque fazer reunião com Fiern, Fecomércio não adianta, não. Não vai crescer, não. Você não vai ter um parque industrial só através de reuniões. Você tem que ter ações efetiva aí o governo tem que ter uma parceria concreta com o Governo Federal, há desenvolver o PAC, sim vamos desenvolver o PAC como? A energia eólica, como vamos trazer a indústrias para o RN a partir da energia eólica. Você tem que tomar atitudes de uma vez por outra e dizer ‘nós vamos fazer isso nos próximos dois anos’, ‘nós vamos fazer isso e fazer’. Porque o que você percebe no RN é que leva um tempo para começar a fazer, depois desiste no meio do caminho, pode olhar em todo o histórico do RN, dos 30 anos para cá é assim. Você começa um empreendimento, dá muito sucesso ou não. Se não der o sucesso no primeiro, você desiste e às vezes muda de governo e aí você abandona essa ideia.

JH – O turismo é nossa grande vocação?

WD – Qual o foco do Turismo do RN? É necessário ter um planejamento para desenvolver o turismo. Talvez até tenha, provavelmente, eu desconheço, mas você não vê isso na prática. Aqui você vê um turismo de ocasião, em que as pessoas vêm passar uma semana ou um feriado. O nível de hotelaria é baixo. O turismo é sazonal. Entre um período e outro, o que é que se faz? Como o Estado atua neste sentido? O Estado é suporte? No caso do turismo ele é um articulador.

Fonte: Jornal de Hoje