Nathali Macedo: Estupro não é motivo de piada

Existe uma banalização da violência sexual no Brasil. E a entrevista do ex-ator a Rafinha Bastos, se gabando de abusar de uma mulher, é mais uma prova disso. A entrevista de Alexandre Frota no programa Agora é Tarde, televisionada na última quarta-feira (25), foi, para muitos, no mínimo estarrecedora.

Por Nathali Macedo, para o Diário do Centro do Mundo*

Estupro não é motivo de piada - Reprodução

O ex-ator contou — em tom de piada e com uma naturalidade assustadora — que manteve relações sexuais não consentidas com uma mãe de santo e chegou a apertar seu pescoço até que a mulher desmaiasse, deixando-a desacordada após o ato.

O apresentador e a platéia em peso riram da “piada” do entrevistado, e o programa continuou tranquilamente como se absolutamente nada fora da normalidade tivesse acontecido, abordando seus assuntos desinteressantes que refletem um Brasil que, honestamente, me envergonha.

Me envergonha mas não me assusta. É que as pessoas (especialmente a mídia e a internet) agiram com tamanho espanto, como se situações como estas não fossem — lamentavelmente! — corriqueiras no Brasil.

Não raro, o estupro e a violência contra a mulher é naturalizada em rede nacional.

Há duas semanas, por exemplo, uma revista de fofoca de alcance nacional teve como matéria de capa o resumo do capítulo vindouro de uma novela global: “Zé Alfredo invade UTI, tira a roupa de Cora e transa com a megera.”

Quando a cena foi para o ar, na verdade não tinha nenhum estupro. Mas a revista noticiou como se tivesse e não houvesse problema algum nisso.

O próprio Rafinha Bastos — o entrevistador que riu e naturalizou a apologia ao estupro disfarçada de piada de Alexandre Frota — declarou, certa vez, o seguinte absurdo:

Toda mulher que eu vejo na rua reclamando que foi estuprada é feia… Tá reclamando do quê? Deveria dar graças a Deus. Isso pra você não foi um crime, e sim uma oportunidade. Homem que fez isso não merece cadeia, merece um abraço.
Poderia haver algo mais absurdo e repugnante? No entanto, Rafinha continua solto, rico, famoso e bem sucedido em seu novo programa de “humor” Agora é Tarde, ganhando (muito) dinheiro pra continuar distilando violência travestida de piada.

Em todos os casos — que são só uma pequena prova da naturalização do estupro no Brasil — o país assistiu e se divertiu com a violência escancarada. A mídia brasileira reflete, portanto, a mentalidade machista e violenta do brasileiro.

Gente como Rafinha Bastos e Alexandre Frota só continuam na mídia porque há quem os assista, quem os aplauda e quem ria de seu machismo violento — inclusive mulheres, para a minha total descrença.

Felizmente, graças ao feminisno — esse mesmo feminismo rechaçado e ridicularizado por muitos nas redes sociais — atitudes como essas têm sido pouco a pouco reprimidas.

As críticas sofridas por Frota na internet ainda são muito menos do que ele merece mas, felizmente, graças à reação de gente que abriu os olhos e percebeu que estuprar não é engraçado, pessoas como Frota e Rafinha Bastos têm sentido, cada vez mais, que a violência sexual como forma de entretenimento não mais será tolerada.

Como se não acreditasse que o povo — especialmente o povo feminista — acordou, Rafinha se justificou na internet: “Era uma piada, ele não fez isso. Se tivesse feito, estaria na cadeia.”

Os internautas — que têm o meu total apoio e concordância — não recuaram. Verídica ou não, a naturalização do estupro precisa acabar! Parece que o “mimimi feminista” da internet tem surtido efeito: a cultura do estupro não passará. Os pseudohumoristas que se cuidem.

Agora é tarde, Rafinha.

*Nathali Macedo é escritora