Obra de Abelardo da Hora ganha exposição na capital paulista

A obra “subversiva” do pernambucano Abelardo da Hora ganha uma exposição individual na Caixa Cultural São Paulo, na capital paulista. O lançamento é neste sábado (7) às horas. Sob a curadoria de Renato Maganhães Gouveias, as 101 obras selecionadas trazem ao público a faceta inquieta e generosa de Abelardo.

Abelardo da Hora - Reprodução

Dentre as esculturas, desenhos, pinturas e maquetes destacam-se os bronzes “Menino de Mocambo”, de 1969 e “A Fome e o Brado”, de 1947, a série de 22 desenhos de bico de pena de 1962 e o poema “Meninos do Recife”, além da maquete e fotos da polêmica “Torre de Iluminação Cinética”, instalada na Praça da Torre, no Recife, em 1961 e destruída pelo regime militar em 1964.

Conhecido e admirado pelo temperamento ao mesmo tempo generoso e irreverente, Abelardo da Hora foi celebrado internacionalmente a partir dos anos 60 com de temática social que denunciavam a miséria brasileira e a exclusão, sendo considerado pela crítica especializada o maior escultor expressionista do Brasil.

“O íntimo da obra do artista aqui se revela não apenas nesses exemplos contraditórios apresentados. Esta exposição quer contá-lo como personagem completo: educador por excelência, desenhista, pintor, gravador”, escreve Renato no texto de apresentação da mostra.

Vida e obra

Escultor, desenhista, gravador e ceramista, Abelardo cursou de Artes Decorativas no Colégio Industrial Prof. Agamenon Magalhães, Curso Livre de Escultura na Escola de Belas Artes de Pernambuco. Trabalhou para o industrial Ricardo Brennand de 1943 até 1945, realizando vários trabalhos em cerâmica, jarros florais e pratos com motivos regionais em relevo e em terracota. Em 1945, foi para o Rio de Janeiro onde trabalhou num atelier improvisado na garagem da casa de Abelardo Rodrigues. Em 1948, prepara sua primeira exposição de esculturas expressionistas, a primeira do gênero realizada na cidade.

Idealizou e criou com Hélio Feijó e outros, a Sociedade de Arte Moderna do Recife (SAMR) e, em 1952, fundou o Atelier Coletivo da SAMR do qual foi professor e diretor.


Obra Enterro de Camponês, de 1953, gravura em gesso
Foi também um dos idealizadores do Movimento de Cultura Popular (MCP), criado na gestão do então prefeito do Recife, Miguel Arraes, 1960 a 1962. Esse movimento refletia um sentido altamente engajado e seu objetivo era “ampliar a politização das massas, despertando-as para a luta social”, conforme preconizavam seus participantes, entre os quais o célebre educador Paulo Freire, o escritor Ariano Suassuna, entre outros intelectuais. Como um dos diretores do MCP construiu e dirigiu a Galeria de Arte, às margens do Capibaribe, o Centro de Artes Plásticas e Artesanato e as Praças de Cultura, no Recife.

Durante os anos de 1957 e 1958 expôs em vários países da Europa, na Mongólia, na Argentina, em Israel, na antiga União Soviética, na China e nos Estados Unidos. Lançou, em 1962, o álbum de desenhos “Meninos do Recife” e em 1967, a coleção de desenhos “Danças brasileiras de Carnaval”, na Galeria Mirante das Artes, em São Paulo.

Integrante do então ilegal Partido Comunista desde 1948, Abelardo e sua família conheceram a prisão, a tortura e perseguição do regime de exceção que sobreveio ao golpe militar de 1964. A cada Ato Institucional baixado pelos militares, e sob quaisquer outros pretextos, o artista “subversivo” era preso, contabilizando mais de 70 prisões desde 1947 quando fazia propaganda política em comício do Partido.

Com o golpe, muda-se para São Paulo, onde é acolhido pelo casal de amigos Lina Bo e Pietro Maria Bardi, e trabalha na extinta TV Tupi. Retorna ao Recife em 1968, dedicando-se à pesca enquanto cursa a Faculdade de Direito de Olinda. Nos anos 1970 volta a trabalhar em seu estúdio, onde hoje está instalado o Instituto que leva seu nome.

“Faço a minha arte respondendo a uma necessidade vital. Como quem ama ou sofre, se alegra ou se revolta, aprova ou denuncia e verbera. Fruto das coisas que a vida ensina… A marca mais forte do meu trabalho tem sido entretanto o sofrimento e a solidariedade. A tônica é o amor: o amor pela vida, que se manifesta também pela repulsa violenta contra a fome e a miséria, contra todos os tipos de brutalidade, contra a opressão e a exploração”, declara Abelardo.

Possui obras nos acervos de museus como MASP e no MAC USP em São Paulo, no Museu Nacional de Belas Artes no Rio de Janeiro, com a obra “Desespero”, “Enterro de Camponês” no museu do Solar do Unhão na Bahia, “Mulheres” na Estação Branco em João Pessoa – PB, “Memorial Aos Retirantes” no Parque Dona Lindu e no Museu de Arte Moderna Aloísio Magalhães no Recife, “Água Para O Morro” no EuroMuseu, além de diversas obras em prédios e praças públicas, museus, galerias e espaços de arte nos Estados Unidos, China e Argentina.

Lançamento do catálogo da exposição

No dia 11 de abril, às 11 horas, é lançado o catálogo da exposição. Na mesma ocasião, acontece a palestra com Antonio Alves Sobrinho, intitulada “Abelardo da Hora – 90 Anos de Arte”, que contempla: Expressionismo no Brasil, Pernambuco no contexto da arte brasileira, Abelardo da Hora trajetória e formação, atuação política como arte e arte como atuação política, Abelardo da Hora – anos 2000. São 50 vagas e inscrições podem ser feitas pelo telefone (11) 3321 4400.

Leia também: 
Urariano Mota: Abelardo da Hora, sempre da hora*
Diálogo literário: Abelardo da Hora, Abelardo de toda a gente
Morre, aos 90 anos, o escultor pernambucano Abelardo da Hora

Fonte: Fundação Mauriício Grabois