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Globalização imperialista cria a sua própria sepultura

Desafios do movimento operário nos Estados Unidos como consequência da reestruturação da economia mundial. Por John Catalinoto, apresentado no Encontro Civilização ou Barbárie, realizado na cidade portuguesa de Serpa nos entre os dias 5 e 7 de outubro de

O objetivo desta contribuição é examinar as mudanças estruturais profundas no capitalismo mundial que transformam a classe trabalhadora internacional. Estas mudanças têm levado à miséria grande parte da humanidade, especialmente na Ásia, na África e na América Latina, como o imperialismo tem feito durante séculos; as lutas dos trabalhadores e dos povos nessas áreas continuarão a ser muito importantes para enfraquecer a dominação imperialista. Entretanto, o elemento novo é que estas mudanças, historicamente sem precedentes, desestabilizarão também o capitalismo nos países imperialistas, incluindo os Estados Unidos. Este artigo focalizará as atuais circunstâncias no centro do imperialismo mundial e os desafios do movimento operário.



Este artigo baseia-se no livro em progresso intitulado Colossus with Feet of Clay (O colosso com pés de barro), de Fred Goldstein, um colaborador do autor no periódico estadunidense, Workers World. Os textos aqui utilizados têm a permissão de Goldstein.



Prefácio: Socialismo ou Barbárie



Quando Rosa Luxemburgo usou pela primeira vez a expressão, “socialismo ou barbárie,” escrevia da cela de uma prisão, no segundo ano da Primeira Guerra Mundial. Foi no meio desta luta sangrenta, dois anos antes da Revolução Russa trazer novas esperanças para toda a humanidade. Também nos anos trinta, os povos consideravam possível a alternativa da “barbárie” —  significando a reação e a degradação total da civilização — após a vitória do fascismo na Alemanha e da marcha do imperialismo alemão através da Europa no começo da Segunda Guerra Mundial, antes de Stalingrado. Mas, durante os 45 anos após a vitória soviética sobre o nazismo alemão, mesmo durante os anos em que a ameaça de aniquilação termonuclear pendia sobre a cabeça da humanidade, os partisans do socialismo não consideraram a possibilidade de um colapso da civilização. Mesmo os camaradas que tinham conhecimento da fraqueza do socialismo soviético, consideravam a própria existência da URSS a prova do triunfo inevitável do socialismo. Esta confiança foi reforçada pelas vitórias de libertação nacional e socialista na China, na Coréia, no Vietnã e em Cuba e a libertação nacional de países africanos e outros no Oriente Médio.



Com o fim da União Soviética e o colapso do campo socialista na Europa Oriental, em 1989-1991, até mesmo os milhões de comunistas muito dedicados perderam a confiança no triunfo do socialismo. Os menos dedicados remeteram-se ao reformismo. Alguns até aceitaram jogar um papel na direção do Estado capitalista no ataque neoliberal contra os avanços históricos dos trabalhadores.



A queda da URSS não foi somente uma perda material enorme para a classe operária e para os movimentos pela libertação nacional mundial, mas também um enfraquecimento profundo na ideologia socialista, marxista e leninista. Permitiu que a classe dirigente imperialista empregasse um exército de inteletuais para lançar um ataque em todas as direções contra a fundação do socialismo e para reescrever a história do mundo desde 1917. E, de repente, o livro o mais profusamente distribuído na história, O Estado e a Revolução, de Lênin, deixou de ter uma grande tiragem.



Outros participantes desta Conferência escreveram extensivamente sobre esse acontecimento negativo e lutam contra suas consequências. Jean Salem, por exemplo, no seu recente documento sob o título Lenine et la Revolution (Lênin e a Revolução), indica como desde 1991 a classe francesa dominante distorceu a história do papel soviético na Segunda Guerra Mundial e obteve sucesso na venda desta ideia distorcida a uma grande parte da população — e isto num país onde as praças das cidades recebiam o nome de Stalingrado.



Levanto o tema sobre o retrocesso na ideologia socialista somente para ressaltar o que o tema: “Civilização ou Barbárie” ou “Socialismo ou Barbárie” significa para mim. Acredito que os alvos desta forte mensagem são os activistas na luta pelos direitos humanos ou pela defesa dos trabalhadores ou os opositores à guerra imperialista, ao racismo e aqueles que lutam para proteger o meio-ambiente. Esta é uma mensagem que afirma que a sociedade capitalista, na sua forma neoliberal atual, ameaça a civilização e talvez a própria existência da humanidade. É uma mensagem que diz que não podemos somente lutar por reformas, mas nos devemos organizar para lutar pelo socialismo. Devemos, também, começar agora mesmo a lutar pelo socialismo, ainda que este não esteja na ordem do dia.



Esta é uma mensagem que Miguel Urbano Rodrigues usa em muitos de seus discursos e artigos. Urbano discute que as resistências iraquiana e afegã colocaram de joelhos o poderoso Pentágono, que os palestinos enfrentam com coragem a ocupação sionista, que Cuba socialista se fortalece, que a Venezuela bolivariana está a realizar um processo revolucionário, enquanto luta contra do neoliberalismo, que as FARC estão a lutar armadas e revolucionárias contra um regime de cunho fascista na Colômbia. Miguel Urbano termina com um apelo muito claro para que combatamos a ameaça à humanidade por meio da mobilização para a luta pelo socialismo.



Um claro apelo a lutar é um passo adiante. A indicação de que as massas oprimidas do Oriente Médio não aceitarão ser recolonizadas, constrói a esperança. Mas fica ainda a pergunta: a classe operária nos centros imperialistas será também parte da luta revolucionária pelo socialismo? Este artigo mostrará que as mudanças nas condições de produção que trouxeram o imperialismo mundial ao auge do seu poder têm o potencial de causar seu colapso.


 


Os grandes acontecimentos na organização da produção, mencionados no sumário, começaram a tomar forma nos anos 1980. Mas o evento decisivo que os levou à frente foi a queda do socialismo na União Soviética e na Europa Oriental, que foi acompanhado pela abertura da China ao mercado capitalista mundial. Além disso, a classe capitalista na Índia, por volta de 1991, deixou de usar o Estado para controlar a economia nacional e abriu-a ao imperialismo mundial. Na África e em grande parte da América Latina, a penetração imperialista aumentou neste período, por meio das agressivas regras de crédito impostas pelo Fundo Monetário Internacional (FMI). O resultado foi a rápida expansão do poder do capital imperialista sobre os trabalhadores e oprimidos do mundo.



Juntamente com aquelas mudanças políticas, houve mudanças na tecnologia que permitiram que a produção fosse organizada numa nova base descentralizada. A produção de um único produto agora pode ocorrer em vários países por todo o mundo. Os capitalistas organizam a produção de modo a que esta possa ser realizada onde quer que a mão-de-obra do trabalhador tenha o menor custo.



Estas mudanças terão um impacto tremendo na luta de classes e demandarão mudanças na estratégia e nas tácticas das organizações comunistas e operárias, especialmente nos países imperialistas como os Estados Unidos. À medida que as mudanças coloquem os trabalhadores nos países imperialistas em competição direta com os trabalhadores dos países que sofrem sob a herança imperialista e colonialista, haverá uma necessidade ainda maior da solidariedade internacional da classe operária.



Enquanto estas mudanças criaram problemas enormes para a classe operária e suas organizações, também deram lugar às circunstâncias que tornam inevitável a luta da classe operária. O desenvolvimento tecnológico aumenta com a expansão numérica da classe operária disponível para a exploração. Esta expansão da força de trabalho está a ocorrer muito mais depressa do que jamais se viu em toda a história. O capital, como Karl Marx escreveu há muito tempo, está a criar a sua própria sepultura e fá-lo agora numa escala sem precedentes.



Crescimento numérico da classe operária disponível



Devido, principalmente, aos acontecimentos na China, na Índia e nos antigos países socialistas, o mercado capitalista mundial cresceu de 2,5 mil milhões de pessoas em 1985 para 6 mil milhões no ano 2000. Esses são números da população geral. Mas o que é mais significativo do ponto da vista da luta de classes é que o número de trabalhadores disponíveis para a exploração pelas corporações transnacionais imperialistas dobrou de 1,5 mil milhão para 3 mil milhões no mesmo período. Esses trabalhadores estão agora potencialmente disponíveis para competir no mercado de trabalho mundial e para se transformarem em mão-de-obra a baixos salários para ser explorada pelo capital imperialista ou seus agentes.



A ofensiva neoliberal gradual do FMI e do Banco Mundial foi acelerada durante os anos 1990. Por exemplo, o Tratado Norte-Americano de Livre Comércio (NAFTA) sujeitou os trabalhadores e os camponeses do México, com a sua população de mais de 100 milhões de habitantes, a uma onda de investimento capitalista importante e à superexploração pelas corporações dos EUA. O impacto na economia mexicana resultou em numa vasta emigração, incluindo cerca de 12 milhões de pessoas que emigraram sem papéis para os Estados Unidos, na sua maioria trabalhadores e trabalhadoras do México e da América Central.



Como indica Goldstein, estas regiões têm importantes diferenças políticas e de classe. A China detém uma superestrutura centralizada estabelecida pela Revolução Socialista: o Partido Comunista Chinês e o Exército Popular de Libertação; mas ambas as instituições, assim como a sociedade socialista chinesa em geral, foram severamente postas em risco pelo crescimento do capitalismo e pela penetração do imperialismo. Em princípio, sob o comando de Iéltsin, a burguesia russa abriu-se quase completamente ao investimento capitalista irrestrito e depois impôs novamente algumas limitações. Os países da Europa Oriental (antigos países socialistas) são agora colónias virtuais do capital ocidental, sendo que a Iugoslávia foi invadida, ocupada e dividida. O governo da Índia sempre foi capitalista, mas enquanto a URSS existiu, o estado indiano exerceu um controle considerável sobre o fluxo do capital estrangeiro.



Todas estas regiões no mundo sofrem taxas elevadas de desemprego e sub-emprego e também de muita pobreza. Da Indonésia ao Brasil, do México à Tailândia e à África do Sul, existe uma vasta população que se está a tornar parte do proletariado mundial.



Mudanças na organização da produção



Juntamente com a expansão numérica, ocorre uma revolução científico-tecnológica que permite que as corporações transnacionais imperialistas organizem a produção de uma maneira nova. Um grande número dos avanços nas forças de produção — a computação, os cabos de fibra óptica, os satélites, excelentes meios de transportes, a automatização da tecnologia portuária, a tecnologia da Internet, o software usado para controlar e monitorizar a produção global, etc. — criou uma nova divisão de trabalho internacional que está a afetar a luta de classes e requer novas estratégias e tácticas. Representa uma evolução significativa do capitalismo.



Uma descrição formal desta reestruturação, escrita do ponto de vista capitalista, é fornecida numa seção do livro de Thomas Friedman, The World is Flat (O Mundo é Plano). Friedman não é um dos mais astutos economistas do capitalismo, mas é além de colunista do New York Times, escritor e um milionário entusiasta do capitalismo, que se sente estimulado pelas perspetivas daquilo a que chama a nova era da Globalização 3.0. Ele é conhecido por muitos pela sua célebre frase em defesa do golpe militar imperialista na Iugoslávia, quando escreveu, em a Abril de 1999: “vocês não podem ter McDonalds [rede de refeição rápida] sem ter McDonnell Douglas [que produz bombardeiros]”, para justificar a militarização e as guerras de agressão.



Friedman visitou o centro de gerenciamento da Dell, em Austin, Texas, para fazer pesquisas antes de escrever seu livro a respeito do processo de produção utilizado pela Dell Computadores. Na época, a Dell vendia cerca de 140 a 150 mil computadores por dia.



Ele chegou à conclusão que:



Esta empresa possui seis fábricas de montagem: no Brasil, na China, na Irlanda, em Nashville, no Tennessee, em Austin, no Texas e na Malásia. A fábrica de montagem de Penang, na Malásia, compra os seus componentes na região. Compra os processadores Intel em empresas instaladas nas Filipinas, na Costa Rica, na Malásia ou na China. A memória é comprada, em Taiwan, na Coreia do Sul ou na Alemanha, entre outros países. Os cartões gráficos são fabricados em Taiwan, na China ou noutros países. A placa–mãe pode vir de uma fábrica coreana implantada em Xangai. O disco rígido é fabricado, por exemplo, na Indonésia ou na Malásia. O modem, a bateria, o LCD (tela de cristal líquido), o cabo de alimentação, o pente de memória, a pasta para transportar, etc., podem ser adquiridos num dos numerosos fornecedores da região, como a Tailândia, a Indonésia ou Singapura.



Cada componente, incluindo o modem, a bateria, o monitor, o cabo de força, o pente de memória, a maleta acondicionadora, etc., pode ser fabricado em qualquer dos vários fornecedores em toda a região. A Dell possui uma rede de fornecedores concorrentes entre si, de forma a ter sempre disponíveis as peças de que necessita, mesmo levando-se em conta que esses fornecedores devem manter um estoque razoável para que os negócios da Dell continuem a prosperar.



Friedman relata como as peças são escolhidas, aparafusadas e encaixadas, os softwares são instalados, os computadores encaixotados e codificados, acondicionados em paletas especiais para o transporte e colocados num avião Dell 747, fretado todas as noites, com mais 25.000 notebooks, com um peso total de mais de 100 toneladas. A aterrissagem é feita no aeroporto da Dell, em Nashville, no dia seguinte, onde o material é colocado numa caixa maior e enviado pela United Parcel Service para a empresa central, em Bethesda. Sob circunstâncias ótimas, decorrem quatro dias entre o pedido feito por telefone e a entrega.



A “cadeia de fornecedores” deste computador, incluindo fornecedores e subfornecedores, abrange aproximadamente 400 companhias na América do Norte, na Europa e principalmente na Ásia. São aproximadamente trinta fornecedores principais.



A Dell Computadores é apenas um exemplo do processo utilizado na fabricação de roupas, automóveis e mesmo grandes aeronaves, e expande-se às empresas de prestação de serviços, como os escritórios de contabilidade e de informática. Com a revolução científico- tecnológica, os processos de mão-de-obra mais avançados – isto é, a superexploração do trabalho – podem ser estabelecidos em praticamente todos os lugares nos quais os patrões possam encontrar os operários e operárias — em Cingapura, no Lesotho, na Costa Rica, no Bangladesh, na Formosa, na Romênia, na Espanha ou no sul dos Estados Unidos. O fabrico de produtos, dos mais simples aos mais complexos, pode ser dividido em várias fases. Estas fases de produção são divídas entre os monopólios para as redes globais de produção coordenadas. As corporações têm um lucro extra, em mercados milhares de milhas distantes dos locais de produção com custos mínimos de transporte



Níveis de salário já não são nacionais



Segundo Marx, a quantidade dos meios de subsistência necessários aos trabalhadores foi determinada historicamente em cada país. Isso dependeu do grau de conforto ao qual a classe operária, e a sociedade em geral, estavam habituadas, segundo o grau de desenvolvimento econômico do país e do desenrolar da luta de classes. Num país que, como poderíamos dizer atualmente, recebeu um legado de opressão – como a Índia –, por exemplo, as massas foram forçadas a aceitar menos. Num país imperialista, as massas foram acostumadas a receber mais, particularmente onde os sindicatos eram fortes, como em França, Alemanha ou nos Estados Unidos. Em cada caso os patrões pagavam mais, ou menos, segundo as condições particulares de cada país.



Thomas Palley, diretor assistente de Políticas Públicas da AFL-CIO (Federação Trabalhista Americana-Congresso de Organizações Industriais), refere-se à crise potencial colocada para a classe trabalhadora pelos novos desenvolvimentos discutidos acima: “A globalização trouxe… mobilidade para o capital, para a tecnologia e para os métodos de produção, definindo uma linha divisória em relação ao passado… A manufatura já foi colocada em competição entre os países, com graves consequências para os seus trabalhadores. A Internet promete o mesmo para os serviços anteriormente não-comercializáveis (exportáveis), e os muito bem pagos trabalhadores do conhecimento começarão a sentir os mesmos efeitos.”


 


“Não há nenhuma razão para acreditar que o fim está à vista, e os trabalhadores [norte] americanos poderão aguardar a pressão que a economia internacional exercerá para a redução dos salários e das condições de trabalho nas próximas décadas.”



O nível dos salários da classe operária, nos países imperialistas, sob a pressão exercida pela concorrência mundial estabelecida pelos grandes monopólios, é, de facto, cada vez mais, influenciado pelo nível salarial dos países onde eles são mais baixos. Nos Estados Unidos, os salários diminuíram continuamente desde aproximadamente 1973. A renda familiar permaneceu mais ou menos a mesma, mas agora depende do salário de duas pessoas a trabalhar, em vez de uma. As mulheres, que enfrentam o machismo na sua vida quotidiana, e agora enfrentam um ataque contra os seus direitos de reprodução, recebem salários que representam somente 77% daquele que é pago aos homens, entraram na força de trabalho e agora são quase metade dos trabalhadores. Os salários permanecem estagnados, mas a jornada de trabalho torna-se mais intensa. O trabalho da fábrica é organizado para não haver nenhuma ruptura na produção real. Os trabalhadores do escritório prolongam frequentemente a sua jornada até a noite, e muitos devem trabalhar até 50 ou 60 horas por semana, isto é, um acréscimo de até 20 horas de trabalho não pago, nos empregos onde não há sindicatos.



Apesar deste declínio, do ponto de vista dos patrões, os trabalhadores nos EUA estão a receber salários acima do valor internacional. A teoria marxista do valor trabalho e seu corolário, a lei da maximização de lucros, são as forças que estão a dirigir a nova fase da globalização.



Do ponto de vista dos patrões, um trabalhador na Califórnia com direito aos serviços de saúde, a uma pensão, férias e a um salário decente, é demasiado caro em relação ao mercado mundial do trabalho. De um ponto de vista marxista, o patrão considera que o salário pago ao trabalhador é superior ao valor da força de trabalho socialmente necessário. Os presidentes das corporações (CEOs) gigantes do EUA recebem em média $10.000.000 por ano, isto é, 200 vezes a renda de uma família mediana do EUA. Mas o valor da força de trabalho, segundo estes presidentes, deveria estar mais próximo dos salários pagos na China, no México ou nas Filipinas do que na Califórnia, em Lyon, em Frankfurt ou mesmo em Lisboa. Esses CEOs desejam encaminhar os salários nesta direção, e isto até que os trabalhadores se organizem e lutem para impedi-los.



Thomas Friedman, a quem nos referimos antes, enfoca especialmente os serviços, de engenharia, de pesquisa em geral, e na chamada seção profissional da classe operária. Ele está entusiasmado com a perspetiva de uma nova competição global entre os trabalhadores deste setor. Se um décimo destes trabalhadores “tiver a instrução e os contactos necessários para competir no mercado de trabalho profissional, isso equivale à força de trabalho total dos EUA, isto é, 150 milhões.”



A Índia tinha 520.000 engenheiros em Tecnologia da Internet (IT), em 2004, com salários iniciais de US$ 5.000. Cerca de 260.000 engenheiros são graduados na Índia, todos os anos. Um graduado de topo em engenharia química ou eléctrica ganha cerca de US$ 10.000 por ano em comparação com US$ 80.000 nos Estados Unidos.



Friedman disse com um orgulho descarado: “Não há quase nada acerca da Globalização 3.0 que não seja bom para o capital. Os capitalistas podem ficar descansados, comprar qualquer inovação e empregar a melhor e mais barata força de trabalho, em qualquer lugar do mundo, para pesquisá-la, desenvolvê-la, produzi-la e distribuí-la… Todas as coisas relacionadas com o capital vão muito bem.”



Os trabalhadores e as comunidades, entretanto, “sentirão a dor.”



A revolução científica e tecnológica atual e a consequente reorganização do capitalismo global, que está nas mãos da classe capitalista, são impulsionadas por um único factor, em cada etapa, ao longo do caminho – avançando e intensificando a exploração da força de trabalho e acelerando a pilhagem dos recursos mundiais visando lucros crescentes.



Os capitalistas não enfrentam mais a restrição do campo socialista.



A luta mundial entre os sistemas rivais, capitalista e socialista, atuou como uma restrição sobre a classe dominante nos Estados Unidos e na Europa Ocidental no modo de tratamento aos trabalhadores e aos oprimidos, durante o tempo em que a URSS e os países socialistas estabeleceram os padrões mundiais quanto aos direitos da classe trabalhadora. Entre esses direitos, talvez o mais fundamental seja o direito ao emprego, um pouco contraditório com a verdadeira essência do capitalismo. Espalhar empregos faz parte do mecanismo automático do capitalismo, e a criação de um exército de desempregados é uma condição essencial para o avanço da acumulação de capital.



Após o colapso da URSS, a classe capitalista não se sentiu mais compelida a permitir aos políticos no poder que limitassem a exploração capitalista e a repressão. Os capitalistas não se preocuparam mais com que sua própria classe trabalhadora se voltasse contra o capitalismo, como sistema, e fosse inspirada pela agitação socialista. O colapso da URSS retirou toda a pressão sobre os patrões de terem que encontrar qualquer padrão de segurança no trabalho, salários decentes, férias, tratamento de saúde, pensões, etc.



Mesmo Richard Freeman, um economista especialista em trabalho, em Harvard, admitiu que: “Você tem uma atitude diferente em relação aos seus empregados quando pensa que o comunismo ainda permanece como uma alternativa.” A URSS, além da garantia à segurança no emprego, estabeleceu também o padrão da garantia às pensões, tratamento de saúde gratuito, e muitos outros direitos. A classe dominante em todos os países capitalistas não terá mais que levar isso em consideração.



Trabalhadores precisam encontrar o modo de resistir



Ao promover o novo sistema global de produção, a classe dirigente é compelida pela competição e pela sua própria ganância voraz, a criar uma classe operária internacional recentemente expandida. Para evitar um declínio para as condições próximas da escravidão, os trabalhadores serão compelidos a lutar não somente contra a classe crescente de exploradores locais, mas também contra seus senhores das corporações transnacionais.



Hoje os salários e os benefícios dos trabalhadores estão sob ataque como nunca antes nos Estados Unidos. As pensões e o atendimento à saúde estão a ser eliminados. Os sindicatos são pressionados até fazer concessões sob a ameaça de transferência indiscriminada dos postos de trabalhos para fora do país. Cada área da economia, da manufatura ao setor dos serviços, ou mesmo a engenharia, está sob ataque.



Por outro lado, os monopólios gigantescos, enquanto se expandem por toda parte, estão febrilmente a tentar criar uma competição salarial entre os trabalhadores mais bem pagos, nos países imperialistas, e a classe operária crescente nos países de baixo salário, como também entre os trabalhadores com níveis de salário diferentes nos próprios países com baixos salários. Ao fazer assim, eles estão a destruir gradualmente, mas de forma implacável, a estabilidade capitalista.



Na sua análise O Imperialismo, Estágio Superior do Capitalismo, Lênin refere como os superlucros imperialistas permitem à classe dirigente prover uma condição mais privilegiada para um setor dos trabalhadores, os quais constituem a base material para uma burocracia reformista e corrupta. Enquanto as novas mudanças na organização da produção prosseguem e se aprofundam, a estrutura da classe operária nos países imperialistas modifica-se. Eventualmente confrontará os trabalhadores com a sua verdadeira condição como escravos assalariados cuja única salvação é unirem-se contra os patrões, não somente numa base nacional, mas também numa base internacional.



Entretanto, como explica Goldstein, com a reorganização capitalista da divisão internacional do trabalho, a exportação do capital, característica econômica essencial do capital monopolista, está a tornar-se, cada vez mais, não apenas um instrumento para a destruição dos trabalhadores mais privilegiados, mas para revogar todos os ganhos sociais e econômicos conquistados na luta por gerações. Este processo está a enfraquecer não somente a base para o oportunismo, mas está a corroer a base objetiva para a sustentação da classe operária pelo sistema da exploração capitalista. E onde a base objetiva é arruinada, o subjetivo segue por certo. Isso é materialismo; isso é Marxismo: é o seu ser social que determina a sua consciência. [E precisa, necessariamente, de um partido comunista.]



A estabilidade nos EUA já não é baseada primeiramente nos privilégios de uma seção dos trabalhadores. É frágil, condicional e baseada primeiramente numa ofensiva sem tréguas pela classe dirigente.



A atual liderança superior do movimento sindical nos Estados Unidos, a que se pode chamar burocracia trabalhista, já aceita a derrota. Os líderes políticos dos partidos da Segunda Internacional na Europa — que ainda se denominam “socialistas” — concordam em impor os programas neoliberais (Bernard Kouchner em França, Jose Sócrates em Portugal). Similarmente, a liderança dos sindicatos nos EUA está agora a advogar que os trabalhadores dos EUA façam concessões e aceitem as condições da globalização imperialista somente para conservar um pouco do que eles têm. Enquanto é verdade que o movimento sindical sofreu retrocessos e agora representa apenas 12% dos trabalhadores norte-americanos (comparado com 35% nos anos sessenta), os sindicatos ainda têm muito potencial, muito mais que os seus líderes privilegiados possam conceber. Por um lado, a nova organização “just-in-time” dos meios de produção significa que trabalhadores somente em algumas fábricas podem parar tudo. Por outro, recorde-se que no ano de 1935 — um ano antes do mais explosivo trabalho organizado nos Estados Unidos — só uma percentagem minúscula de trabalhadores estava nos sindicatos industriais.



Os trabalhadores de vanguarda devem estar conscientes das maquinações dos patrões para arquitetar esta competição entre os trabalhadores. A resposta não é negar empregos aos trabalhadores na Índia ou no México. Eles precisam de empregos, também. As lideranças dos trabalhadores têm que se esforçar para explicar aos trabalhadores americanos o que seus patrões fizeram com o México, o que os imperialistas ingleses fizeram aos trabalhadores e camponeses indianos. E a questão deveria ser ao contrário. Deveria haver empregos tanto nos EUA como no México, e não um ou outro. E eles devem ser empregos suficientes para viver. Os trabalhadores nos EUA têm que saber que o seu destino está ligado ao destino dos trabalhadores na Índia e no México. Os trabalhadores brancos têm que saber que o seu destino está ligado aos trabalhadores negros, latinos e asiáticos, e isso significa trabalhadores imigrantes, também.



Hoje, já está claro que nem toda a gente nos Estados Unidos aprecia os privilégios exibidos em filmes de Hollywood. O furacão Katrina expôs ao mundo o racismo excessivo do governo e a opressão nacional que enfrentam 35 milhões de afro-americanos. Programas anti-imigrantes provocaram impacto em dezenas de milhões de latinos e asiáticos que são cidadãos ou residentes legais como também os 12 milhões de imigrantes ilegais [sem papéis legais] que trouxeram de volta as lutas do Dia do Trabalho para os Estados Unidos. Lésbicas, homossexuais, bissexuais e transexuais também lutam contra a discriminação e a intolerância.



Duas guerras criminosas de agressão e ocupação no Iraque e Afeganistão — graças aos esforços heróicos da resistência iraquiana e afegã — começam a despertar um movimento nos EUA junto de centenas de milhares de jovens, homens e mulheres, enviados para matar ou morrer nesses países. Eles sabem que foram enganados, que o Pentágono está a perder a batalha; eles têm o potencial para a resistência maciça, própria contra esta guerra.



A pergunta agora é: as condições deterioradas da classe operária vão ajudar a fusão dos setores, mencionados acima, com a luta do proletariado, transformando-se numa luta anticapitalista? Tal luta irá requer a solidariedade internacional mais elevada, organizada entre os países e coordenada para se opor aos esquemas globais dos patrões. O capitalismo deu aos trabalhadores os meios técnicos que permitem tal organização. Requererá o mais árduo esforço contra a opressão nacional e para que a unidade de classe possa barrar as tentativas de divisão da nossa classe. Necessita dos maiores esforços em nome da solidariedade com trabalhadores imigrantes cuja situação é simplesmente uma outra parte da globalização capitalista e a febre para rebaixar os salários.



A solidariedade internacional de classe no estrangeiro e a solidariedade de classe nos EUA são pré-requisitos fundamentais da luta pelo socialismo do Século 21.


 


Fonte: O Diario.info