Fátima Teles: O poeta encantou-se!

O Poeta Manoel de Barros encantou-se nesta quinta-feira (13), numa manhã ensolarada de novembro, primavera de 2014. Nada mais justo para o poeta que amou a natureza partir na estação mais representativa da vida, do amor e da beleza na sua essência, a primavera, de tantas flores, folhas e cores. A voz calou-se e as mãos pararam de escrever. O espírito agora sobrevoa as orbes espirituais, eternizando-se na Terra pela memória, leitura e literatura brasileira.

Por Fátima Teles*, para o Vermelho

Ilustração de Manoel de Barros - Reprodução

Manoel de Barros nasceu no estado de Mato Grosso. Viveu entre as matas do Pantanal, os rios, as chapadas, a fauna, em diálogo poético com toda a riqueza da biodiversidade que estava em sua volta.

O poeta era um homem sensível e simples. Observava as formigas, analisava a sabedoria da água, a resistência das pedras e o ensinamento das folhas, das árvores. Conversava com os pássaros e por isso vez por outra amanhecia passarinho, com gosto de liberdade.

Foi amando e escrevendo as coisas “desinteressantes”, por ele chamadas, que o poeta tornou-se um dos maiores expoentes da poesia contemporânea no Brasil.

No poema Aprendimentos, Manoel de Barros vai escrevendo o que aprendeu com os filósofos. O trecho mais belo do poema está nestas linhas: “Aprendeu que as folhas das árvores servem para nos ensinar a cair sem alardes”.

Quanta profundidade numa frase, nos levando para uma reflexão sobre a vida, a partir da observação da própria natureza que nos rodeia. Todos nós estamos aqui na Terra como aprendizes em evolução e as experiências são necessárias para o nosso crescimento. Os dissabores, as perdas, as quedas, são comparadas às folhas que caem. Atropelos. indispensáveis para o nosso fortalecimento, resistência e aprendizado, nos ensinando a cair sem alarde, a cair com elegância, silêncio e aceitação para uma reavaliação e refazimento de nossas forças na certeza de recomeçarmos melhores e com mais sabedoria.

O menino e o poeta eram um só e viveram a vida em contato com a beleza exuberante do pantanal, com os pés na terra, sentindo o cheiro do chão, vendo a água da chuva escorrer pela telha, entre o canto do galo , dos pássaros e o mugido das vacas ao amanhecer. E quando a noite vinha o poeta dizia que os vagalumes serviam para iluminar as trevas. ”São milhares de pingos de luz que tentam cobrir o escuro”.

Essa frase impele mais um ensinamento: o de ser luz em um mundo que insiste em viver no escuro. O ensinamento de levar luz através do sorriso, do olhar, do cumprimento, do ouvir (coisa já tão esquecida e desvalorizada entre nós seres “humanos”), do falar, do conviver e do relacionar-se.

E o mestre vai ensinando-nos pelos versos mais simples de sua escrita.(…)” Sou água que corre entre pedras: Liberdade caça jeito”.

A água que busca desviar as pedras, os obstáculos que a natureza lhe impõe. Caça jeito para passar e exercer sua liberdade, cumprindo sua missão, seu ciclo.

Nós ainda não aprendemos a contornar aquilo que acreditamos que nos impede de crescer. A natureza nos ensina que há possibilidade de cumprir a nossa tarefa mesmo com as intempéries e tempestades que nos abraçam ao longo do caminho existencial. Tudo é uma questão de sabedoria, mas nós estamos sempre muito apressados(as). O nosso imediatismo nos fez perder a nossa capacidade de percepção e reflexão, adquiridas com a sensibilidade da alma.

Que a poesia nos salve!
Salve o poeta!
Manoel de Barros, presente!

*É assistente Social

Referências

http://www.cartafundamental.com.br/single/show/214/a-poesia-infancia-da-lingua
http://www.releituras.com/manoeldebarros_bio.asp
http://www.revistabula.com/2680-os-10-melhores-poemas-de-manoel-de-barros/