Sem categoria

Associação dos Magistrados não vê como “impichar” Marco Aurélio

A AMB (Associação dos Magistrados Brasileiros) não vê como pedir o impeachment do ministro Marco Aurélio de Mello, disse o presidente do órgão, Rodrigo Collaço, em entrevista ao site Conversa Afiada, do jornalista Paulo Henrique Amorim, nesta quin

Nesta quinta-feira, dia 27, o jornal O Globo informou que a Interpol procura o suíço Mike Niggli, suspeito de aplicar um golpe no Brasil no valor de US$ 80 milhões. O ministro Marco Aurélio Mello concedeu ao suíço o benefício da prisão domiciliar e, com isso, Niggli fugiu.


 


“Como a Constituição prevê que ninguém pode ser considerado culpado antes que a sentença penal se tornar definitiva, Marco Aurélio reiteradamente tem concedido essas decisões”, explicou Collaço.


 


Segundo Collaço, o ministro Marco Aurélio, do Supremo Tribunal Federal, tem uma “visão extremamente liberal” do Código Penal.


 


Collaço também comentou o resultado de uma pesquisa da AMB que mostra que apenas 11% dos brasileiros respeitam os políticos. Por outro lado, 80% dos entrevistados acham que é possível combater a corrupção. “A população, embora indignada, não perdeu a esperança e acredita que o Brasil tem solução”, afirmou Collaço.


 


 


Leia a íntegra da entrevista com Rodrigo Collaço, presidente da AMB:


 


Paulo Henrique Amorim – Segundo o jornal O Globo de hoje (quinta-feira, dia 27), a Interpol está a procura do suíço Mike Niggli, de 37 anos, que teria aplicado um golpe no Brasil no valor de US$ 80 milhões e ele fugiu porque o ministro Marco Aurélio Mello, do Supremo Tribunal Federal, concedeu a ele prisão domiciliar. O ministro Marco Aurélio já tinha dito na semana passada que Savatore Cacciola, a quem ele concedeu um Habeas Corpus, tem o direito natural à fuga, como todo o suspeito, cuja condenação não está confirmada. Eu vou conversar agora com o doutor Rodrigo Collaço, que é presidente da Associação dos Magistrados do Brasil. Doutor Rodrigo, o senhor vai bem?


 


Rodrigo Collaço – Bem, tudo tranqüilo, Paulo Henrique, prazer.


 


Paulo Henrique Amorim – Tem sido uma constante, se não posso dizer que tem sido freqüente, o ministro Marco Aurélio Mello, do Supremo do Supremo Tribunal Federal, conceder Habeas Corpus, ou, no caso, prisão domiciliar, à pessoa que depois a Polícia tem que buscar de volta. Como, por exemplo, os bicheiros e alguns dos meliantes, ou suspeitos de serem meliantes, flagrados na Operação Furacão, da Polícia Federal. Eu pergunto ao senhor, o que é que dá para fazer para evitar isso?


 


Rodrigo Collaço – O primeiro aspecto que eu queria colocar é relacionado ao sistema de escolha dos ministros do Supremo Tribunal Federal no Brasil. A sabatina feita ao ministro é uma sabatina apenas formal. Então, as pessoas se surpreendem com a visão liberal que o ministro Marco Aurélio tem na questão penal porque a sabatina feita no Senado na verdade não aprofunda nada, ao contrário do que acontece nos Estados Unidos, onde os ministros são questionados e apresentam, antes de tomar posse, qual é a sua visão sobre um tema relevante. Então, o ministro Marco Aurélio tem uma visão extremamente liberal nessa questão penal. A posição dele é que, como a Constituição brasileira prevê que ninguém pode ser considerado culpado antes que a sentença penal se tornar definitiva, ele reiteradamente tem concedido essas decisões, liberando as pessoas que foram acusadas e que ainda não foram condenadas em definitivo.


 


Paulo Henrique Amorim – Mas, por esse raciocínio, ninguém nunca será preso na mão dele.


 


Rodrigo Collaço – É porque, como no Brasil há muita demora para a sentença se tornar definitiva, há muitas possibilidades de recurso, nós não temos, assim sendo, a necessária condenação e a prisão das pessoas para cumprir pena. Eu, nesse aspecto não tenho essa mesma visão tão liberal, a minha visão é um pouco diferente. Eu acho que no Brasil a Justiça precisava ser um pouco mais dura com a criminalidade, principalmente a criminalidade organizada, porque uma parte da teoria penal ela foi formada quando a criminalidade era assim quase romântica. E hoje nós temos organizações criminosas que ameaçam não só o cidadão, ameaçam cidades. 


 


Paulo Henrique Amorim – E de colarinho branco, não é?


 


Rodrigo Collaço – Colarinho branco. O Estado de São Paulo foi paralisado, é Rio de Janeiro, Vitória no Espírito Santo, uma ameaça até ao funcionamento das cidades. Eu imagino que nós não podemos combater esse novo tipo de criminalidade com um instrumento já ultrapassado do Código Penal, na minha visão. Não são eficientes para a difícil função do Estado que é enfrentar esse crime organizado.


 


Paulo Henrique Amorim – E como se concerta isso? Como é possível corrigir uma decisão dessas que faz com que um suíço esteja lá agora sumido, com a Interpol atrás dele como estava o Cacciola? E esse suíço deu um prejuízo de US$ 80 milhões e o Cacciola deu um prejuízo de R$ 1 bilhão. Não tem como corrigir isso?       


 


Rodrigo Collaço – Quando alguém está em liberdade realmente não tem como corrigir. As decisões no ministro, quando concedidas individualmente, ficam sujeitas a recursos do plenário. Só que se essa decisão se libera e o recurso do plenário, se o objetivo do acusado é fugir, ele consegue, nesse meio tempo, se evadir. Então, numa questão do ponto de vista da prescrição da prisão acaba sendo uma questão sem solução.


 


Paulo Henrique Amorim – Doutor Rodrigo, deixa eu lhe perguntar uma outra coisa, talvez mais complicada. Digamos que eu seja um cidadão indignado com as decisões desse juiz da suprema corte brasileira. O que é que eu posso fazer para “impicha-lo”?


 


Rodrigo Collaço – Os ministros do Supremo estão sujeitos a impeachment, realmente. Mas esse não seria um caso cabível porque aí o ministro está exercitando o seu papel Constitucional, interpretando a Constituição, quer dizer, não há contra o ministro Marco Aurélio qualquer, pelo menos não cabia essa acusação e eu mesmo jamais faria…  ele é uma pessoa que tem autonomia federal, ele exercita essa autonomia de acordo com a Constituição e as pessoas realmente tem que recorrer da decisão do ministro para ver se o entendimento do Supremo é diferente do dele e com isso… Impeachment, em relação a esse tema, eu acho que não cabe. É apenas o recursos da jurisdição que a Constituição garante ao juiz.


 


Paulo Henrique Amorim – Mas se o cidadão considerar que as decisões dele conspiram contra a ordem pública? Porque aqueles cavalheiros todos podem continuar roubando?


 


Rodrigo Collaço – Eu acho que nós devemos considerar, podem continuar roubando, eu não sei se faria essa afirmação, o que eu coloco é que…


 


Paulo Henrique Amorim – No caso dos bicheiros, a Polícia Federal os flagrou, a segunda vez, em uma atividade de crime organizado e depois de terem sido soltos pelo ministro.


 


Rodrigo Collaço – E eles foram presos novamente?


 


Paulo Henrique Amorim – Foram presos novamente e foram soltos novamente.


 


Rodrigo Collaço – Eu lhe coloco. Eu tenho uma visão diferente disso. Eu acho que na verdade ele não pode ser combatido com a visão romântica e antiga do Direto Penal. Mas, eu não vejo a possibilidade de um processo de impeachment. Acho que infelizmente não há essa, ou felizmente que isso é o que garante a liberdade do juiz de julgar, não há possibilidade do impeachment se dar por essa razão.


 


Paulo Henrique Amorim – Os pares não podem interpelá-lo?


 


 Rodrigo Collaço – Os pares podem modificar a decisão, porque a decisão é concedida em caráter individual e depois tem que passar pelo colegiado. O colegiado pode modificar a decisão, ele pode consolidar… Seguramente a condição do Supremo acaba prevalecendo ante as posições individuais do ministro.


 


Paulo Henrique Amorim – Doutor Rodrigo, eu queria aproveitar a oportunidade. O senhor organizou uma pesquisa que revelou que só 11% dos brasileiros respeitam os seus políticos. O senhor poderia tratar disso com um pouco mais de profundidade, se possível?


 


Rodrigo Collaço – Nós fizemos uma pesquisa para avaliar a imagem das instituições públicas brasileiras e realmente o resultado não foi bom nem para o executivo, nem para o judiciário e nem para o legislativo. Mas, no caso do legislativo, realmente chama a atenção porque mais de 80% da população não confia nem na Câmara dos Deputados nem no Senado… nos políticos. Também mais de 70% não confia nos partidos políticos. Eu acho que é um resultado sintomático em relação ao Congresso… nesses casos de corrupção, várias acusações de corrupção que não ficaram bem resolvidas. Agora tem dados positivos também na pesquisa, mais de 80% da população acha que é possível combater a corrupção, 95% das pessoas entendem que a reforma política é necessária, então eu acho que a população, embora indignada, não perdeu a esperança e acredita que o Brasil tem solução.


 


Paulo Henrique Amorim – O senhor falou que mais de 80% das pessoas acreditam que seja possível combater a corrupção e o que mais?


 


Rodrigo Collaço – Mais de 80% acha que é possível combater a corrupção e 95% da população é a favor da reforma política, defendem a reforma política. Acho que são dados relevantes porque mostram que as pessoas ainda não perderam a esperança, nem de superar a corrupção e também não perderam a esperança de que uma reforma política possa melhorar as nossas instituições e nossa representação política popular.